São Paulo, sábado, 20 de outubro de 2007

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Segredo industrial, e não ambiente, faz F-1 reciclar

Marketing e preocupação com concorrentes ditam ações que poupam natureza

Pneus são recolhidos por empresa para que rivais não descubram sua composição, como percentagem de borracha natural e fibras

Orlando Kissner/France Presse
O finlandês Kimi Raikkonen, terceiro no campeonato, a sete pontos do líder, conduz sua Ferrari pelo circuito de Interlagos, ontem

LUÍS FERRARI
DA REPORTAGEM LOCAL

Num mundo cada vez mais preocupado com o aquecimento global, a F-1, esporte poluidor na essência, adota medidas ecológicas. Mas não esconde que sua motivação são estratégias de marketing e preservação de segredos industriais, e não o cuidado com o planeta.
Um bom exemplo disso é o destino dos pneus usados na categoria. Todas as 2.200 unidades que a Bridgestone, fornecedora exclusiva da F-1, trouxe ao Brasil são recolhidas e levadas de volta para os centros da fabricante. E não é para não sujar a capital paulista.
"Todos são recolhidos, para o controle da equipe. O segredo industrial preocupa mais do que o impacto ambiental", diz o diretor de assuntos corporativos da empresa, Raul Viana.
Ele narra que todos os pneus têm um código de barra, para o controle não falhar. "São compostos de altíssima tecnologia. Não dá para deixar pneu solto para trás. Se cair na mão de um concorrente, ele pode destrinchar e identificar a quantidade de fibras sintéticas, o percentual de borracha natural etc."
Com os combustíveis, a preocupação é similar. Os times costumam levar cerca de 2.000 litros de gasolina para cada GP, para usar cerca de 1.200. "É preciso ter uma reserva estratégica", conta Rogério Gonçalves, engenheiro da Petrobras, fornecedora da Williams.
Ele diz que na Europa, ao término dos GPs, as petroleiras recolhem as sobras em caminhões-tanque. Em eventos como o de Interlagos, o excedente é recolhido por um sistema de descarte nos autódromos, com tambores na frente dos boxes.
"Mas, antes, é preciso descaracterizar a gasolina, misturando, por exemplo, com óleo", conta Gonçalves, revelando preocupação idêntica à da fornecedora de pneus. Segundo os organizadores do GP Brasil, toda a gasolina que é coletada em Interlagos é posteriormente removida pela Petrobras.
Há ainda a questão da poluição atmosférica. Um carro de F-1 emite, em média, 1,5 kg de CO2 por quilômetro, mais ou menos o quíntuplo de um carro de passeio econômico.
Tomando como parâmetro 746 km, a distância que o brasileiro Felipe Massa andou no último fim de semana do Mundial, cada um dos 22 carros do grid gera 1.120 kg do gás numa prova. A emissão total é de 24,6 toneladas nos três dias.
"Isso é menos que a emissão gerada pelos carros de passeio que estarão em volta do autódromo para levar espectadores à corrida no domingo", estima o engenheiro da Petrobras.
Estimativa precisa, segundo Paulo Artaxo, pesquisador do Instituto de Física da USP. "É um número desprezível em termos de emissão. Dez táxis em São Paulo rodando durante uma semana devem gerar mais que isso", compara o membro do painel intergovernamental de mudanças climáticas.
De acordo com os dados de emissão de CO2 na cidade informados por ele, a F-1 lança na atmosfera paulistana, nos três dias de carros na pista, o equivalente a 16 minutos da emissão da frota de táxi da cidade.
"Mas isso não quer dizer que não deva reduzir", ressalva o físico. "A própria F-1 considera usar biocombustíveis a partir de 2012, para servir de exemplo ao transporte de larga escala."
Plano que, segundo o funcionário da Petrobras, já gera uma ação de marketing. "A F-1 é uma grande vitrine. A maior importância do biocombustível não é reduzir o consumo dos carros na pista, mas ser modelo aos carros na rua."


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