São Paulo, domingo, 31 de dezembro de 2000

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Brasileiro mais confuso da história termina em tragédia e sem campeão

O final da copa JH


Avalanche humana derruba alambrado, deixa pelo menos 117 feridos e cancela o segundo e decisivo jogo entre São Caetano e Vasco


Ormuzd Alves/Folha Imagem
Torcedor recebe atendimento de integrantes da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros no gramado do estádio São Januário, após a confusão na arquibancada


FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

RAPHAEL GOMIDE
SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO

Não poderia ter sido pior.
A Copa João Havelange, do inchaço, da virada de mesa, do regulamento esdrúxulo e da falta de comando, conseguiu ontem superar sua própria natureza.
No segundo jogo da decisão do torneio criado pelo Clube dos 13, entre Vasco e São Caetano, no estádio de São Januário, no Rio, um alambrado desabou na metade do primeiro tempo, dando início a um festival de desorganização, violência e trapalhadas e deixando temporariamente vago o posto de campeão brasileiro de 2000.
A partida estava empatada em 0 a 0 quando aconteceu o acidente, causado por uma briga entre torcedores do Vasco, que dominavam as arquibancadas -o São Caetano não recebeu ingressos.
Pelo menos 117 pessoas ficaram feridas. O jogo foi paralisado pelo árbitro Oscar Roberto Godoi, e o campo foi invadido pela torcida. Por pouco mais de uma hora reinou o caos, até que Godoi, após uma ordem do governador do Rio, Anthony Garotinho, decidiu não dar continuidade à partida.
Instantes antes do anúncio do juiz, o secretário da Defesa Civil do Estado, Paulo Gomes Filho, informara que havia condições para que o jogo fosse reiniciado -os dois times já estavam preparados.
O que transcorreu durante os 70 minutos em que a partida esteve paralisada (das 16h35 às 17h45) vai entrar para o anais do futebol.
Em meio ao socorro dos acidentados, enquanto os representantes do Clube dos 13 assistiam a tudo impassíveis, o presidente da Federação de Futebol do Estado do Rio, Eduardo Viana, e o presidente eleito do Vasco, Eurico Miranda, mandaram no gramado, liderando operação para que a final fosse retomada.
Helicópteros pousavam no gramado para atender e resgatar feridos, ao mesmo tempo em que Eurico e Viana diziam que tudo estava tranquilo e que o jogo poderia ser retomado -tudo pontuado por declarações preconceituosas, como "está tudo tranquilo, não tinha nenhum paulista na torcida".
"As resoluções aqui são minhas. Isso aqui não é terreiro de nenhum suburbano de São Paulo", afirmou Viana, ao saber que o presidente do São Caetano solicitara a suspensão da final.
Minutos depois de o jogo ter sido suspenso, jogadores do Vasco, por ordem da diretoria, foram ao campo, pegaram a taça de campeão e deram a volta olímpica.
Muitos deles estavam constrangidos. Parte da torcida que ainda ocupava as arquibancadas começou a vaiar a equipe.
"O jogo terminou empatado em 0 a 0 (resultado que daria o título aos cariocas). Então o campeão é o Vasco", declarou Eurico.
Pelo regulamento da Copa JH, a partida deveria ser realizada hoje, um dia após seu cancelamento. O atacante Romário, que não estava em campo no momento da paralisação, não poderia jogar.
O dirigente vascaíno chamou Garotinho de "frouxo" e "incompetente" por ordenar o encerramento do jogo. "Se sair tumulto lá fora temos que responsabilizar o governador", disparou Viana.
Ao saber que a partida não seria retomada, os torcedores se dividiram entre a revolta e o desespero.
Muitos pediam o dinheiro de volta. A PM reprimiu com violência manifestações dos torcedores, conturbando mais o ambiente.
O São Caetano, que iniciou a Copa JH no Módulo Amarelo e se tornou a maior surpresa entre os 116 participantes, dominava o Vasco até a paralisação do jogo.
"Eles deveriam estar orgulhosos de ter jogado em São Januário. Não estão habituados a pisar em um estádio de primeiro mundo como o nosso", afirmou Eurico, em referência à construção de 1927, que jamais sofreu reforma profunda e ontem possivelmente recebeu mais torcedores do que a sua capacidade (35 mil lugares).
Ao saber que o Vasco se declarara campeão, o vice-presidente do clube do ABC , Luiz de Paula, disse que se contentaria com o vice. Mas o título de 2000 está oficialmente vago. O juiz não divulgou o relatório, fundamental para a decisão do Clube dos 13 -na terça-feira, a entidade decidirá o futuro da Copa JH em reunião.


Texto Anterior: Multimídia: Cris será a única novidade do Barça
Próximo Texto: Torcida organizada briga e causa avalanche humana
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.