São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2004

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MEMÓRIA

Em 1932, falta de verba trancou atletas em um navio de café

DO ENVIADO A ATENAS

A única saída era improvisar. Sem dinheiro para custear o envio de uma delegação para os EUA em 1932, o presidente da Confederação Brasileira de Desportos, Renato Pacheco, depositou suas esperanças no principal produto agrícola do país. Foi o café que garantiu a viagem dos atletas do Brasil para os primeiros Jogos de Los Angeles, na epopéia que mais simbolizou a situação de penúria do esporte nacional.
Os tempos eram bem diferentes dos atuais. A pedido do presidente da época, Getúlio Vargas, o navio Itaquicê foi colocado à disposição dos dirigentes para transportar os esportistas. Nos porões, 55 mil sacas do chamado "ouro negro" estavam armazenadas. O produto deveria ser vendido nas escalas da viagem para bancar a estada da seleção.
Apesar de corresponder a 70% das exportações brasileiras, o café encontrava entraves no mercado internacional, e o governo queimava o excedente para manter a cotação.
Assim, as sacas chegaram quase intactas a Los Angeles. Dos 84 atletas da delegação, só 46 desembarcaram -eram os que tinham as melhores chances na competição. Os demais ficaram no navio por falta de dinheiro. Outros 13 que viajaram por conta própria deram números finais aos 59 representantes do Brasil.
Quem ainda tentou ampliar essa cifra foi Maria Lenk, primeira sul-americana a disputar uma Olimpíada. Acompanhada de Orlando Silva, chefe dos atletas, ela buscou empréstimo em um banco americano para ajudar seus conterrâneos.
Ao ser questionado sobre a cotação da moeda brasileira, o funcionário retrucou com outra pergunta: "O Brasil fica na África?". Resultado: nada de dinheiro. E os reféns do café seguiram para o porto de São Francisco, onde aguardaram o fim da competição. Apenas Adalberto Cardoso conseguiu saltar do navio e competir.
Ele chegou ao palco da disputa dos 10.000 m, sua prova no atletismo, minutos antes do tiro de largada. Ficou em último lugar, mas foi aplaudido. Motivo: durante a prova, o narrador contou ao público a via-crúcis que o brasileiro cumprira para chegar. (GR)


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