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BASQUETE
Apito amigo
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
O trio devora o café-da-manhã no quarto do hotel cinco
estrelas, tudo pago, enquanto discute como não virar o prato principal, e indigesto, da noite.
Em primeiro lugar, esquadrinha, na tela do computador portátil de última geração, todas as
suas intervenções na rodada anterior. Os lances são gravados,
editados e entregues em videodisco poucas horas depois do jogo.
A auto-análise contribui para
demolir os egos e aperfeiçoar o
entrosamento. E serve de munição para a próxima exibição.
Na sequência, o grupo consulta
o relatório sobre os oponentes da
vez. Montado a partir de informações coletadas pelos colegas e
atualizado diariamente por uma
equipe de supervisores, o documento está em uma página na internet, só acessada com uma senha, e funciona como um guia.
Descreve o estilo de jogo dos times -se abusam ou não de contra-ataques, se marcam por zona
ou individualmente, se têm jogadas preferidas-, o que permite
combinar eventuais ajustes de posicionamento e movimentação.
Expõe as características do ginásio, da quadra, até do público.
E compila os mais recentes registros de indisciplina, um alerta
para prováveis focos de problema
daquela noite. (A chefia, aliás,
mantém vigilância. Multa aquele
que não acessar o site.)
Finalizada a conferência, é hora de vestir o terno e a gravata e
rumar para o ginásio -de carro,
sempre com motorista.
À disposição, no vestiário refrigerado e protegido por seguranças, geladeira com bebidas e petiscos, sofás, telefones, TVs e a videodiscoteca completa do torneio.
Há, também, aparelhos de musculação, bicicletas ergométricas e
esteiras para as sessões de exercício, obrigatórias depois do almoço -e de um terreno cochilo.
Funcionários do clube anfitrião
ajudam com os uniformes e com
as botas de esparadrapo, proteção
de rotina para os tornozelos.
A uma hora da partida, sai a escalação oficial das equipes, estopim de uma nova palestra.
Minutos depois, o trio é escoltado ao centro da quadra. Será observado por um colega, cuja única
missão é reportar seus deslizes.
Encerrado o jogo, e enviados
por e-mail a súmula e o relato do
"espião", os árbitros seguem para
o aeroporto. O vôo de classe executiva, para a cidade do confronto seguinte, fecha o dia na NBA.
No Brasil, os dois, e não três, juízes se reúnem geralmente horas
antes da partida. As parcerias
mudam o tempo todo -por razões logísticas, técnicas ou subterrâneas. A escala muitas vezes é
divulgada só na antevéspera.
Não há um método de avaliação pessoal. A recém-criada -e
tão reivindicada- supervisão de
arbitragem da CBB ainda dá os
primeiros passos (um deles, a sensata decisão de filmar todos os jogos para analisar polêmicas).
Os árbitros ficam em hotéis decentes. Mas viajar de avião? Só
para outros Estados. Do contrário, espremem-se com os mesários
em uma carona rodoviária.
No vestiário, cadeiras e, às vezes, água são o único conforto.
Cada um cuida de sua comida,
do preparo físico, de estudar o esporte. E da sua consciência.
Sopro 1
Embora protegidos por uma "lei da mordaça" (como na NBA), os árbitros do Nacional têm sido muito criticados, tachados de arrogantes
e malcriados. Mas e o técnico que esbraveja, o dirigente que invade a
quadra, o torcedor que agride o atleta, a superestrela que xinga o
mundo, a imprensa que desconhece o jogo? A caça às bruxas ao apito
não se justifica. Todo o basquete do país precisa ser reeducado.
Sopro 2
Os 60 juízes da NBA vivem do basquete. Entre eles, um ex-policial
que atuou infiltrado na máfia de Nova Jersey (Bob "Soprano" Delaney). Alguns dos 35 juízes do Nacional masculino dependem de outra fonte de renda. Entre eles, um professor da rede escolar que banca
o segundo colocado na competição (Carlos Renato dos Santos).
E-mail melk@uol.com.br
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