São Paulo, sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

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XICO SÁ

Que tal seu time de rosa?


A pergunta mexe no formol da tradição, como se a cor do manto do time ditasse a preferência sexual do torcedor


AMIGO TORCEDOR , amigo secador, você acataria o uso da cor rosa, quase choque, na terceira camisa do seu time do peito? Em um rápido data-botequim com os meus cavalheiros de távola redonda, vi que a chance beira o zero. Com exceção de Lirioboy, rapaz evoluído, que se orgulharia sim, como exaltava no balcão do Francis Drinks, no Recife, em ver o destemido Leão da Ilha do Retiro, melhor, da Ilha de Lost, com tal uniforme. O debate surgiu por causa do Old- ham Atletic, o azulão da Terceirona inglesa, que vai a campo todo pink na próxima semana. O ato é nobre: além de descolar um bom troco, a agremiação da várzea da rainha ajudará a Unidade de Mama do Victoria Hospital Real, bela causa. Careta e um tanto quanto homofóbico, o ludopédio nacional, tacanho e conservador até no uso das suas terceiras camisas, jamais teria a coragem de se trajar com semelhante arrojo. Ou este cronista de costumes estaria equivocado? Ora, por muito menos os mosqueteiros de Parque São Jorge, que se autoproclamam fãs de um time espada por excelência, rebelaram-se: não engoliam o espalhafato da simples e belíssima indumentária roxa. No Santos, o fardamento azul, que lembrava a origem do clube marinho, foi banido no segundo jogo, sob o tacão de regulamentos e estatutos. O verde new wave, fosforecente, capaz de acender o Parque Antarctica a 220 volts, também enfrentou os seus queixumes no Palmeiras. O coro dos ranzinzas também chiou com a roupa dourada que o Sport elegeu para conquistar a América. E repare que a cor, em outra tonalidade, já estava de alguma forma incorporada ao padrão rubro-negro na figura do rei da selva, de rabo sempre altaneiro. Tudo bem, eu preferia que jogasse a Libertadores com a camisa que o Aprígio, grande artista do Recife-mundo, fez em homenagem ao centenário do clube, com listras diagonais e o leão em um riscado para além do apenas moderno. Mas não tem jeito, amigo, somos conservados no formol da tradição e da caretice. Como se as cores dos mantos das equipes definissem as preferências sexuais dos torcedores. O rosa, na nossa taba abençoada, limita-se a dividir com o verde só a fantasia da Mangueira e os adornos das Virgens de Olinda, o maior bloco de homens vestidos de mulheres do mundo, segundo a tradição de PE. Noves fora os espíritos livres, somos intolerantes até com as alusões que fazem à glória dos nossos times, como as brincadeiras que rolam com o Náutico, chamado de "barbie", e com o tricolor paulista, cujo folclore ludopédico, sem nenhum sentido prático, trata como "bambi". Felizes de nós, cuja missão na terra é tirar uma onda. Por estes e outros mal-entendidos é que o pessoal do Potiguar apelidou, há décadas, seu escrete de "Time Macho". Pronto, "Time Macho" e não venha com "baitolagens" politicamente corretas, decretam os meninos da área. Não é à toa que Mossoró, a capital cultural do RN, foi a única cidade do país que resistiu bravamente às invasões de Lampião e o seu bando. Mas você não acha, amigo, que por trás de tudo isso, do rosa inglês à nossa macheza, tem muita frescura e veadagem? Epa, é só uma pergunta para a gente tirar mais onda ainda no próximo colóquio de boteco.

xico.folha@uol.com.br


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