São Paulo, segunda, 1 de março de 1999

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Trote tem quase mil anos

da Reportagem Local

O trote, para a maior parte dos calouros e veteranos , "é questão de tradição". Nisso eles têm toda razão. A brincadeira (brincadeira mesmo, sem violência) com os novos alunos tem cerca de mil anos.
Tudo começou na Idade Média, por volta do século 11, quando as primeiras universidades se formaram na Europa. Na época, elas eram associações entre professores e seus alunos mais antigos, os veteranos (nome dado aos soldados romanos mais velhos, que estavam para deixar a milícia).
Os candidatos (palavra derivada do latim candidus, branco, puro) a uma nova vaga no grupo não podiam assistir a aulas na mesma sala que os veteranos. Eles eram obrigados a ficar em uma ante-sala, com as bolsas e os casacos dos alunos mais velhos. Essa sala se chamava vestíbulo. A palavra vestibular vem daí, ou seja, a passagem obrigatória para se chegar à sala de aula da universidade.
Quando o candidato finalmente era aceito, os veteranos o recebiam com uma série de brincadeiras. O calouro (a origem da palavra é controversa, mas pode vir de calor, já que o novato está sempre nervoso, suado e esbaforido) era acolhido de maneira afetiva.
Suas roupas eram retiradas e queimadas por questão de higiene, e seus cabelos, raspados, para eliminar piolhos (lembre-se de que na Idade Média pestes proliferavam na Europa).
Estava criada a instituição do trote. O nome da brincadeira vem do germânico trotton (caminhar depressa), que era usado para os cavalos. O termo passou a ser usado também para designar as pessoas que passavam por gozações e humilhações e fugiam correndo.
Rito de passagem
Todas as sociedades têm seus ritos de passagem, e trote é um deles, explica Mario Sergio Cortella, professor do Departamento de Teologia e Ciências da Religião da PUC-SP. Esses ritos servem para marcar a passagem para um novo grupo ou um novo status social.
"Na nossa sociedade, os ritos sempre tiveram mostras de coragem e força", diz ele. "O problema é que, numa sociedade que banaliza a violência no cotidiano, esses ritos acabam em agressão."
Para ele, o trote é válido, desde que seja com o consentimento do calouro e sem violência. "Nesse sentido, temos muito a aprender com os medievais."




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