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São Paulo, sábado, 26 de julho de 2003

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MOTOR

Aleluia!

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Neil Horan é uma figuraça. Irlandês, 56 anos, padre excomungado pelo Vaticano por sua interpretação pouco convencional da Bíblia, crê que o fim do mundo está próximo. "As Torres Gêmeas caíram em 20 minutos. O planeta não vai levar muito mais do que isso para sucumbir", costuma dizer em suas pregações.
Habitué de clubes e festinhas alternativas de Londres, atua em oficinas multiculturais e tem dois livros publicados, "Glorioso Mundo Novo" e "Cristo Logo Vai Sufocar Todos os Governos", que podem ser comprados pela internet.
Father Horan acha que a dança e a música terão papéis fundamentais na elevação dos espíritos no Juízo Final. Por isso, dança e canta o tempo todo. No começo do ano, contrário à intervenção militar no Iraque, tentou se apresentar para Saddam Hussein. Não conseguiu autorização do governo para viajar a Bagdá.
Mas em Silverstone não havia ninguém no alambrado para desautorizá-lo. Então, dançando e cantando, Horan invadiu a pista e entrou para a história da F-1.
A intenção, conta, era alertar o mundo para o valor dos livros sagrados. "Leia a Bíblia, ela está sempre certa", dizia seu cartaz.
O ex-padre foi derrubado por um comissário, detido em Northampton e, depois, liberado. Mas o estrago já estava feito. Estrago?
Não. Não mesmo. Horan, sem querer, transformou o GP inglês na corrida mais vibrante do ano.
Fez o papel do imponderável, aquilo que Max Mosley tanto persegue, que tentou impor por decreto no regulamento da F-1.
A colorida invasão de pista forçou a entrada do safety car justamente num estágio da corrida em que as equipes começavam a pensar na primeira rodada de pits.
Resultado: todo mundo para os boxes e uma corrida ainda mais embaralhada do que o grid, com belas disputas, ultrapassagens no limite, carros emparelhados dividindo a pista curva após curva.
A cena do congestionamento nos boxes lembrou a Indy, a IRL e a Nascar, campeonatos que abusam das bandeiras amarelas e que, propositalmente ou não, vivem embaralhando os pelotões.
E se o padre dançarino tivesse ficado quietinho no seu canto?
Barrichello ultrapassaria Trulli, dispararia, e a corrida ficaria monótona. Foi o que aconteceu quando o ferrarista, enfim, assumiu a ponta para as últimas 19 voltas. Tanto que a TV se esqueceu de Barrichello lá na frente.
O campeonato está ótimo. Faltando cinco etapas para o fim, sete pilotos (até o Coulthard!) têm chances de levantar o título. Mas a invasão da pista jogou uma pulga atrás da orelha da F-1: mostrou que daria para ser melhor.
Coincidentemente, Silverstone deveria ter marcado o fim da eletrônica. Ferrari, Wiliams e McLaren vetaram. Caso tivessem topado, o mundo não precisaria ter visto a dança de Horan. O imponderável já estaria em cada carro.
É fácil entender as razões das grandes. Afinal, nem sempre terão um piloto inspirado, disposto a arriscar tudo, como nem sempre haverá um doido na pista. Sem sobressaltos, o lucro é certo.


Excepcionalmente hoje José Henrique Mariante não escreve neste espaço

Pecado
A imprensa inglesa especula que a intenção de Horan foi bem menos nobre do que ele afirma. A tese é maluca, mas só a coincidência já vale o registro: sua editora, a Deunantbooks, acaba de lançar um romance com a história de um garoto que pula muros de autódromos para assistir a corridas. Segundo os tablóides, a invasão em Silverstone não passou de uma estratégia da empresa para divulgar o livro.

Redenção
Barrichello está em alta com os tifosi. O site do "La Gazzetta dello Sport" fez uma pesquisa com 5.000 internautas e, desses, 51,4% defenderam a renovação do contrato do brasileiro até 2006. Outros 25,8% disseram que Barrichello deve ser primeiro piloto de outra equipe grande. Só 22,8% pediram um novo colega para Schumacher.

E-mail fseixas@folhasp.com.br


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