São Paulo, domingo, 24 de janeiro de 2010

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TOSTÃO

Relações perigosas


As relações de jornalistas com atletas, técnicos, dirigentes e clubes são conflitantes e, às vezes, pouco profissionais


NESTA SEMANA , Roberto Carlos, com raiva, fez duras críticas a Galvão Bueno por causa do "episódio da meia", no gol da França que eliminou o Brasil da Copa do Mundo de 2006. A maior parte da imprensa, e não apenas Galvão, criticou o jogador e viu, no lance, mais que um erro técnico.
Depois de ver a jogada por 1 milhão de vezes, ainda não sei se havia, ou não, um posicionamento defensivo combinado. Não sei também por que Roberto Carlos estava abaixado na entrada da área, mesmo se fosse ali seu lugar. Certamente, o baixinho Roberto Carlos não deveria ser o jogador para acompanhar o grandalhão Henry. Seja o que for, é injusto culpar o lateral-esquerdo pela eliminação. A França foi melhor.
A revolta de Roberto Carlos com Galvão Bueno me faz pensar sobre as relações entre jornalistas e jogadores, técnicos e dirigentes.
Quando jogava, havia, mais que hoje, jornalistas que não só assumiam as paixões pelos clubes como também apenas defendiam e exaltavam seus times. Existia, em Minas, um colunista que só falava do Atlético, outro, só do Cruzeiro, e um terceiro, só do América.
Em um clássico entre Atlético e Cruzeiro, dei um drible em meu marcador, que ficou de joelhos no gramado. O colunista atleticano, amargurado com a derrota, escreveu que o jogador do Atlético deveria ter me dado um soco para salvar a honra do clube.
Deve ser por essas colunas clubísticas, e por outros motivos, que dirigentes do Corinthians não se conformam com a imparcialidade e independência do corintiano Juca Kfouri nem os do Cruzeiro aceitam minhas críticas, ainda mais que fui atleta do clube. Quando elogio, com motivos para isso, devem achar que é minha obrigação.
No passado, havia, mais que hoje, jornalistas, principalmente os que faziam a cobertura de um mesmo clube, que se tornavam amigos de jogadores e técnicos. Recebiam informações privilegiadas e, em troca, poupavam suas fontes de críticas. Alguns se tornavam tão íntimos que passavam a ser, extraoficialmente, quase assessores de imprensa. Havia até os que organizavam, depois das partidas, festinhas e encontros para seus amigos famosos.
Hoje, como a TV Globo domina a audiência, tudo o que faz tem enorme repercussão.
Por ser famoso e porta-voz da emissora, transfere-se para Galvão Bueno tudo o que se fala de importante nas transmissões das partidas. Além disso, Galvão não deixa os outros falarem.
A TV Globo não faz excelentes trabalhos e dá ótimos furos somente porque tem competência e ótimos profissionais, além de privilégios. Também porque os jogadores, técnicos e dirigentes adoram aparecer na Globo. Cria-se um vínculo com a TV. Mas quem decide se haverá elogios ou críticas é a audiência. Os atletas, de excessivamente elogiados, passam a ser duramente criticados, como na eliminação do Brasil na Alemanha, em 2006. Daí a revolta de Roberto Carlos.
O jornalista tem de estar perto da fonte e das notícias e, ao mes- mo tempo, ter um distanciamento crítico.
Não tenho nenhuma pretensão de ditar regras, ainda mais que não sou jornalista. Sou um colunista. Apenas observo e opino.


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