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Intruso burla megaesquema e arruína maratona de brasileiro
Irlandês invade percurso, ataca líder e muda
história da prova mais tradicion al dos Jogos
ADALBERTO LEISTER FILHO
FÁBIO SEIXAS
ENVIADOS ESPECIAIS A ATENAS
Os organizadores dos Jogos de
Atenas-2004 gastaram US$ 1,5 bilhão com segurança, instalaram
1.600 câmeras pela cidade, quebraram o sigilo telefônico da população. Tudo corria bem até ontem. Mas ainda havia a maratona.
E, num lapso da força policial
que fazia a proteção do 36º dos
42,195 km da prova mais charmosa do atletismo, um manifestante
invadiu o percurso. Agarrou o líder da maratona, jogou-o no
chão. Mudou a história da 28ª
Olimpíada da Era Moderna.
A maior vítima dos Jogos que
mais se preocuparam com a
ameaça de ataques terroristas foi
um brasileiro. Paranaense de
Cruzeiro d'Oeste, ex-bóia-fria,
Vanderlei Cordeiro de Lima, 35,
liderava a maratona em Atenas,
última prova da Olimpíada,
quando foi atacado por Cornelius
Horan, 57, um ex-padre irlandês
que já ganhou notoriedade por
invadir eventos esportivos.
Foi Horan que, no ano passado,
entrou na pista de Silverstone durante o GP da Inglaterra de F-1
usando kilt, o tradicional saiote
escocês, e carregando uma cartolina com os dizeres: "Leia a Bíblia.
A Bíblia está sempre certa".
Ontem, também de kilt, ele usava uma camiseta com a mensagem "O padre do GP. A Bíblia diz
que Israel cumprirá a profecia. A
segunda vinda está próxima".
"Foi uma surpresa. Ninguém
esperava. Se ele tivesse uma faca
ou uma arma qualquer... Se ele
quisesse fazer alguma coisa contra mim, teria feito", afirmou Lima. "Não tive como me defender.
Estava muito concentrado na disputa da maratona."
Horan segurou o brasileiro e
empurrou-o contra o público.
Desequilibrado, Lima caiu.
Logo depois, policiais detiveram o manifestante, e o atleta pôde seguir na prova, após oito segundos parado. Segundo informou a polícia, Horan sofreria de
problemas psicológicos.
Àquela altura da corrida, Lima
já vinha enfrentando dificuldades
para manter o ritmo e via a sua
vantagem despencar.
No quilômetro 30, sua folga para o italiano Stefano Baldini, vice-líder, era de 47 segundos. No 35,
um antes do incidente, era de só
28 segundos.
Baldini ultrapassou o brasileiro
no 39º quilômetro. Logo depois,
Lima foi vencido pelo maratonista de Eritréia naturalizado americano Mebrahtom Keflezighi.
Às 20h10 locais, 14h10 no Brasil,
o fundista entrou na pista do Panathinaiko, o legendário estádio
da primeira Olimpíada moderna,
em 1896.
Era o terceiro colocado.
E foi o mais aplaudido entre os
81 homens que largaram da cidade de Maratona, refizeram a façanha atribuída ao soldado Pheidipedes em 490 a.C. e alcançaram a
linha de chegada.
Seu bronze foi a única medalha
do atletismo brasileiro em Atenas
e a primeira do país em provas de
fundo em Olimpíadas.
Pouco mais de uma hora e meia
mais tarde, o cenário era outro estádio olímpico. O de 2004.
Seguindo a tradição, a entrega
de medalhas aconteceu no meio
da cerimônia de encerramento.
O brasileiro recebeu seu bronze
das mãos do belga Jacques Rogge,
presidente do COI (Comitê Olímpico Internacional), que lhe dirigiu algumas palavras antes da
premiação.
"Ele pediu desculpas. Eu aceitei,
fazer o quê?", respondeu o maratonista paranaense. Questionado
sobre o prejuízo que teve na invasão, não falou em vitória. "Não sei
se venceria, mas aquilo me atrapalhou. Eu chegaria melhor. Melhor fisicamente."
Entre o fim da prova e a cerimônia, o COB apresentou um primeiro recurso, que foi negado.
Em nova instância esportiva, o
caso segue sem solução.
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