São Paulo, sexta-feira, 20 de dezembro de 2002

Texto Anterior | Índice

FUTEBOL

Ser ou não ser

JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA

1958, uma conversa entre dois diretores santistas:
- Ufa, nem acredito! Fomos campeões!
- E que título! Com essa política de revelar talentos, nosso time foi a sensação do campeonato.
- É, mas o caixa do clube não está lá essas coisas.
- Não?
- Não, mas pagaremos tudo se vendermos o Pelé e o Pagão.
- Eu preferia que eles ficassem e montássemos um time que permanecesse na memória dos torcedores por muitos e muitos anos, mas, se é assim...
Foi assim. O Santos conseguiu quitar suas dívidas, mas viu, nos anos seguintes, a academia palmeirense formar o maior esquadrão dos anos 60, conquistando títulos, renome internacional e uma grande torcida.
O Santos continuou sendo um time intermediário, sempre brigando pelo quinto lugar dos torneios regionais com o Guarani e a Ponte Preta. Em vez de fazer história, preferiu fazer caixa.
 
2002, uma conversa entre dois diretores santistas:
- Ufa, nem acredito! Fomos campeões!
- E que título! Com essa política de revelar talentos, nosso time foi a sensação do campeonato.
- É, mas o caixa do clube não está lá essas coisas.
- Não?
- Não, mas pagaremos tudo se vendermos o Diego e o Robinho.
- Eu preferia que eles ficassem e a gente montasse um time que permanecesse na memória dos torcedores por muitos e muitos anos, mas, se é assim...
Tomara que não seja. Todos sabem que o Santos vive com mais problemas financeiros do que um ministro da Fazenda. Mas, se isso é um fato incontestável, também é verdade que vender craques não é a solução do problema.
Nos anos 70 e 80, o clube vendeu Nilton Batata, Juary, João Paulo, Pita e César Sampaio, supostamente para acabar de vez com as dívidas. Nos 90, foi a vez de Giovanni. Mas as dívidas, sempre teimosas, voltaram.
Vender craques não é a solução para a economia de um clube, tanto que foi na década de 60, quando o Santos não vendeu ninguém e comprou craques consagrados como Mauro Ramos, que o clube teve seus cofres mais cheios. Vitórias, e não derrotas, é que trazem riquezas.
Será que com Serginho e Denílson o São Paulo não teria formado a maior ala esquerda do futebol brasileiro de todos os tempos?
Será que com Dida e Ewerthon o Corinthians não seria o atual campeão brasileiro?
Será que com Ronaldinho Gaúcho o Grêmio não teria passado pelo Santos nas semifinais?
Há, claro, o desejo dos jogadores. Mas com bons salários e extras na publicidade, eles não têm motivos tão fortes para querer jogar na Europa. Um ou outro, como Raí e Leonardo, talvez até queira conhecer o velho mundo, mas a maioria deles simplesmente gosta de jogar futebol e acaba não se adaptando à cultura desses países. Vide Romário, que levava amigos do Brasil para jogar futevôlei com ele na Holanda.
Como a atual diretoria santista quererá ser lembrada no futuro? Como a que inventou um time que fez a alegria da torcida por muitos anos ou como a que desfez um dos mais promissores times já formados na Vila Belmiro? Espero que ela prefira manter os craques. Espero que, em vez de fazer caixa, ela prefira fazer história.

Mea culpa
Na enumeração dos jogadores que conquistaram o título brasileiro, esqueci o Robert. Foi uma injustiça. Além de ter sido uma peça importante, ele é o atleta em atividade que mais fez jogos pelo Santos. E, depois de perder três finais de brasileiro e uma de Libertadores, finalmente espantou o deus Urucubaco.

Resposta
Na última terça, Luís Fernando Verissimo escreveu sobre o título do Santos. E a última frase de sua coluna foi "Vá aguentar o José Roberto Torero". Será que ele pensa que posso me tornar um fanático? Ora, isso nunca acontecerá. Se coloquei em meu carro uma buzina com o hino do clube, foi só pela segurança. Se ando pela rua imitando os dribles de Robinho, é só pelo exercício. E, se não tiro minha faixa de campeão nem no chuveiro, é só para mantê-la sempre limpinha.

E-mail torero@uol.com.br


Texto Anterior: Boxe - Eduardo Ohata: Questão de perspectiva
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.