São Paulo, quinta-feira, 26 de agosto de 2004

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FUTEBOL

Onde mora o perigo

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

Aos que temem que as imagens comoventes do jogo no Haiti (ainda ele!) se transformem em um trunfo para a CBF conseguir o que quiser do governo, garanto: não é aí que mora o perigo. A partida poderia não ter acontecido, e a promiscuidade no relacionamento de Ricardo Teixeira com governantes e políticos em geral continuar existindo. Ou seja, o perigo existe, com ou sem gols brasileiros em Porto Príncipe.
Nunca me conformei com o fato de deputados serem convidados para o posto de ""chefe de delegação" da seleção brasileira, ganhando alguns dias de licença da Câmara por estarem em ""missão oficial". Sem falar nos presentinhos e agrados que não chegamos a ver. E quem não quer um jogo da seleção na sua cidade ou Estado? Os interessados precisam negociar com a confederação... Mas o governo e a Justiça simplesmente não podem permitir que o futebol seja administrado com irresponsabilidade ou desonestidade, e têm instrumentos para isso. Se amolecerem em função de interesses espúrios, merecem críticas tão contundentes quanto costumamos fazer ao artilheiro que perde uma chance na cara do gol.
E eu insisto: os governos bem que tentam capitalizar em cima do futebol, mas não dá certo. Você já ouviu alguém dizer ""que saudade da ditadura, porque naquele tempo se jogava o futebol-arte"? Se o Brasil tivesse perdido em 70, o regime militar teria caído antes? Os argentinos dão um desconto para as atrocidades do Vidella por tudo que ele fez pela seleção em 78? É claro que não!
O eleitorado pode se deixar seduzir, momentaneamente, por benesses pessoais se ganhar ingressos para o jogo, camisas autografadas ou título de campeão. Pode retribuir, equivocadamente, com um voto. Mas até parece que é só o esporte que se presta a isso...
O torcedor também pode se distrair, por alguns instantes, com as alegrias do futebol. Mas no dia seguinte, no ônibus lotado ou na fila do hospital, sua opinião sobre os políticos, certa ou errada, continuará a mesma de antes.
O Brasil perdeu a final em 1998, houve teorias conspiratórias de todos os tipos, e a cúpula da CBF seguiu lá. O Brasil venceu a Copa em 2002, e nem por isso a situação venceu as eleições! É preciso haver cuidado na análise e inferência de causas e conseqüências. A simpatia pelo esporte não migra para a política com a mesma facilidade com que a antipatia política migra para o esporte. Muitos torcem contra atletas estadunidenses por ódio a George Bush.
O perigo não mora na emoção do esporte; mora na desonestidade, falta de educação, carência de informações, cultura do toma lá-dá-cá, busca por benefício pessoal em detrimento do coletivo. Esses são os adversários que precisam ser marcados de perto.

Veto
Ainda sobre esse assunto - foi ridículo o veto da CBF aos cinco jogadores que não participaram do jogo festivo. Jogando em casa contra a Bolívia, fica fácil bancar o machão e botá-los de castigo... Quero ver se o Brasil perder.

Cara-de-pau
George Bush se gabar dos feitos de atletas americanos ainda vai. Mas capitalizar em cima do sucesso do futebol iraquiano é demais. Tudo bem que os atletas não estão mais sujeitos aos castigos corporais infligidos pelo filho do Saddam, mas o presidente dos EUA podia se conter.

Valem a mensalidade
A vitória do marroquino nos 1.500 m e o recorde no salto com vara feminino foram momentos especiais na Olimpíada. A história do corredor, frustrado em duas outras finais olímpicas, vale um daqueles longas-metragens romanceados que mal são capazes de reproduzir as nuances e emoções da história real. A saltadora russa comemorando em queda livre de mais de 4 m foi um espetáculo.

E-mail soninha.folha@uol.com.br


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