São Paulo, Quinta-feira, 23 de Setembro de 1999
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FUTEBOL

Prefeitura faz exigências em edital para exploração de publicidade e beneficia empresa ganhadora

Sob suspeita licitação do Pacaembu

MARCELO DAMATO
FERNANDO MELLO
JOSÉ ALBERTO BOMBIG
da Reportagem Local



A licitação que definiu a empresa que vai explorar a publicidade ao redor do campo do estádio do Pacaembu tem fortes indícios de que foi realizada com o objetivo de beneficiar a agência que ganhou a concorrência, a Target Sport Marketing, que está no estádio desde março de 1996.
Entre as exigências feitas pela Prefeitura de São Paulo, estão as seguintes: as placas devem funcionar em sistema rotativo contínuo, as dimensões dos módulos devem ser de aproximadamente 3 m x 0,9 m, com sistema de fornecimento de energia próprio.
Esta é exatamente a descrição dos painéis da Target. Apenas as empresas que conseguem preencher todos os requisitos exigidos pelo município podem concorrer na licitação.
Sob a alegação de que seguiu a Lei das Licitações (Lei 8666/93) e a lei municipal sob o assunto (Lei 10.544/88), a Prefeitura do Município de São Paulo estabeleceu tantas restrições no edital que, das sete empresas que o retiraram, só uma, a própria Target, apresentou proposta, de R$ 72.300, levemente maior do que o lance mínimo, de R$ 70 mil.
Em 1996, embora o lance mínimo tivesse sido de R$ 50 mil, a Target teve que oferecer bem mais. Ganhou com um lance de R$ 106.245,50 mensais, apenas R$ 245,50 a mais do que a Publisport (Grupo Paes Andreotti), num resultado que gerou polêmica.
De acordo com os três advogados especialistas em licitação pública, ouvidos pela Folha, o edital fere os princípios da igualdade e da competitividade, previstos na Lei das Licitações.
"Eu não teria dúvida em dizer que é licitação dirigida. A prefeitura tem que buscar a melhor proposta, e não criar cláusulas que comprometam a competição e a igualdade", afirma o advogado Adilson Dallari, professor de direito administrativo da PUC-SP e autor do livro "Aspectos Jurídicos da Licitação".
A redução do que a Target vai pagar pelo atual contrato, de 32%, em relação a 41 meses atrás, contrasta com o crescimento da economia ligada ao futebol no Brasil.
Um conjunto de painéis para ser usado num campo custa em torno de US$ 350 mil (R$ 600 mil)
Para efeito de comparação, os direitos de transmissão de TV do Campeonato Brasileiro passaram de R$ 12 milhões para R$ 60 milhões nesse período.
O preço cobrado pelas agências por anúncios em placas publicitárias para jogos da primeira fase do Brasileiro também é alto.
Para a partida entre Sport e Corinthians, no próximo sábado, a Klefer, cobrará do anunciante pelo menos R$ 7.000,00.
O proprietário da Target, Ivan Borges, acredita que o valor que a sua empresa ofereceu é justo. "O Pacaembu é um estádio complicado. Nunca se sabe se os jogos vão ocorrer lá ou não. O preço que pagamos na primeira licitação está fora do mercado hoje. Oferecemos menos do que os R$ 106 mil porque achamos que só assim o investimento valeria a pena", afirma Borges.
A própria empresa, embora negue ter havido má fé, admite que suas placas foram usadas como modelo para a licitação -o que aliás nem a procuradora da Secretaria Municipal de Esportes Selma Moreira Santos Abreu Félix, nem o engenheiro-chefe da secretaria, Inácio Solowieczyk, negam.
"A prefeitura se baseia no que já existe e deu certo", diz Borges.
"A descrição do objeto é muito detalhada. Licitação é sinônimo de competição. Esses princípios têm que ser observados. No meu entender, ela feriu o artigo terceiro da Lei das Licitações (veja quadro)", diz o advogado Toshio Mukai, doutor em direito do Estado pela USP.
Segundo uma empresa que se interessou pela licitação, mas pediu para não ser identificada, nenhuma firma do exterior fabrica os painéis nesse tamanho, apenas uma brasileira -e a única concorrente que possui os painéis dela é a Target Sport Marketing.
Uma das derrotadas na licitação, a Área Marketing, que disse possuir painéis de 1,50 m x 0,78 m, ainda tentou impugnar essa exigência junto à prefeitura, mas teve o recurso rejeitado.
"A prefeitura está vendendo espaço. Como a empresa vencedora vai usar o espaço, desde que não atrapalhe os atletas ou espectadores, é problema dela", afirma o advogado Paulo Boselli, professor de licitações da Fatec.
Segundo ele, a impugnação do edital pelas empresas que tenham se sentido lesadas é impossível, pois o prazo já se esgotou. "Quem se sentir lesado deve recorrer às autoridades, como o Tribunal de Contas, o Ministério Público e a própria secretaria para tentar paralisar o processo", diz.


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