São Paulo, domingo, 25 de outubro de 1998

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FUTEBOL
Aumento de clubes no campeonato pode dividir dirigentes no apoio a um novo mandato de Ricardo Teixeira
Brasileiro-99 assombra sucessão na CBF

MARCELO DAMATO
da Reportagem Local

A alteração do número de clubes para o Brasileiro-99, se não for definida até meados do ano que vem, ameaça se tornar o principal prato da próxima campanha eleitoral para a presidência da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), prevista para o segundo semestre.
Ricardo Teixeira, que preside a entidade desde janeiro de 1989, atravessará um momento de fragilidade política no próximo ano, quando tentará buscar o seu quarto mandato (seriam quatro anos a partir de janeiro do ano 2000).
Vários presidentes de federações, insatisfeitos com a política da CBF de reduzir o número de participantes da Série A (primeira divisão), podem se rebelar contra Teixeira se não houver uma reformulação na fórmula da competição.
O que eles defendem basicamente é o aumento do número de clubes para aumentar o número de Estados presentes na Série A. Neste ano, os 24 participantes pertencem a nove unidades da federação.
Três são do Sudeste, três do Nordeste, duas do Sul, uma do Centro-Oeste -logo, nenhuma do Norte.
Mas uma elevação do número de competidores como essa teria como principais prejudicados os clubes que estariam na Série A do ano que vem de qualquer forma.
Com mais clubes, uma das principais fontes de receita, a venda dos direitos de TV, seria repartida em mais (e menores) pedaços.
Pelas regras da CBF, o poder eleitoral das federações é maior, mas não muito, do que o dos clubes.
O aumento do número de clubes na Série A poderia criar um problema jurídico adicional, o de se esses clubes teriam ou não direito a voto nas eleições da entidade.

Reforma
Até o momento, nenhum dirigente se atreve a falar abertamente contra Teixeira.
Muito menos existe um movimento organizado ou um candidato de oposição. Isso só deverá acontecer se a insatisfação crescer ou, por algum motivo, se o presidente da CBF se enfraquecer politicamente nos próximos meses.
No Nordeste, o expoente dessa insatisfação é o presidente da Federação Pernambucana de Futebol, Carlos Alberto de Oliveira.
"No ano que vem, se não for feito nada, só haverá oito Estados representados, porque o América-RN está quase rebaixado."
Na "reformulação" defendida por Oliveira, o ranqueamento dos clubes para a definição da divisão que ele disputará vai depender não só do critério técnico, mas também do patrimônio, da tradição e da torcida de cada agremiação.
Apesar de defender no início que todos os Estados deveriam ser representados, Oliveira logo excluiu alguns, como Acre e Piauí.
Apesar de defender uma nova distribuição de clubes pelas divisões, ele afirmou várias vezes ser contra uma "virada de mesa".
"Defendo, e já há muito tempo, algo mais profundo. O Fluminense, se tiver que enfrentar o Picos (PI), morre. Os clubes de grande torcida não podem cair para a terceira, quarta, quinta divisão."
Nem o fato de que uma lei federal, a Lei Pelé, impede o acesso e o descenso que não seja por critérios técnicos o incomoda.
"Fui deputado federal por 12 anos. Se a lei atrapalha, muda-se a lei. Essa é uma questão de importância menor", afirma Oliveira.

Adversários
Caso haja disputa, o mais provável candidato da oposição é o presidente da Federação Paulista de Futebol, Eduardo José Farah.
Após aparecer como seu opositor durante anos (chegou a dizer que a gestão Teixeira merecia nota zero na administração do futebol brasileiro, excetuando a seleção), Farah adotou neste ano uma postura conciliadora e iniciou um processo de aproximação com os presidentes das federações.
Durante anos, Farah foi visto como arrogante pelos colegas, que se queixavam até que ele os evitava.
Mas o anunciado sucesso financeiro dos últimos campeonatos paulistas aumentou o prestígio do presidente da federação paulista.
Neste ano, ele conseguiu trazer para São Paulo a realização do 2º Fórum do Futebol Brasileiro, a primeira vez em décadas que um evento importante da CBF foi realizado no Estado.
Após o Fórum, Farah passou a defender publicamente a realização de um Brasileiro com 48 clubes, o dobro do tamanho atual.
Apenas como exemplo, se a Série A e B fossem fundidas, o número de clubes passaria de 24 para 48. Já o total de Estados representados subiria de 9 para 16.
Contra Farah, além da imagem de soberbia ainda não inteiramente apagada, há ainda a rivalidade que ele mantém com dois dos principais eleitores favoráveis à "virada de mesa", os cariocas Eurico Miranda, vice-presidente do Vasco, e Eduardo Viana, presidente da Federação do Estado do Rio.
Apesar de Farah de um lado, e Miranda e Viana, de outro, defenderem a mesma medida -o aumento do número de clubes do Brasileiro, os dois lados defendem caminhos opostas.
Farah defende, pelo menos formalmente, uma transformação organizada, mantendo-se os critérios do ano anterior. Seria mais uma fusão de divisões, como a que promoveu no futebol paulista.
Viana e Miranda, por sua vez, apostam na força política de alguns clubes na CBF e no Tribunal de Justiça Desportiva para definir que fica na Série A e quem não fica.
Além disso, parte do destaque conseguido pela dupla que domina o futebol do Rio é o discurso antipaulista. Como a oposição aos dois no Rio, especialmente o presidente do Flamengo, Kléber Leite, usa Farah para atacá-los, Miranda e Viana fizeram do dirigente um alvo.

Privilégios
A discussão sobre o tamanho da Série A também revela as contradições no discurso da maioria dos clubes grandes.
Precisando de maior arrecadação (patrocínio + rendas + direitos de TV), os clubes defendem o enxugamento da primeira divisão. Mas, sempre que se vêem ameaçados de rebaixamento, começam a articular "viradas de mesa" para evitar fora do campo o que não conseguiram dentro dele.
Dirigentes de clubes como Flamengo, Fluminense, Corinthians, São Paulo, Grêmio, Atlético-MG já defenderam publicamente o fortalecimento da Série B (segunda divisão), mas depois disseram que seus clubes "são importantes demais para cair".
Até agora, apenas uma pessoa se colocou publicamente contra a mudança nas regras, o presidente do Clube dos 13, Fábio Koff. Novamente, ele ameaçou abandonar o cargo se isso acontecer.
Além disso, Koff não vota nas eleições da CBF, e o fato de viver em Porto Alegre (RS) o tira das discussões diárias na confederação.
"Até agora, tudo o que me dizem é que as regras serão mantidas", disse à Folha.
O dirigente credita à manutenção do regulamento do ano passado o aumento do público verificado neste Brasileiro.
O principal trunfo de Koff na defesa de sua posição é sua eficiência como administrador e negociador dos interesses dos clubes que representa.
Criado em 1987 para protagonizar a maior "virada de mesa" do futebol brasileiro -a criação da Copa União, que deixou de fora Guarani (SP) e América (RJ), segundo e terceiro colocados no Brasileiro-86-, o Clube dos 13 jamais conseguiu crescer por conta da desconfiança mútua dos presidentes dos times de futebol.
Isso acabou na gestão de Koff, iniciada em 1994. A partir daí, a associação assumiu o controle político do regulamento do Brasileiro e da negociação com as TVs, após uma negociação com Teixeira.
Mas o próprio dirigente reconhece que sua posição não é forte. Ele admite até que o fato de ter uma posição pública contra qualquer mudança das regras esteja eventualmente levando dirigentes dos clubes filiados a defenderem perante ele uma posição que não tomarão de fato.
Enquanto seus eleitores se posicionam cautelosamente, Teixeira permanece em casa recuperando-se de fraturas sofridas após cair de um cavalo.
É quase certo que não volte à CBF nos próximos 40 dias ou mesmo que continue em casa até o final do ano. Fora da cena pública, Teixeira poderá avaliar o seu eleitorado antes de anunciar sua posição.



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