São Paulo, quarta-feira, 29 de maio de 2002

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GEOPOLÍTICA

Sul-coreanos convidam vizinho para abertura da Copa, mas não obtêm resposta

Nem futebol serve de apelo para reunificação das Coréias

ROBERTO DIAS
ENVIADO ESPECIAL A SEUL

A dois dias da abertura da Copa, a realidade sobre a reunificação coreana -e o quanto o futebol poderia ajudar- é bem diferente da imaginada a princípio.
Após marcar a abertura da última Olimpíada com um desfile conjunto com o vizinho, os sul-coreanos não conseguem nem mesmo uma resposta ao convite formal que fizeram a dirigentes esportivos, técnicos e atletas da metade norte para que comparecessem à cerimônia de abertura do Mundial em seu país, na sexta.
À Folha, o governo da Coréia do Sul deixa clara a sua decepção. "Infelizmente, não tivemos nenhuma resposta. Ainda esperamos uma resposta positiva. Acreditamos que a participação deles vai promover a reconciliação", afirma Kim Hong-jae, porta-voz do Ministério da Unificação.
Ao chegar à capital, Seul, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, fez questão de afirmar que também tentou ajudar em sua visita à parte norte, no início do mês.
O mesmo mal-estar tem acontecido com a festa que reunirá os principais jogadores de todos os tempos amanhã, em um parque próximo ao estádio de Seul.
Há cerca de 20 dias, o Comitê Organizador do Mundial no país anunciou que convidaria para o evento Park Doo-ik, o "Pelé do Oriente", maior nome da história do futebol na península. Ele liderou a Coréia do Norte que, em 1966, bateu a Itália e chegou às quartas-de-final daquela Copa.
Até agora, porém, os sul-coreanos não conseguiram confirmar sua presença na festa, gerando uma decepção enorme para quem queria aproveitar a Copa para catalisar sua reunificação.
"Desde que se candidatou para organizar o Mundial, a Coréia do Sul propôs várias vezes à Coréia do Norte que recebesse alguns jogos", diz o porta-voz ministerial.
"A idéia era melhorar as relações entre os países, mas infelizmente a Coréia do Norte não está preparada para um evento desta magnitude", diz Cho Keum-saegn, chefe do Departamento de Relações Internacionais da Universidade da Coréia, em Seul.
Outra idéia fracassada foi a de formar uma seleção conjunta com a Coréia do Norte, que não disputou as eliminatórias.
O distanciamento às vésperas da Copa dá bem a idéia de quanto mudaram as relações intercoreanas desde o desfile histórico em Sydney, há menos de dois anos.
Nesse intervalo, um fato importante foi decisivo para esfriar a aproximação: a substituição na presidência dos EUA de Bill Clinton, que fomentara conversas diplomáticas pela reunificação da província, por George W. Bush.
Uma declaração do líder americano no início deste ano, incluindo a Coréia do Norte numa lista de Estados que fomentavam atos terroristas (o "Eixo do Mal", como definiu Bush), afastou o país da mesa de negociações.
Para isso, fora as razões políticas, há também pressões sentimentais da população, bem ilustradas por um episódio que aconteceu no final do mês passado.
Uma mulher de 94 anos morreu dois dias antes de partir para encontrar seu neto na montanha Geumgang, local na Coréia do Norte que tem servido de base para aproximação de famílias separadas pela guerra que dividiu a península de 1950 a 1953.
Os sul-coreanos dizem que a geração separada está morrendo, e, se não houver uma atitude rápida, os laços familiares se perderão.
Porém não será o esporte, desta vez, que vai ajudar a quebrar essas barreiras. A Coréia do Norte se volta agora para seu grande festival de ginástica, chamado Arirang, promovido pelo governo.
Já a parte sul gruda os olhos na Copa, para a qual, conforme sintetizou o porta-voz, "infelizmente, não falta muito tempo".



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