São Paulo, segunda-feira, 21 de novembro de 2005

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FUTEBOL

O árbitro, Lula e a MSI

JUCA KFOURI
COLUNISTA DA FOLHA

Clemer estava salvando o Inter. Márcio Rezende de Freitas o matou. A expulsão de Tinga foi um absurdo, e o pênalti pareceu claro. Escrevo "pareceu" porque fiquei com a sensação de o próprio Tinga ter dito ao árbitro alguma coisa como "não foi nada, mas eu não me atirei".
Daí em diante é difícil dizer que o resultado tenha sido justo, muito embora até o segundo minuto do segundo tempo a vitória do Corinthians fosse indiscutível e até mais apertada do que o time merecia. Afinal, tinha mandado uma bola no travessão com Gustavo Nery e feito um gol com Carlitos Tevez, no primeiro tempo. E, no começo do segundo, chutado rente à trave com Carlos Alberto, além de ter obrigado Clemer a uma defesaça em jogada de Nilmar com Tevez.
E foi neste lance que o Inter se salvou porque, no ataque seguinte, o ótimo Rafael Sobis fez o gol que Carlos Alberto, em sua melhor atuação com a camisa alvinegra, não conseguira.
Então, o Inter cresceu, equilibrou o jogo, reteve a bola, e a partida, que se caracterizava por ser disputada em clima de ligação direta entre defesas e ataques, passou a ter clima de jogo de xadrez.
Mais a síndrome de Pacaembu de Márcio Rezende de Freitas prevaleceu. Não satisfeito com a lambança que fez na decisão de 1995, tratou de fazer outra dez anos depois. Uma lástima.
Lástima, diga-se de passagem, prevista pelo presidente da República, que vaticinou o empate e o tetracampeonato do Corinthians ao convidar Tevez para visitá-lo.
Certamente por não ter lido recente artigo do "Financial Times" que levanta interessante lebre: mais até que lavar dinheiro, o investimento de bilionários russos no futebol mundial (o artigo cita a parceria MSI/Corinthians e observa que Tevez custou US$ 16 milhões -e não os alardeados US$ 22 mi) busca reconhecimento social e boas relações políticas.
Modelo que repete exatamente o que os bicheiros cariocas fizeram com o Carnaval, e com o futebol, nos anos 70.
Maneira de ficar a salvo de intempéries em suas bases ou de criar rotas de fuga.
Faz todo sentido e não passa despercebido neste momento da vida brasileira em que Lula convida Tevez para ir ao Palácio do Planalto, com o que abrirá as portas à MSI, objeto de um inquérito feito pelo Ministério Público de SP (já concluído, com a constatação de "fortes indícios de lavagem de dinheiro") e de outro em curso no Ministério Público federal.
Mais: Lula abrirá simbolicamente as portas para Boris Berezovski, sobre cuja participação na parceria não há mais nem sombra de dúvida.
Dinheiro a rodo, time competitivo, agrados do governo, reclamar do quê? Outra vez, dos meios. Mas quem se importa com os meios? Só gente chata, que vê defeito em tudo e quer estragar prazeres. Afinal, ia tudo tão bem até aparecerem os Valdomiros, Valérios, Delúbios...
E não foi o Brasil, desde o Descobrimento, sempre tão receptivo aos deserdados?

Masoquismo explícito
Um amigo corintiano, jornalista, diz que dormiu aliviado na última quarta-feira, depois que o Corinthians perdeu para o São Caetano. Ele achava que estava tudo muito fácil, o que não combina com a história alvinegra. E defende a tese do sofrimento obrigatório com tal ardor que é capaz de dizer que se o preço de vencer a Libertadores (que segundo ele só existe para que o Corinthians possa ganhá-la um dia) for fazer 4 a 0 na decisão (como o São Paulo fez diante do Atlético-PR), ele prefere perdê-la. Pois o meu amigo terá, no mínimo, mais uma semana de alegre (para ele, é claro) expectativa, se é que não terá duas. E não me peça para revelar quem é. Só garanto que não se chama Leopold von Sacher-Masoc, até porque o Barão morreu em 1985.

@ - blogdojuca@uol.com.br


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