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São Paulo, terça-feira, 25 de fevereiro de 2003

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FUTEBOL

O outono dos patriarcas

JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA

Hoje eu poderia falar do São Caetano 100%, da surpreendente Portuguesa Santista ou do empate conveniente entre São Paulo e Santo André. Poderia falar do absurdo regulamento que dará ao Corinthians, segundo colocado do Grupo 3, a vantagem do mando de jogo e do empate no jogo contra o líder do Grupo 1, o Barbarense. Poderia falar da ironia de o Santos ficar logo atrás do time que entrou de forma ilícita no torneio. Poderia falar de tudo isso, mas não vou.
Hoje achei que o melhor assunto seriam dois patriarcas da política brasileira: Antonio Carlos Magalhães e Ricardo Teixeira (sim, futebol também é política). Eles têm mais em comum do que sonha nossa vã sociologia. Tanto ACM quanto Teixeira estão no poder há muito tempo, valendo-se de manobras nem sempre muito transparentes. Tanto ACM quanto Teixeira foram alvos de denúncias e tiveram que se esforçar muito para escapar de investigações parlamentares.
Tanto ACM quanto Ricardo Teixeira, percebendo a perspectiva de mudança na política, procuraram se aproximar de Lula, declarando seu voto nele, fazendo juras de amor e tratando de estabelecer canais de comunicação para, numa eventualidade, poder apelar para os métodos aos quais se habituaram a recorrer.
Tanto ACM quanto Ricardo Teixeira abriram o ano mostrando que os tempos mudaram, mas eles não. ACM foi apanhado no caso dos grampos telefônicos, um escândalo pessoal e político que mostra os métodos que o (ainda) senador usa para ter todos seus desafetos sob seu poder.
Ricardo Teixeira não ficou atrás e, também pensando que ainda podia fazer tudo, convidou o Flamengo e o Cruzeiro para participar da Copa Sul-Americana em lugar do Atlético-MG e do Juventude, clubes mais bem classificados no último Brasileiro e que, portanto, deveriam ter sido premiados com essas vagas.
Os dois patriarcas, nesse começo de ano, continuaram se julgando onipotentes. A diferença é que Teixeira ainda não se sente tão pressionado quanto ACM e pensa mais em reeleição do que em renúncia. Ele talvez confie na distração dos torcedores, no esquecimento da imprensa e na sonolência da Justiça. Talvez acredite que os tempos não mudaram tanto.
Pode ser que ele tenha razão. O novo governo não fez muito esforço para investigar ACM e, se não fossem as denúncias de "Veja" e "Isto É", talvez o caso morresse com o tempo. No caso do futebol, mesmo que a CBF seja uma instituição privada, cabe ao poder público uma tomada de posição. O ministro Agnelo Queiroz vem de um time, o PC do B, que pode ter vários defeitos, mas possui uma grande qualidade: não foge do jogo, não perde por WO.
Além disso, a torcida do Atlético-MG está indignada e mobilizada. As injustiças já não recebidas apenas com muxoxos ou frases como "o Brasil não tem jeito mesmo...". Esses dois velhos patriarcas são um bom teste para sabermos se os novos tempos são realmente novos.

Quadrilhas
Os confrontos causados pela Tricolor Independente provocaram três mortes no último fim de semana. Um corintiano, um são-paulino, um palmeirense. Um triste empate. Ou uma tripla derrota. O assassinato de alguém que sai para se divertir, seja para sambar ou torcer pela sua equipe, é mais do que um assassinato, é a proibição da felicidade. Simbolicamente, a violência chega às duas instituições mais sagradas do país, o futebol e o Carnaval, dois símbolos de nossa improvável alegria. E houve ainda o caso do ex-presidente da torcida uniformizada santista Sangue Jovem, que foi preso na semana passada por tráfico de drogas e posse de armas. Torcidas ou blocos que utilizam armas não são torcidas ou blocos. São quadrilhas.

E-mail torero@uol.com.br


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