São Paulo, sexta-feira, 27 de outubro de 2000

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BOXE
Depoimento de um ex-toxicômano

EDUARDO OHATA
DA REPORTAGEM LOCAL

""Por que fiz isso? Porque sou humano, tenho sentimentos como todo mundo", respondeu o tricampeão mundial de boxe Alexis Arguello, quando o questionei sobre o fato de ele recentemente ter se envolvido com as drogas.
Diversos pugilistas que usam drogas costumam aparecer em manchetes policiais. Mas em entrevista à revista ""The Ring" (a mais tradicional do gênero), há alguns anos, o promotor de lutas Bob Arum afirmou que metade dos nomes da elite do pugilismo seria usuária de drogas.
Os casos são inúmeros, e todos os promotores já perderam boxeadores por causa disso.
Os norte-americanos ex-campeões mundiais e medalhistas olímpicos Pernell Whitaker (Main Events, do treinador Lou Duva) e Kennedy McKinney (Top Rank, de Arum), por exemplo, chegaram a ser internados por causa de cocaína. O problema encurtou também a carreira de alguns pesos-pesados de Don King, como Mitch "Blood" Green (que aguentou dez assaltos com Mike Tyson) e os ex-campeões Tony Tucker, Greg Page e Oliver McCall, entre outros.
Mesmo com tantos exemplos, alguns casos ainda são capazes de nos pegar desprevenidos e chocar, como certamente é o do nicaraguense Arguello, um membro do Hall da Fama do boxe e um símbolo de classe dentro e fora dos ringues, que foi adotado como um dos embaixadores do boxe após a sua aposentadoria.
Que tipo de frustração faria alguém que, ao menos aparentemente, tem tudo ser seduzido pelas drogas? Principalmente quando se trata de Arguello, que conquistou tanto (títulos entre os penas, superpenas e leves, além de um currículo de 19 vitórias e 3 derrotas em lutas válidas por título), um ídolo nacional, um empresário cuja situação financeira é bastante estável.
"Como atleta, segui uma vida de honestidade, sempre procurei fazer as coisas da maneira correta. E nunca havia percebido como a sociedade é injusta", disse Arguello, nesta semana, durante a convenção do Conselho Mundial de Boxe, no México.
Ele citou seu inconformismo com o fato de os políticos terem desviado milhões doados pelos EUA para ajudar a população da Nicarágua. ""Me perguntava como puderam fazer algo desse tipo, aquilo me perturbava."
Arguello passou a beber, um hábito logo substituído pela cocaína e pelo crack. Pensou em suicídio e começou a vender os bens para manter seus vícios.
Até que duas conversas mudaram sua vida. A primeira foi quando um amigo lembrou-o de que ""não se pode mudar o mundo sem antes mudar a si mesmo".
A segunda conversa ocorreu em seu íntimo. ""Aos 15 anos, pedi a Deus para ser o primeiro campeão mundial da Nicarágua. Fui tão abençoado que ele permitiu que atingisse essa honra três vezes. Depois, Deus me perguntava: "E você, Alexis, o que tem feito por mim?" Percebi que não fazia nada. Antes teria sucumbido, mas Deus permitiu que meu pior inimigo me atingisse agora porque, recuperado, posso aconselhar os jovens. E mostrar que, a exemplo de quando era campeão, ainda tenho poder de reação."

Nos ringues
Acelino Freitas, o Popó, ganhou um motivo para estar confiante caso consiga garantir uma unificação com o campeão dos superpenas pelo CMB, Floyd Mayweather. É que o norte-americano sofreu para derrotar o ordinário Emanuel Burton, em nove assaltos, no sábado. A luta foi disputada entre os leves, o que pode significar que Mayweather subirá de categoria.

Fora dos ringues
A convenção do CMB registrou duas gafes antipedagógicas. Primeiro, uma dramatização em vídeo mostrou um garoto, sem protetor de cabeça, treinando com sparring em seu primeiro dia na academia (algo condenado por qualquer treinador sério). Em seguida, foi distribuído um brinquedo em que dois boxeadores trocavam cabeçadas quando se acionava um botão.

E-mail eohata@folhasp.com.br
www.uol.com.br/folha/pensata


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