São Paulo, sexta-feira, 20 de agosto de 2004

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POLÍTICA

Atletas desconhecidas de países que nunca levaram mulheres ajudam a construir a Olimpíada mais feminina da história

Debutantes que desafiam homens

MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Danah Nasralla, Rudwida El Hubti, Amantle Montsho, Amira Edrahi. Elas são atletas olímpicas das quais você provavelmente nunca ouviu falar. E provavelmente não ouvirá mais. Elas serão coadjuvantes em Atenas e sua participação deve se limitar à estréia. Mas hoje escrevem seus nomes na história dos Jogos.
As atletas integram as delegações de países que em Sydney entraram na linha de tiro do COI e de ONGs: não levaram mulheres aos Jogos. Na maior parte dos casos, por motivação religiosa.
Desde 2000, eles foram alvo de um esforço jamais visto para vencer a barreira. Botswana e os islâmicos Kuait, Afeganistão, Palestina, que nunca haviam tido uma mulher sob sua bandeira, sucumbiram. A Líbia também.
E ajudaram na quebra do recorde de mulheres nos Jogos. Na Grécia, elas são 40,6%. Há quatro anos, na Austrália, foram 38%.
A kuaitiana Danah, 16, corre hoje as eliminatórias dos 100 m, no mesmo dia em que a líbia Amira, 17, nada os 50 m livre. Sua compatriota Rewida, 15, e Amantle, 21, de Botswana, disputam os 400 m rasos amanhã. Na mesma pista estará Robina Muqimyar, primeira afegã, ao lado da judoca Friba Razayee, em uma Olimpíada.
O Afeganistão foi banido dos Jogos em 1999 por causa das ações do Taliban contra mulheres.
"Sei que não tenho chances de medalha, mas estar em Atenas já é uma medalha de ouro", disse à Folha a velocista, que tem 15s como melhor marca nos 100 m.
Para muçulmanas, romper o preconceito e entrar no esporte exige esforço. A religião impõe uma série de limitações.
A iraniana Nasim Hassan Poor, 19, é a única atleta de seu país em Atenas graças à escolha de seu esporte, o tiro. É uma das poucas modalidades que permite que ela se vista como manda a tradição: coberta dos pés à cabeça.
Danah Nasralla, 16, primeira kuaitiana nos Jogos, está em Atenas graças à resistência do comitê de seu país, que não aceitou as pressões para estancar a participação feminina. Sanaa Abu Bkehet, 19, da Palestina, levou até pedradas ao correr de shorts na rua.
"Ouvimos muitos relatos de mulheres que gostariam de praticar esportes, mas não têm chance, são tolhidas", conta Anitta DeFrantz, presidente da Comissão de Esportes e Mulheres do COI.
A cruzada da entidade sofreu derrotas em Atenas. Seis dos países que não levaram mulheres a Sydney, repetiram a dose agora: Ilhas Virgens Britânicas, e os islâmicos Brunei, Omã, Emirados Árabes, Qatar e Arábia Saudita.
A esperança de zerar o quadro em Pequim-2008 está nas mãos (e pés) das debutantes em Atenas. E, apesar de ainda adolescentes, elas assumem a responsabilidade.
"Com o Taleban, aprendi opressão e intolerância. Agora quero ensinar às afegãs que basta lutar para você conseguir o que quer", ensina Muqimyar, 17.


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