São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2004

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Presente de grego

Petros Karadjias/Associated Press
Protesto antiolímpico em Atenas


Na metade da Olimpíada, anfitrião constata que evento não servirá para catapultar o esporte do país

FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A ATENAS

PAULO COBOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A Olimpíada atinge hoje seu segundo domingo, e já não dá mais para esconder: no ânimo dos voluntários gregos, no público de ginásios e estádios, no movimento de ruas, avenidas e praças de Atenas, nos discursos dos dirigentes, a sensação é de vazio.
Um vazio acachapante. Inesperado. E inédito. Qualquer que seja o legado para o mundo desta 28ª Olimpíada da Era Moderna, ela deixará, internamente, a mácula de um tremendo fracasso esportivo. Que já abalou a empolgação inicial dos gregos, que superaram a desconfiança geral quanto ao seu poder de organização dos Jogos, mas não fizeram o mesmo na hora de disputar pódios.
Com praticamente metade das provas realizadas, a Grécia desafia a lógica que faz o país-sede dar um salto no quadro de medalhas.
Antes da Segunda Guerra Mundial, quando poucas nações enviavam representantes, e o evento era dominado por atletas locais, o país que recebia as provas incrementavam em 1.058%, em média, a presença no pódio em relação à Olimpíada anterior.
Após o conflito, com o boom no número de nações inscritas, o índice diminuiu, mas o fenômeno se manteve: incremento, em média, de 160% em comparação à edição anterior dos Jogos.
Se obedecesse a essa regra, a Grécia teria que amealhar 34 medalhas na Olimpíada que organiza -foram 13 em Sydney.
Mas tem até agora apenas cinco, sendo que uma delas deve ser confiscada: Leonidas Sampanis, que conquistou o bronze no levantamento de peso, foi flagrado no exame antidoping.
É mais um item da lista de vexames internos: nunca antes um atleta de um país-sede havia sido flagrado dopado na competição.
E poderia ter sido mais chocante. Herói local e favorito a um ouro no atletismo, o velocista Konstantinos Kenteris ficou fora dos Jogos após um mal explicado acidente de moto que supostamente o teria impedido de coletar urina para o antidoping. "É melhor ter menos medalhas, mas saber que são todas limpas", declarou ontem, já conformado, Spyros Kapralos, secretário-geral do Athoc, o Comitê Organizador dos Jogos.
Países que, como a Grécia, também estão longe de figurar entre as potências esportivas, fizeram bonito quando tiveram a chance de organizar a Olimpíada.
Depois de modestas quatro medalhas em Seul-88, a Espanha ganhou 22 em Barcelona-92, em um incremento de 450%, muito maior do que a média histórica.
Depois do Canadá em 1976, que aumentou seu número de pódios em casa, mas ficou sem ouro, o país-sede sempre figurou entre os dez mais. A Grécia ameaça acabar com esse tabu -é a 14ª colocada.
Os resultados ruins se espalham por todas as modalidades. Com 15 das 17 provas já realizadas, o tiro não viu um grego no pódio -o esporte é o terceiro que mais deu medalhas para a Grécia.
Na natação nenhum grego medalhou. Nos esportes coletivos, o cenário é ainda pior. Tanto no masculino como no feminino a Grécia ficou na lanterna de seus grupos nos torneios de futebol.
As mulheres perderam três jogos sem marcar nem um gol sequer. O beisebol trouxe atletas dos EUA, mas sofreu cinco reveses em cinco jogos.
E foram esportistas importados que não deixam o fiasco ser ainda maior. No judô, a Grécia ganhou um ouro com um atleta nascido na Geórgia. Mas o pior aconteceu ontem, justamente com o maior atleta olímpico grego. No levantamento de peso, Pyrros Dimas, que nasceu na Albânia, falhou na tentativa de ser o primeiro da sua modalidade a ganhar quatro ouros -ficou só com o bronze.

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