São Paulo, domingo, 29 de outubro de 2000

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Novo técnico nega fama de linha-dura, mas exige respeito à hierarquia

Leão promete implantar "ditadurazinha" na seleção


Em entrevista, treinador diz que será um comandante forte e que jogador tem de se limitar a jogar

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
ENVIADO ESPECIAL A RECIFE

No livro "A Revolução dos Bichos", cuja primeira edição foi publicada em 1945, o escritor George Orwell (1903-1950) faz uma sátira política sobre os regimes totalitários.
Um grupo de animais, insatisfeito com a dominação dos homens, toma o poder na fazenda e passa a geri-la "coletivamente", adotando um sistema onde todos deveriam ser iguais.
Não dá certo. Pouco a pouco, os porcos, mais espertos, começam a dominar as ações, e a lei, a sofrer adaptações, com alguns animais passando a ser "mais iguais do que os outros".
No final, donos do pedaço e da revolução, os porcos acabam sendo confundidos com os humanos, que haviam sido derrubados no início da história. Os outros animais, por sua vez, voltam a viver -mal- como nos velhos tempos da dominação humana.
Mas o que a obra de Orwell tem a ver com a seleção?
Para Emerson Leão, 51, novo técnico da equipe, aparentemente a relação é grande.
Pelo menos quando se discute o conceito de democracia no futebol, assunto que voltou a ser abordado assim que a escolha de seu nome para o cargo foi anunciada pela Confederação Brasileira de Futebol, há dez dias.
Um dos maiores opositores da "democracia corintiana", sistema de trabalho implantado no Parque São Jorge no início dos anos 80 -os jogadores tinham voz ativa para discutir inclusive a necessidade ou não da concentração-, Leão continua a favor de uma "ditadurazinha".
Mas "só no futebol".
Em entrevista à Folha, o técnico, que continuará dirigindo o Sport até o final deste semestre, defendeu a importância de um comando forte, seja no clube, seja na seleção brasileira.
"Cada macaco no seu galho. Cada um tem que ficar no seu lugar e saber qual é seu papel. Num time de futebol, não dá para todo mundo mandar. Vira baderna."
Em seguida, lançou o desafio: "Estou no futebol há 37 anos. Aponte um time em que a democracia funcionou. Unzinho que eu paro para pensar".
A "democracia corintiana", movimento que ele pôde vivenciar quando defendeu o Corinthians, de Sócrates e Casagrande, conquistando o Paulista-83, não é um bom exemplo?
"Claro que não. Aquilo não era uma democracia. Era um sistema comandado por três ou quatro jogadores", afirmou o técnico, sem citar nomes.
"Quem não se enquadrasse e não aceitasse as ordens dos donos do time ficava fora", contou.
Isso não quer dizer, no entanto, que Leão não aceite dividir poder.
"O que defendo é a hierarquia. Na seleção, não vou mandar sozinho. O Antônio Lopes (coordenador técnico) irá tomar uma série de decisões, assim como cada membro da comissão técnica terá voz ativa na área que lhe couber."
"Mas o time convoco eu", deixou claro o treinador.
Em seguida, mandou um recado aos jogadores: "O Brasil vai ter um comandante forte. Não me considero linha-dura, mas se alguém estiver passando dos limites, vou lá e falo. Exigente eu sou desde os tempos de criança. Não vai ser agora, que eu passei dos 50, que iria mudar".


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