São Paulo, domingo, 31 de janeiro de 1999

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JUCA KFOURI
Como eles roubaram

Pode um livro ser fraudulento, preconceituoso, impreciso, mal traduzido e obrigatório ao mesmo tempo?
Pois pode -e é o caso de "Como eles Roubaram o Jogo", sobre os subterrâneos da Fifa, do inglês David A. Yallop, lançado no Brasil pela Record, 365 páginas.
O autor é o mesmo de "Em nome de Deus", de 1984, com mais de seis milhões de cópias vendidas pelo mundo afora, no qual ele tenta provar que o papa João Paulo 1º foi assassinado, e de "Até o fim do mundo", em 1993, fruto de uma entrevista feita com Carlos Chacal, então o terrorista mais procurado do mundo.
O livro é fraudulento porque se apropria, sem citar nomes e veículos, de reportagens e de depoimentos de outros jornalistas.
O caso mais berrante é o do perfil de João Havelange publicado pelo jornalista brasileiro Roberto Pereira de Souza, em 1994, na "Playboy", com quem Yallop esteve longamente, prometeu até a co-autoria do livro e simplesmente deixou de mencionar -apesar de transcrever a reportagem.
O livro é preconceituoso porque elege a América do Sul, a África e a Ásia os continentes quase exclusivos da corrupção, reservando a sua Inglaterra um papel sempre impoluto, a ponto de negar qualquer irregularidade na Copa do Mundo de 1966.
É inegável que os cartolas dos três continentes são o que há de pior, mas o mundo do futebol sabe que duas Copas foram feitas para seus anfitriões ganharem: a da Inglaterra, em 1966, e a da Argentina, em 1978.
O livro é impreciso ao inventar um gol de falta de Garrincha contra a Inglaterra, em 1962, uma "folha seca", além de errar datas, como por exemplo a da gestão de Giullite Coutinho na CBF.
Mas, apesar do plágio, o livro é mesmo obrigatório -a má tradução nem é novidade.
Porque a fraude é bem feita, isto é, o que Yallop copia sem citar é de muito boa qualidade, fruto de um trabalho sério e demorado de Roberto Pereira de Souza.
David A. Yallop, numa palavra, é um bom plagiador.
E reúne num só livro as mazelas de Havelange a Joseph Blatter, passando por cartolas menos votados internacionalmente, como Ricardo Teixeira.
Yallop, digamos assim, é uma espécie de Robin Hood, apesar de nem sempre roubar dos ricos (como no caso da apropriação indébita da matéria de "Playboy"), mas está do lado certo ao revelar com detalhes a corrupção no futebol mundial.
Ele mostra como Havelange se elegeu pela primeira vez à custa de Pelé e de um rombo nas contas da antiga CBD em 1974 e, 24 anos depois, agora na França, revela o tráfico de dinheiro para que Joseph Blatter derrotasse o sueco Lennart Johansson, um homem mesmo de bem até segundo seus opositores.
Imperdível também, e só no bom sentido, é "Futebol-Arte", da editora Senac, de São Paulo, dos jornalistas Lucia Rito e Sérgio Sá Leitão e brilhantemente editado pelo diretor de arte Jair de Souza.
O livro, que só estará nas livrarias em março, reúne imagens maravilhosas do futebol brasileiro e alguns dos melhores textos sobre a maior paixão do brasileiro.
Cada página é uma surpresa.



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