São Paulo, segunda-feira, 02 de janeiro de 2006

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LIVRO

Confira a saga real de um adolescente de 15 anos em plena Revolução Cultural chinesa por meio de relato ilustrado

Pesadelo chinês

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Ange Zhang tinha 15 anos em 1968, quando teve de abandonar a escola e passar a viver na zona rural da China, para trabalhar e aprender com os camponeses. Era o ápice da Revolução Cultural, movimento que virou o país de cabeça para baixo entre 1966 e 1976, com o ataque a tudo o que era identificado como burguês, tradicional ou ocidental.
Filhos se voltaram contra os pais, estudantes contra os professores e até líderes tradicionais do Partido Comunista passaram a ser vítimas de perseguição. Escritor, o pai de Ange foi enviado à prisão, onde passou quase toda a Revolução Cultural. Sua tia, comunista veterana, suicidou-se depois que seus alunos a "denunciaram".
Os camponeses e os operários passaram a ser os heróis do país. Como Ange, milhares de estudantes deixaram as salas de aula para aprender com as classes revolucionárias. As universidades foram fechadas e livros de autores ocidentais, queimados.
Os jovens eram ao mesmo tempo algozes e vítimas da Revolução Cultural. Foram mandados para o campo e para as fábricas, mas também formavam os grupos de "Guardas Vermelhos", eleitos pelo então presidente Mao Tsé-tung como os principais agentes dessa nova revolução.
"Toda rebelião se justifica", era o lema de Mao, que se tornou objeto de um culto à personalidade poucas vezes visto na história. Os chineses passaram a decorar centenas de citações de Mao e o seu Livro Vermelho era carregado por todos.
Ange viveu por três anos em uma aldeia rural, para onde foi mandado por decisão do Partido Comunista junto com outros estudantes. Trabalhavam diariamente na árdua tarefa de cultivar a terra.
Desolado com a perspectiva de passar o resto de sua vida no campo, Ange encontrou na arte uma maneira de dar sentido a seu cotidiano rural. Com tintas a óleo emprestadas por um amigo, começou a pintar e não parou mais, nem mesmo depois de ser transferido para uma fábrica de lápis, onde trabalhou por mais sete anos.
O relato desse longo período de turbulências e privações está no livro "Terra Vermelha, Rio Amarelo" (edições SM; 64 págs.; R$ 26, em média), para o qual Ange realizou ilustrações. Os rostos que ele retrata são tristes e melancólicos, bem diferentes dos cartazes da época, que mostravam estudantes, camponeses e operários sorridentes e confiantes em um futuro incerto.


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