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ESCUTA AQUI
Ataques de estrelismo! Egos descontrolados! O rock é ridículo!
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
colunista da Folha
"Quando os astros do rock
enlouquecem." A chamada de
capa não deixa dúvidas: a edição
de maio da revista inglesa "Q" está nas bancas para ridicularizar
nomes estabelecidos e, de quebra, nos fazer dar boas risadas.
Melhor, impossível.
A "Q" traz uma compilação dos
cem momentos mais ridículos da
história do rock: delírios de auto-importância, ataques de estrelismo, megalomanias generalizadas, loucura terminal.
Não escapa ninguém. De bandas esquecidas, como o pós-punk Killing Joke, às ultracomerciais Spice Girls, passando, é claro, pelas grandes estrelas do rock
progressivo, esse gênero que, vitimado por suas pretensões "artísticas", se transformou em sinônimo da palavra ridículo.
Sobra até para os sacrossantos
Beatles, que surgem na centésima posição com seu filme malogrado "Magical Mistery Tour".
O incriticável Marvin Gaye
também está lá, na posição 98,
por causa de sua tentativa, nos
anos 70, de se tornar jogador de
futebol americano.
Em 96º, vem a maior banda de
todos os tempos na opinião de
"Escuta Aqui", o Clash. Tudo
porque esses punks ingleses encasquetaram de lançar um álbum
triplo, "Sandinista!". Por um motivo parecido (álbum quádruplo), o grupo americano Chicago
emplaca a 90ª posição.
A lista é de morrer de rir. Grateful Dead toca nas pirâmides
(92ª); os Beach Boys ficam amigos do assassino Charles Manson, achando que ele era um cara
legal (79ª); Jimmy Page, guitarrista do Led Zeppelin, se envolve
com bruxaria (85ª); Mel C, das
Spice Girls, vira "punk" (74ª).
Um tanque de guerra em forma
de tatu foi a maior atração da turnê de 1971 de Emerson, Lake and
Palmer e, tantos anos depois, levou seus mentores ao 22º lugar
da relação da "Q". Caso parecido
com o do tecladista Rick Wakeman, que lhe garantiu um formidável segundo posto graças a seu
espetáculo inspirado nas lendas
do rei Artur, em 1975, com uma
orquestra completa, coral de 46
pessoas e 26 figurantes fantasiados de cavaleiros.
Pink Floyd, a banda predileta
de brasileiros saudosos, também
foi lembrada (62ª), pela "genial"
idéia do líder Roger Waters, em
1977, de construir um muro gigantesco entre os músicos e a platéia.
Falando em preferências verde-amarelas, não poderiam faltar
os metaleiros do Deep Purple
(56ª), pelas gravações com a Orquestra Real Filarmônica de Londres. Diz o verbete que, em certo
momento, uma violoncelista se
retirou em protesto, acusando os
cabeludos de "Beatles de segunda
categoria".
O Brasil aparece com destaque
na 43ª posição, reservada a Sting
e suas pretensões de salvar a floresta amazônica. Ele posa ao lado
do índio Raoni, chamado de "o
homem com um CD no beiço".
É justamente o caráter de metralhadora giratória o ponto mais
elogiável da compilação da "Q".
Fazer piada com os cachorros
mortos do rock progressivo é fácil, então eles estendem suas bordoadas a muitos intocáveis: David Bowie, os alternativos Flaming Lips, o reggaeman Lee
Perry, Jim Morrison (dos Doors),
Bob Dylan e muitos outros.
Pena que revistas estrangeiras
custem preços indecentes no
Brasil, porque a "Q" de maio é
uma aula de como analisar música pop com conhecimento e bom
humor. Para quem tem Internet,
vale uma conferida no site:
www.qonline.co.uk.
Ah, você quer saber quem ficou
em primeiro? O insuperável Michael Jackson, que mandou
construir uma estátua de si mesmo e a botou para flutuar no rio
Tâmisa.
Aconteceu na semana passada
uma das mais importantes reviravoltas no mundo da música,
desde o surgimento da Internet.
O milionário grupo americano
Limp Bizkit, o rei do chamado
rap metal, anunciou uma turnê
de quatro semanas com ingresso
grátis!
Tudo graças ao patrocínio de
ninguém menos que a empresa
Napster, a mesma que bolou o
programa de computador mais
odiado pela indústria da música.
Com o Napster, computadores
do mundo inteiro compartilham
suas memórias. Assim, para baixar uma música, você não precisa entrar num site (que pode cobrar para liberar a canção). Você
procura o que quer dentro dos
computadores de outras pessoas,
e faz o download diretamente.
É uma rede infinita e sem controle. Ninguém paga ou recebe
direito autoral nessa história.
Metallica e Dr. Dre já entraram
na justiça contra a Napster, e várias faculdades, com medo de
processos, já proibiram o acesso
ao Napster em seus potentes
computadores.
E o que o Limp Bizkit acha?
Com a palavra, o líder, Fred
Durst: "Não estamos nem aí se a
velha geração quer manter tudo
como está. Estamos preocupados com nossos fãs e sabemos
que eles querem música pela Internet".
Com graus variados de fúria,
três leitores escreveram para
corrigir "Escuta Aqui", que, na
semana passada, chamou de
"rock experimental americano"
a banda alemã Mouse on Mars.
OK, reparo registrado.
Mas isso me lembra uma história do Chacrinha, há uns 20
anos. Sem saber qual era a próxima atração, ele deu uma olhada
furtiva nos bastidores e avisou:
"Vamos receber... Fernaaaaando Mendeeeees!".
Mas o rapaz que entrou, apesar de certa semelhança, não era
o cantor de "Cadeira de Rodas" .
Meio sem jeito, alertou o Velho
Guerreiro.
Sem titubear, Chacrinha devolveu: "Ah, não é? Mas tu é a cara do Fernando Mendes!".
O mesmo vale para o Mouse
on Mars: não é rock experimental americano, mas que parece,
parece.
Álvaro Pereira Júnior, 37, é jornalista e
mora em San Francisco. E-mail: cby2k@uol.com.br.
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