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POLIFONIA
De um quintal em Kiribati ao encanto grego
MARCELO DIEGO
ENVIADO ESPECIAL A ATENAS
Procure no mapa com
atenção. À direita da Austrália, no Pacífico, quase na altura da linha do Equador. Coloque uma lupa nesse ponto.
Ali estará o Kiribati.
É um arquipélago de 33
ilhas, a maioria inabitada e
cujo ponto mais alto fica a 1,98
m acima do nível do mar. Tem
98.549 habitantes, em 811 km2.
Faz, ao lado do Timor Leste,
sua estréia olímpica.
E coube a Kaitinano Mwemweata representar esse país
ontem, nas eliminatórias dos
100 m rasos, no atletismo. Esperança de medalha não existia. Mas o resultado passou
longe de um fiasco. A atleta de
20 anos cravou 13s07, seu melhor resultado pessoal, na
quarta bateria. Na classificação final, ficou em 55º lugar, à
frente de oito atletas.
Se o que vale é competir, o
feito de Mwemweata foi notável. A atleta vive em um país
sem ginásio, estádio ou pista
de atletismo. A preparação
ocorre no quintal da casa do
treinador, de chão pedregoso,
misturado com areia. O único
refresco é a sombra dos coqueiros. Até quatro semanas antes
dos Jogos, os 80 atletas do Kiribati dividiam entre si dez pares de tênis. Na semana passada, ela ganhou seu primeiro
par exclusivo.
Mwemweata já havia disputado campeonatos na Oceania, mas só chegou à Olimpíada por meio de um convite.
Seus familiares não têm idéia
de onde fica Atenas e com certeza não acompanharam seu
desempenho pela televisão
-o país conta com raros aparelhos, que não recebem transmissões ao vivo, pois não há
antena parabólica.
"Fiquei muito assustada.
Tudo aqui é gigantesco", declara, sobre suas impressões
iniciais acerca da cidade. Na
primeira noite, jantou no
McDonald's, rede que conhecia só de fama. Depois, dormiu
em um quarto com ar condicionado, colchão e lençol. "É
muito mais confortável", diz.
Na sua casa, que divide com a
tia, ela dorme no chão.
Para chegar aos Jogos, a delegação (três atletas e sete cartolas) saiu da capital Tarawa
para Brisbane. De lá, foi a Dubai. E, depois, a Atenas.
Mwemweata diz que virou
corredora para ser respeitada.
"Tratam-me como se eu fosse
uma pessoa branca", afirma a
atleta negra, representante de
uma ex-colônia britânica, independente só em 1979.
Ela ainda tem dois desejos a
realizar em um curto espaço
de tempo. Um parece mais difícil: obter uma bolsa de estudos para treinar em um grande centro mundial (Europa ou
os EUA). Outro é mais prosaico: tirar uma foto ao lado da
americana Marion Jones, três
ouros em Sydney-2000.
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