São Paulo, segunda-feira, 25 de abril de 2005

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FIM DO BAILE

Acostumados com o "setor mais democrático de estádio", torcedores fazem juras de amor e lamentam despedida

Geraldinos vivem últimas emoções no seu pedaço

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

"Se chorei ou se sofri, o importante é que grandes emoções na geral eu vivi." Escrita em uma faixa, a mensagem, que parodia o principal refrão da música "Emoções", de Roberto Carlos, mostrava o sentimento de tristeza do mecânico de avião e geraldino Róbson de Oliveira, 44, com o fechamento do setor mais popular do estádio do Maracanã. O jogo de ontem, entre Fluminense e São Paulo, foi o último da geral, que dará lugar a cadeiras.
Oliveira representa o que de mais tradicional existia na geral. Como muitos outros torcedores, fazia questão de ir para o Maracanã fantasiado de roqueiro do Kiss (grupo de rock pesado). "Faz 20 anos que eu venho de geral. É muito triste o que vão fazer. Ninguém sabe agora como os geraldinos vão fazer para vir ao Maracanã. Vai acabar essa energia", disse.
O Maracanã ficará fechado por cerca de oito meses. O estádio passará por obras em virtude do Pan de 2007, no Rio.
Depois do final da partida, muitos torcedores beijaram o chão da geral e levantaram as mãos para os céus. Alguns choraram, como o marceneiro Euzébio Rodrigues, 49, último a abandonar o setor. "É uma tristeza muito grande. Vinha à geral desde os meus 14 anos e vivi grandes emoções aqui. Fazia chuva ou sol estava na geral."
Com o rosto colorido com as cores do Fluminense, o pintor Sílvio Antunes Teixeira, 28, saiu de Maricá (cidade a 60 km do Rio) para dar o último adeus à geral e levou uma faixa com uma mensagem bem curiosa para protestar. "Maracanã sem geral é um casamento sem sexo!!!".
Seu colega, o também pintor Francisco Menezes Amaro, 35, disse que o Maracanã vai acabar. "A geral é o coração do Maracanã. Sem geral, o Maracanã não existe", exclamou.
Conselheiro do Fluminense, Desirée Rogério de Oliveira, 55, disse que tem direito a entrar de graça na tribuna, mas sempre ia de geral. "Vai acabar o setor mais democrático do futebol independente de qualquer raça ou categoria. Aqui na geral, todo mundo é um só", disse
Uma das mais emocionadas era a torcedora Maria de Lourdes Pereira, 63, conhecida como a "vovó da geral". Chorando muito, ela fez um desabafo. "Isso aqui é a minha vida. Não pode acabar", afirmou.
Alguns torcedores inovaram em seu protesto. Foi o caso do estudante Rodrigo Gomes, 21, que levou um caixão de papelão para simbolizar o fim do setor. "Descanse em paz. Saudades da geral 1950 [data de fundação] 2005 [fechamento]. Para ele, a geral tinha que ser imortalizada.
Filho do técnico do Fluminense, Abel Braga, o estudante Rafael Braga, 23, dispensou o conforto para ir com os amigos para a geral. "Tinha que vir me despedir da geral. Gosto de ver as emoções de perto", disse.
Além das homenagens, a torcida aproveitou ao máximo o último jogo da geral. Correu de um lado para outro, pulou, vibrou, xingou o árbitro e os jogadores e ainda fez a tradicional aparição para as câmeras de televisão toda vez que um escanteio era cobrado.
O professor de educação física, Marcelo Medeiros, 26, estava revoltado com o fechamento. "A geral é um símbolo cultural do Rio de Janeiro. Se é para ver o jogo sentado, prefiro me sentar em casa." Medeiros levou uma faixa homenageando o setor mais popular do estádio e o novo papa, Bento 16. "Geral, patrimônio da humanidade. Abençoada por Deus." E que agora jaz.


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