São Paulo, sábado, 21 de agosto de 2004 |
Próximo Texto | Índice
Estrela do mar
Depois de regata de recuperação e pura matemática, Scheidt deixa país muito perto do primeiro ouro GUILHERME ROSEGUINI ENVIADO ESPECIAL A ATENAS Nada de descanso após um dia de bons ventos e resultados no mar. Antes de celebrar a liderança na classe laser, Robert Scheidt vislumbra o futuro e faz contas. Motivo: amanhã, ele leva seu barco à água pela última vez na Olimpíada. E em situação privilegiada na luta pelo ouro. Com o sétimo e o terceiro lugares que obteve nas provas de ontem, Scheidt precisa apenas de uma nona colocação na última etapa para ocupar o degrau mais alto do pódio em Atenas. Nas dez regatas que disputou até aqui, o brasileiro só não ficou entre os nove primeiros em duas. A estatística lhe dá confiança. "Estou em uma situação ótima. O vento estava bom, e eu tive um dia excelente. Mas ainda não ganhei nada", diz o atleta. A precaução existe pela própria história do velejador. Na última Olimpíada e no Mundial do ano passado, disputado na Espanha, Scheidt chegou ao derradeiro dia de disputas em vantagem. Mas sucumbiu. Nos Jogos de Sydney-2000, quem lhe tirou o bicampeonato foi o inglês Ben Ainslie, hoje na classe finn. Em 2003, na Espanha, foi a vez de o português Gustavo Lima protagonizar o papel de algoz. Foi o último revés do brasileiro em torneios de alto nível na classe. "Eu já sabia que a competição seria decidida assim, nos últimos instantes. Por isso tratei de chegar até aqui em uma posição melhor do que a dos outros", conta. Realmente, sua vantagem nunca foi tão pronunciada. Dos 42 barcos que correm na laser, apenas quatro seguem na luta pelo ouro. Quem está mais perto do brasileiro é o austríaco Andreas Geritzer. Scheidt pode chegar até oito posições atrás dele, que mesmo assim leva o título. Nem o adversário acredita que pode batê-lo. "Vou fazer a minha prova e esquecer o Robert. Ele é o melhor e tem todas as chances de ganhar. Lutarei pelas outras medalhas", afirmou Geritzer após as regatas de ontem. O esloveno Vasilij Zbogar e o britânico Paul Goodison, terceiro e quarto na classificação, respectivamente, ainda têm chances remotas de conquistar o título. Zbogar precisa triunfar e torcer para que Scheidt não fique entre os 14 melhores. Se Goodison ganhar a prova, Scheidt leva o título mesmo se terminar até em 16º. Detalhe: até aqui, esse cenário ainda não aconteceu nos Jogos. "Mas isso também não significa que não possa acontecer. Em Sydney, também não acreditávamos que aquela derrota fosse ocorrer. Esporte é assim. Por enquanto, estamos na frente. O resto não sabemos ainda e não podemos prever", explica Cláudio Biekarck, técnico de Scheidt. A estratégia seria então perseguir algum concorrente durante toda a regata decisiva? Para o brasileiro, a resposta é não. "Seria um grande erro. Tenho três rivais que podem ganhar o ouro. Não posso escolher um para marcar e deixar os outros sozinhos. Tenho que fazer a minha prova, seguir a minha intuição." Até a hora agá, ele pretende se concentrar. Fora da Vila. Scheidt quer deixar hoje o alojamento dos atletas para almoçar com os pais, Fritz e Karin, que estão em Atenas. No mais, deseja cumprir a velha rotina. O dia começa com passeio de bicicleta, segue com uma sessão musical -Eric Clapton e Charlie Brown Jr. estão entre os prediletos- e termina com um rápido exercício físico na academia ou uma amistosa partida de tênis. Tudo com cuidado, para valorizar o que está em jogo na regata de amanhã. Scheidt ainda não foi derrotado em 2004. Até aqui, foram nove vitórias em nove campeonatos disputados, a mais arrebatadora performance entre todos os velejadores que estão competindo na Grécia. Há também um valor histórico. Até hoje, o Brasil tem somente um bicampeão olímpico: Adhemar Ferreira da Silva, ouro nos Jogos de Helsinque-1952 e Melbourne-1956, no salto triplo. Todas as chances apontam para Scheidt, último brasileiro a conquistar o ouro olímpico, em Atlanta-96. Toda pressão está sobre ele, que diz não ligar: "Sou pressionado há pelo menos dez anos. Velejo muito bem nessas condições". Próximo Texto: Polifonia: De um quintal em Kiribati ao encanto grego Índice |
|