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Cirurgia a laser
Campanha de Scheidt mostra nova técnica e indica troca de classe
DOS ENVIADOS A ATENAS
Tudo é calculado. Detalhes da
estratégia, hora certa de agir, limites para ultrapassar rivais, domínio do barco e controle do clima.
Não há chance para o acaso.
O estilo com que Robert Scheidt
conquistou ontem o bicampeonato na classe laser difere -e
muito- do utilizado em suas
campanhas olímpicas anteriores.
Nada de buscar vitórias a todo o
custo. Na Grécia, seu trunfo foi
outro. Em uma palavra: tática.
"Viemos para cá sabendo que
seria uma competição diferente.
Era preciso ser técnico, muito regular. O campeão não seria aquele
que ganha uma regata e chega em
último na outra, mas sim o que ficasse sempre entre os melhores.
Acertamos", explica Cláudio Biekarck, seu treinador.
O viés calculista e pragmático de
2004 salta aos olhos quando os
números são comparados com os
Jogos anteriores. No primeiro ouro, em Atlanta-1996, Scheidt venceu três das 11 regatas. Quatro
anos depois, em Sydney, triunfou
em cinco. Mesmo assim, sucumbiu na disputa com o inglês Ben
Ainslie. Sua trajetória na Grécia
teve outro rumo. Venceu só uma
regata em toda a competição.
Ontem, a prova
final foi retardada
por vento fraco, teve uma largada
cancelada e quase
não saiu do papel.
Apesar dos problemas, Scheidt
velejou com segurança, de olho no
regulamento e terminou em sexto.
"Estava calmo. Isso é experiência.
Vem aos poucos,
com o tempo", explica o atleta.
Na verdade, vem também de
uma preparação diferenciada.
Desde o revés no Mundial de
2003, quando perdeu o título no
derradeiro dia de disputa, Scheidt
decidiu redobrar o cuidado nos
treinos. Não queria surpresas.
"O jeito de velejar depende da
competição. Depois daquela derrota, o Robert evoluiu. Hoje ele
tem maturidade para se adaptar a
qualquer tipo de clima e mar,
mesmo os mais complicados, como esse da Grécia", diz Biekarck.
De fato, as surpresas sumiram.
Scheidt ganhou os dez torneios
que disputou em 2004, sempre
com estilo letal. "Nem durmo direito nas competições. Fico pensando na corrida, em como o vento estará no dia seguinte", conta.
O ouro de ontem coroou a temporada impecável e abriu portas
para um desejo acalentado desde
2000. Após o término da Olimpíada, Scheidt chamou Biekarck para
uma conversa particular. Confessou que, após nove anos na laser
(embarcação de 4 m), gostaria de
provar seu valor em outra classe.
O técnico ponderou. "Ele ainda
tinha uma ótima condição física
para brilhar onde estava." Agora,
a mudança é iminente.
"Não sei ao certo em que barco
vou competir nos próximos Jogos", relata o atleta. Seu treinador,
contudo, é bem mais incisivo:
"Não acredito que, em Pequim,
ele estará correndo com o laser".
A troca de embarcação não está
só no plano das idéias. Há pelo
menos três anos, ele adquiriu um
barco da star -em relação ao laser, dois metros a mais de casco,
outro tripulante e exigência de perícia técnica maior. O material todo custou R$ 57 mil, valor dividido com outro atleta, Bruno Prada.
"O star está pronto. Vou fazer
algumas regatas no segundo semestre. Espero aprender mais sobre outras partes da vela, sobre o
trabalho da tripulação, sobre preparação. Acho que posso ter bons
resultados em outras classes."
Há até a hipótese de uma aventura em torneios de oceano, os
mais badalados do circuito.
Scheidt disse que já discutiu
com "algumas pessoas" uma participação na America's Cup, disputa em veleiros de 15 m de comprimento e considerada uma das
mais complexas do esporte.
"Se tiver a chance de estar num
time competitivo, seria legal."
Difícil é repetir em outra empreitada seu desempenho arrasador da laser. Mas, como diz seu
pai, Fritz, Scheidt é um homem
que "cumpre suas metas".
Ontem, ele realizou talvez a
mais antiga. Em 1980, com sete
anos, viu o velejador Alexandre
Welter desfilar em carro aberto
com o ouro obtido nos Jogos de
Moscou, em parceria com Lars
Bjorskstrom na classe Tornado.
Decidiu, naquele instante, que
queria ser como ele. Agora, deixou Welter para trás. Assim como
todos os outros atletas olímpicos
brasileiros.
(GUILHERME ROSEGUINI E ROBERTO DIAS)
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