São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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TOSTÃO

Diferentes olhares


A maioria dos torcedores que freqüentam os estádios não está preocupada com o bom futebol e só gosta de vitórias


O FUTEBOL pode ser visto de várias maneiras. Todas as visões são importantes e nenhuma exclui a outra. Como comentarista, eu faço um esforço, mas é muito difícil ter o mesmo olhar para todas as possibilidades. Em qualquer atividade, é quase impossível ser um observador totalmente neutro. A consciência e o raciocínio lógico não possuem também a autonomia que pensamos ter.
Somos influenciados em nossas opiniões pelos nossos conceitos, preconceitos, medos, fraquezas e convenções sociais.
"A consciência nos faz todos covardes." (Shakespeare) Muitos enxergam o futebol como um entretenimento prazeroso, um balé, uma metáfora da vida.
As pessoas que não entendem nem querem entender os detalhes técnicos e táticos e que não têm o olhar crítico e viciado de um comentarista costumam se deliciar mais com o espetáculo proporcionado pelo futebol.
Mas como o futebol no Brasil e em muitos países se tornou um palco de violência dentro e fora de campo, um show de exibicionismo de alguns treinadores, que mesmo sem querer às vezes incitam a violência e uma disputa física e agressiva entre os atletas, uma partida é hoje mais uma batalha de hostilidades e de desrespeito do que um evento lúdico e prazeroso.
Muitos torcedores só gostam de torcer e de vitórias, e não do bom futebol. É hoje a maioria entre os que vão aos estádios.
Há ainda os apaixonados pelo futebol científico e que quase só apreciam a técnica, as estatísticas e as estratégias para vencer. Quase todos os treinadores são assim. Compreendo, por causa da tensão que vivem e da necessidade de vitórias dos técnicos, mas a imprensa não pode ser cúmplice dessa visão tecnicista. Temos de cobrar bons espetáculos.
A técnica, a tática e a estatística são fundamentais, mas não são tudo. Não gosto de números, mas reconheço a sua importância para a análise correta dos fatos, desde que sejam utilizados e valorizados no momento certo.
Em mais uma ótima reportagem, Paulo Cobos mostrou durante a semana na Folha, com números e conclusões, que o São Paulo é um bom representante do futebol de poucos gols do Campeonato Brasileiro, fato que acontece em todo o mundo.
Esse foi também um campeonato sem brilho técnico. O São Paulo mereceu o título, tem um bom time, porém não é uma grande equipe, comparando com os principais times da história do futebol brasileiro.
O São Paulo foi o time que fez mais gols (64), com a média de 1,7 por jogo, bastante inferior (20% a menos) às do Cruzeiro em 2003 e do Santos em 2004, que fizeram mais de cem gols.
Dos gols do São Paulo, 31% saíram de bolas paradas. Por isso, mais de um terço foi marcado por defensores. O grande número de gols de bolas paradas no futebol foi um avanço em relação ao passado.
Porém os técnicos precisam também treinar outras jogadas. As trocas de passes, tabelas e dribles continuam eficientes, e o jogo fica muito mais bonito.
Além do pouco talento individual, da insegurança e desconforto dos estádios e, principalmente, da violência, que é um problema de todo o país, a queda de público nos últimos anos é decorrente do estilo pesado, feio, de poucos gols e de muitas faltas.
Dirigentes, treinadores, atletas e a imprensa precisam ter consciência disso.

tostao.folha@uol.com.br


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