|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Palestra é eldorado para atletas
Cachês de até R$ 100 mil atraem esportistas para eventos motivacionais promovidos por empresas
Apesar da diversidade de palestrantes, conteúdo das conferências pouco muda e relaciona vida no esporte com valores corporativos
CAROLINA ARAÚJO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Sou pequena, mas tenho 16
anos de profissão e posso passar muita experiência de vida
para vocês", afirmou a ginasta
Laís Souza, 19, depois de se definir "um pouco nervosa" em
sua estréia como palestrante.
Na meia hora em que enfrentou cerca de 70 engravatados
em um auditório na zona sul de
São Paulo, a ginasta cumpriu o
que fora ensaiado com assessores durante duas semanas.
Falou sobre a carreira, interagiu com a platéia e encerrou
com o que disse ser seu lema:
"Não importa quantas vezes
você cai, mas quantas vezes você levanta após a queda".
Laís é mais uma atleta que ingressa no mercado de palestras
motivacionais para o mundo
corporativo, em que personalidades -do técnico Zé Roberto
Guimarães à cestinha Hortência, do nadador Lucas Salatta
ao piloto Luciano Burti- tentam transformar experiência
no esporte em fonte de renda.
O cachê normalmente flutua
entre R$ 3.000 e R$ 50 mil, dependendo da popularidade e
experiência do atleta. Mas palestrantes considerados "top",
como os técnicos Bernardinho
e Felipão, recebem até R$ 100
mil por evento, segundo empresas de marketing esportivo.
A procura por conferencistas
do esporte é estimulada pela
exposição dos atletas na mídia.
"Eles têm mais apelo. São ídolos que as pessoas querem conhecer", afirmou Renato
Chvindelman, da Arena.
Esportistas também são associados à noção de credibilidade. "O público acompanha as
conquistas e comprova que os
conselhos deles funcionam na
prática", afirma Melissa Andreu, da Galeria de Esportes.
Para mostrar ao público que
o caminho para o sucesso é semelhante nos ambientes esportivo e corporativo, o conteúdo das palestras motivacionais pouco muda, apesar da diversidade de atletas que se arriscam como conferencistas.
Analogias entre esporte e negócios são exaustivamente repetidas: vitórias são comparadas ao alcance de metas e adversários, à concorrência.
O que varia é o estilo do conferencista. Há quem invente
teorias, como o técnico Bernardinho, que criou o conceito de
"roda da excelência" para explicar seu sucesso nas quadras.
O mais comum, porém, é
usar a própria história como
exemplo de sucesso. O ex-jogador de basquete Oscar Schmidt,
como vários outros atletas, fundamenta sua apresentação em
"causos" da sua carreira.
Em clima informal, o ex-cestinha encena situações, conta
piadas e não economiza em palavrões. "Eliminei meus vícios
de linguagem, mas deixei os palavrões porque fazem parte do
esporte coletivo", justifica.
Palestrante desde 1996, Oscar participa de 10 a 20 eventos
por mês. "Fico muito feliz porque, contando a minha própria
história, faço as pessoas rirem e
até chorarem de emoção", acredita o ex-jogador.
Waldemar Niclevicz é outro
veterano. Primeiro brasileiro a
chegar ao topo do monte Everest, em 1995, o alpinista faz
conferências desde os anos 90 e
diz que o cachê e a venda dos
dois livros que escreveu servem
para financiar suas expedições.
"Qual é o seu Everest? É a integração energética da América
Latina?", perguntou Niclevicz
para cerca de 150 profissionais
do setor elétrico que participavam de uma feira em São Paulo.
O alpinista defendeu, em sua
palestra, que "todos nós temos
uma montanha, um desafio para escalar". Em meio a fotos de
suas façanhas, pediu que a platéia "lute, como um verdadeiro
alpinista, para chegar ao topo
da montanha na sua profissão".
As frases de efeito, quando
não são próprias, podem ser
emprestadas. Na apresentação
de slides da bandeirinha Ana
Paula Oliveira, a frase "A persistência é o caminho do êxito",
atribuída a Charlie Chaplin, dividia espaço com a capa do ensaio que a assistente fez para a
revista "Playboy", em 2007.
E a auto-ajuda não parou em
Chaplin. "Oportunidade é diferente de oportunismo. Temos
que achar nossas oportunidades sem sermos oportunistas",
recomendou Ana Paula, que, no
final da sua apresentação, deixou o palco aplaudida de pé.
As palmas não significam o
fim da tarefa para os conferencistas do esporte. Quando o
evento acaba, palestrantes voltam a ser atletas e colaboradores do mundo corporativo, fãs.
E a missão só estará cumprida
após serem atendidos os vários
pedidos por fotos e autógrafos.
Texto Anterior: Juca Kfouri: O maior domingo do São Paulo Próximo Texto: Frase Índice
|