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MOTOR
Sangue
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE
Sempre achei absurdo aquele
lençol que a F-1 usa para evitar imagens chocantes dos acidentes. Considerava aquilo censura, cerceamento, questões normalmente caras ao jornalismo.
Pois senti falta do tal pano na
última corrida da Indy. As imagens do resgate a Zanardi embrulham o estômago. Talvez nem
tanto para os que assistiram ao
vivo, sem a informação de ele tivera as duas pernas amputadas.
Rever as imagens sabendo disso,
porém, é um exercício mórbido.
É possível perceber que a mutilação de Zanardi ocorre já no
choque. A parte da frente do cockpit se desintegra e, com ela, vai
também o que abrigava. Um dos
médicos gasta rolos de ataduras
nas pernas do piloto e, em dado
momento, desiste. Outro chega
com um cobertor e as envolve,
pois não há curativo possível.
O sangue se espalha pelo asfalto
e, a despeito do quadro trágico, os
carros passam em comboio para
completar uma corrida que nem
deveria ter começado, dado a falta de familiarização dos pilotos
com a pista e os poucos treinos.
Acidentes como esse chocam pelos detalhes. Mas resgatam, de
certa forma, uma certa humanidade que é negada à figura do piloto. O chamado herói das pistas
de repente se torna uma pessoa
normal, de carne, osso, sangue. A
competição perde o glamour, se
havia algum, e escancara seu lado inútil, estúpido, gratuito.
E se se assume mortal, mesmo
que por instantes, é natural que o
piloto tenha reações legitimamente humanas. Schumacher, no
dia seguinte ao acidente de Zanardi, teve uma, básica, banal.
Do alto de seus quatro títulos
mundiais, tentou costurar um
pacto de cavalheiros para que,
principalmente nas duas primeiras chicanes, os pilotos se respeitassem e não ultrapassassem.
O gesto, se bem-sucedido, seria
um eficiente tapa na cara da cartolagem, que nada fez em Monza
para evitar a repetição do acidente que matou um bombeiro na
edição do ano passado. Começar
uma corrida de F-1 neutralizada
pelos próprios pilotos seria, de fato, um evento histórico, como foram as tímidas greves do passado.
O problema é que o alemão não
faz o tipo aglutinador, pelo contrário. Sua lista de desafetos é
enorme, e seu comportamento na
pista, todos sabem, está longe de
ser polido. Villeneuve nunca passaria esse recibo, e alguns outros
pilotos foram obrigados pelas
equipes a não concordar com o
protesto. Schumacher ainda tentou um corpo-a-corpo no grid,
que serviu apenas para as câmeras. Chegou a cogitar não participar da corrida, mas Montezemolo vetou. Decidiu então que não
subiria ao pódio em hipótese alguma, até mesmo vencedor.
Disse ainda que não iria a Indianápolis. O veto, dessa vez, partiu de Ecclestone, que lembrou
que ele só será declarado campeão quando receber o troféu da
FIA, em Mônaco, no final do ano.
Enfim, Schumacher tentou bancar o sindicalista e se deu mal.
Tentou usar seu peso de tetracampeão e foi rejeitado. Óbvio,
houve uma certa dose de vaidade
nisso. O principal, no entanto, é
que não conseguiu romper com a
atitude passiva que caracteriza o
piloto profissional, com a rede de
interesses que mantém o principal personagem do esporte cordeiro diante do risco da profissão.
Não será Schumacher a fazer a
revolução. E, até que ela aconteça, se um dia acontecer, tragédias
como a de Zanardi se repetirão.
Indianápolis
Schumacher à frente, muitas pessoas envolvidas com a F-1 temem
se tornarem alvo do terrorismo no GP dos Estados Unidos, no próximo fim de semana. Quem conhece bem a história, porém, garante que a categoria tem uma espécie de salvo conduto para esse tipo
de ocorrência e outras mais. De Ecclestone a Mosley, passando por
alguns chefes de equipe, o trânsito de boa parte da turma nas chamadas regiões obscuras do planeta já foi muito grande no passado.
E, dizem, altamente lucrativa.
Vestibular
A molecada foi às pistas nesta semana. Felipe Massa, campeão antecipado da F-3000 européia, foi bem no teste com a Sauber e já é
cotado para a vaga em aberto no time em 2002 -dizem, também,
que já tem contrato assinado com a Ferrari. Ricardo Sperafico e
Antonio Pizzonia se digladiaram em torno de uma vaga para testes
na Williams no ano que vem. A de titular continua distante.
E-mail: mariante@uol.com.br
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