São Paulo, domingo, 21 de julho de 2002

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Redução dos valores pagos por emissora expõe dependência das equipes

Depreciação do Brasileiro torna clubes reféns da TV

FÁBIO SOARES
JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO

DA REPORTAGEM LOCAL
Começou a ruir o último pilar de sustentação financeira do desorganizado futebol brasileiro.
O prestígio recuperado em campo pelo pentacampeonato mundial na Ásia não foi suficiente para valorizar o produto no mercado. O Campeonato Brasileiro, a competição mais importante do rotulado "país do futebol", vale cada vez menos.
A Rede Globo, dona dos direitos de transmissão, irá pagar R$ 130 milhões para exibir a próxima edição do torneio, que começa em 10 de agosto, R$ 98 milhões a menos do que o Clube dos 13 (associação que reúne os principais clubes do país) esperava receber quando negociava com a emissora em 1998. Para os times, reféns das receitas dos direitos de TV, a redução caiu como uma bomba.
O Flamengo, por exemplo, que acumula uma dívida superior a R$ 200 milhões, não vê como sair do buraco. "Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come", constatou o presidente Gilberto Cardoso Filho, que substitui Edmundo Santos Silva, deposto do cargo no dia 9. ""Se nós não aceitássemos a proposta da Globo, perderíamos nossa única fonte de renda."
E a dependência dos clubes em relação à TV, no Brasil, é, de fato, muito grande.
Segundo J. Hawilla, dono da Traffic, a maior agência de marketing esportivo do Brasil e parceira da Rede Record, as receitas de TV chegam a representar 80% ou mais do faturamento de um clube de futebol no país.
De acordo com a Pelé Pro, agência de marketing esportivo de Pelé, em média 61% das fontes de receita dos clubes brasileiros provêem dos direitos televisivos.
A desvalorização dos contratos entre TVs e clubes é uma tendência mundial e, por isso, segundo especialistas na área, deveria ter sido prevista pelos dirigentes.
"Só os clubes daqui não se prepararam contra a dependência da televisão. Os valores pagos bateram no teto e agora estão despencando", comentou J. Hawilla.
Depois de três reuniões entre os dirigentes esportivos e a cúpula da Globo Esportes, braço esportivo da emissora, de nada adiantou a choradeira dos cartolas.
Dirigentes que participaram do encontro na última segunda-feira, em São Paulo, revelaram à Folha que Marcelo Campos Pinto, que comanda a Globo Esportes, fez uma exposição para justificar a necessidade de a empresa reduzir os custos com o pagamento dos direitos de transmissão de eventos esportivos.
Campos Pinto teria dito que, mesmo pagando R$ 130 milhões ao C13 pelo Brasileiro-2002, a emissora terá prejuízo. Não deverá vender mais de R$ 70 milhões em cotas de patrocínio.
Ele teria lembrado ainda que a Globo Cabo, que administra a TV a cabo, teve de pedir socorro ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para diminuir sua dívida, que chegava a R$ 1,5 bilhão.
E disse mais: que, desde o início do ano, cada departamento tem de cumprir rigorosamente sua meta de gastos -e com a Globo Esportes não seria diferente.
Um dos casos citados por ele foi o da Copa-2002. A Globo, que comprou os direitos de transmissão do evento, ofereceu-os ao mercado, mas nenhuma emissora se interessou em pagar US$ 60 milhões para exibir o Mundial.
A audiência da Copa dos Campeões também desanima. Em duas transmissões de jogos do Corinthians no torneio, o time mais popular de São Paulo, a Globo perdeu no Ibope para o SBT.
Para piorar um pouco mais a situação do C13, nenhuma outra emissora de TV do Brasil se interessou em oferecer mais do que os R$ 130 milhões da Globo, nem mesmo a Record, que chegou a ser cogitada pelos clubes.




Colaboraram Marília Ruiz, da Reportagem Local, e Sérgio Rangel, da Sucursal do Rio

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