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XICO SÁ
Virada só se for na cama
Foi só o São Paulo enfrentar um time portenho para retornar à condição de humano, humaníssimo
AMIGO TORCEDOR, amigo secador, foi só ouvir falar numa tal
Virada Esportiva, que acontece de sábado para domingo aqui em
São Paulo, para me dar uma preguiça monstruosa. Quase não sai nem
esta crônica. Ali acordando, liguei no
José Trajano, vi o anúncio da parada. Que preguiça, irmão, escute só os
estalos das costelas mais bíblicas. De
novo. Trac, trec, nada como a inércia
de uma bela ressaca. Que preguiça
monstruosa dessas coisas, dessa
gente que teima contra os vermes
inevitáveis dessa vida-gorgonzola.
Quando escuto falar em Virada
Esportiva eu viro pro outro lado em
cima da nega na cama. Vontade de
dormir até segunda, para não ver esse espetáculo de degradação humana. Triste. Essa história de morrer
corado e cheio de saúde não me convence nunca, que falta do que fazer
dessa humanidade que deseja uma
morte bonita, linda, exemplar, uma
morte com cheiro dos consultórios
ortomoleculares, os que teimam em
ludibriar, comprar a velha da foice
com falsos sorrisos, elixires, promessas de regimes, cápsulas milagrosas, emplastos e uma centena de
abdominais ridículos.
Que preguiça, Trajano, que preguiça, Peninha, que também estava
lá, mais eloqüente do que a gaita do
Bob Dylan, que preguiça, Dudu, prefiro rede no alpendre de Juiz de Fora, prefiro coçar meu bicho-de-pé na
praia do Janga. Parem com isso, respeitem a inevitabilidade da morte,
vão ler Philip Roth, narrando a desgraça do fim do espetáculo humano
a cada livro. Das artes de suar, só
uma merece respeito: o sexo.
E olhe lá, porque não carece esses
bambuais todos, melhor pegar de
jeito, com devoção, do que morrer
de cãibra e se iludir com a dramaturgia do orgasmo brechtiniano da moça do teatro da vertigem.
Amigo torcedor, amigo secador,
voltemos à cumeeira destas linhas,
façamos de conta que essa Virada
Esportiva não existe e nunca existiu.
Amigo tricolor, vamos falar do Boca. Viram o segredo para fazer mais
de um gol no São Paulo? É só não
crer no oba-oba da imprensa paulistana. Fácil, fácil. O corvo Edgar esperava por essa hora: deixa pegar um
time argentino, que não cai na lenda
urbana da equipe imbatível, que em
um instante retorna à condição de
humano, humaníssimo, um time em
nada melhor do que tantos outros de
nossas floridas várzeas. Só um portenho ou recifense, como o Náutico,
para mostrar aos Pedros Henriques
Buenos o caminho de casa.
Vamos falar do Kerlon, esse menino que dá ao jogo a fantasia de Alice
no País das Maravilhas, apesar da
estupidez de Leões e Coelhos. Que
jogo Cruzeiro 4 x 3 Atlético! Que jogaço também Vasco 1 x 1 Flamengo!
A arte de suar tem outro motivo decente: ser um garoto e jogar um clássico no Maraca, principalmente
com a camisa rubro-negra, que joga
sozinha sim, tem hora que você nem
vê o manequim de gesso que desfila
com ela, fenômeno.
Amigo, agora para fechar as cortinas, falemos da épica vitória do ABC
na Amazônia, pela Terceirona, 3 a 2
no Fast Clube, no coração da selva,
no Flora de Mendonça, Itacoatiara
(AM). O herói, de novo, Peninha e
Ferla, foi o zagueiro gaúcho Ben-Hur, anotem esse nome, é a cara do
Grêmio, vai cair como uma luva (de
peso-pesado, é claro!) na sempre delicada e santa zaga do Olímpico.
xico.folha@uol.com.br
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