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Nirvana Ano 10
ANDRÉ BARCINSKI
especial para a Folha, de Nova York
Há exatos dez anos, uma pequena gravadora de Seattle, a Sub Pop,
lançou "Bleach", o primeiro disco
do Nirvana. Pouca gente prestou
atenção no LP, mas os poucos que
ouviram ficaram maravilhados.
"Bleach" misturava a fúria primal do punk com uma sensibilidade pop e inaugurou o que se convencionou chamar de grunge. Gravado em oito canais pela bagatela
de US$ 600, era "sujo" demais para
as rádios mais comerciais. Vendeu
pouco, mas fez um baita sucesso
no mundinho alternativo e revelou
a genialidade de Kurt Cobain.
Dois anos depois, o Nirvana voltaria à carga com "Nevermind",
um disco mais polido e acessível. A
faixa "Smells Like Teen Spirit" estourou, e o rock nunca mais foi o
mesmo. Com um disco, o Nirvana
destruiu a barreira que separava o
rock "alternativo" das massas; o
punk deixou de ser propriedade de
uns poucos felizardos e tomou de
assalto a mídia. Foi como se uma
epidemia de bom gosto tivesse subitamente infectado todo o planeta.
Hoje, cinco anos depois do suicídio de Kurt Cobain, o Nirvana continua mais influente e importante
do que nunca. Duvida? Então pergunte a Thom Yorke, do Radiohead, ou Noel Gallagher, do Oasis,
quem foi que lhes abriu as portas
para o sucesso. Depois que "Nevermind" provou que era possível
misturar tantos estilos, punk, pop,
metal, new wave, blues numa música só, ninguém mais ousou se fechar num clubinho exclusivo.
O mentor dessa revolução foi
mesmo Kurt Cobain. Passam-se os
anos e fica cada vez mais claro que
o sujeito era um artista especial.
Como letrista, não ficava nada a
dever a Neil Young ou Bob Dylan.
Tinha uma capacidade incrível de
dizer muito em poucas palavras
(não é essa a grande prova de fogo
da música pop?); em "Smells Like
Teen Spirit", usou frases aparentemente desconexas para falar do
isolamento e letargia de sua geração: "Com as luzes apagadas é menos perigoso/ Aqui estamos/ Entretenha-nos / Sinto-me estúpido e
contagioso"; em "Serve the Servants", ironizou a própria fama de
"porta-voz da geração 90": "O ódio
adolescente rendeu boa grana/
Agora estou velho e entediado."
Musicalmente, o Nirvana foi
uma revolução. A banda começou
tocando um punk barulhento, influenciado por grupos dos anos 80
como Black Flag, Flipper, Big
Black e Fear, mas logo começou a
incorporar outras influências. Cobain era fã de rock mais melódico e
adorava bandas pop como o Vaselines, da Escócia, o Shonen Knife,
do Japão, e o Raincoats, da Inglaterra. Quando escreveu "Smells Like Teen Spirit", confessou que quis
copiar o Pixies (fantástica banda
americana especializada em punk-pop); já o riff de guitarra de "Come
As You Are" foi chupado de "Eighties", do grupo punk-industrial inglês Killing Joke.
Cobain, Chris Novoselic e David
Grohl juntaram todas as bandas de
que gostavam, fizeram uma mistura dos diabos e acabaram criando
um novo som. No processo, ajudaram a ressuscitar a carreira de vários de seus ídolos, como Butthole
Surfers, Melvins, Meat Puppets e
Shonen Knife. O Nirvana foi um liquidificador sonoro: durou pouco,
mas mexeu com o rock para sempre. A banda mais importante desde os Sex Pistols. Fim de papo.
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