São Paulo, segunda-feira, 02 de julho de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Coisas feitas aqui que não chegam até você

É muito fácil dizer que não se faz rock bacana no Brasil, que nossas influências remetem a vanguardas ultrapassadas e que, além de tudo, não existem muitas bandas por aqui. O pensamento só é justificável porque difícil mesmo é ter acesso aos novos discos e grupos que circulam no mercado independente brasileiro. E, para quem não está satisfeito com o que tem na mão, a única saída é correr atrás mesmo porque bandas têm pipocado por todo canto, deixando de lado a facilidade das fórmulas que macaqueiam bandas gringas em busca de uma identidade própria, mesmo cantando em inglês.
É claro que ainda estamos há anos luz de contar com a mesma produção de outros países, tanto em quantidade quanto, muitas vezes, em qualidade. De qualquer forma, existe um universo a ser desbravado quando se trata de música independente e os selos daqui têm dado conta de lançar material bem produzido mesmo que em um mundinho restrito.

Uma das bandas mais cultuadas da cena indie brasileira é o Thee Butchers Orchestra, que faz um garage rock dos anos 60 inflamado por duas guitarras, uma boa dose de blues e vocais alucinados. Lembra um pouco Jon Spencer ainda mais imprudente. A banda recém-lançou seus "Golden Hits", pela Ordinary Records (www.ordinary.somewhere.net), do qual fica difícil destacar algumas faixas. O disco é para ser ouvido inteiro -é colocar no som, deixar rolar e enlouquecer.
O disco do Pullovers (www.reverb.com.br/pullovers/), "Pullovers Can"t Play Covers", da Ordinary Records, também é desses de ouvir de cabo a rabo, cheio de fofices. A banda faz um indie pop comportado e certinho, sem grandes inovações, mas com tudo em seu lugar e medida: letras bacanas, vocais alternados e melodias boas de cantarolar que grudam nos ouvidos.
Bem mais nervoso é o trio Biggs, de Sorocaba (SP). "Wishful Thinking" saiu pela Gig Records e trafega entre o punk, o emocore (um hard core mais emotivo) e um guitar com letras cheias de cólera entoadas por garotas de atitude, que às vezes soam como a viúva grunge Courtney Love e seu Hole.
De Sorocaba também vem a "guitar band" Wry (www.thewry.co.uk), que faz um som inspirado nos grupos de rock inglês. Ano passado, lançaram o CD "Heart Experience".
A banda Flávio Cavalcanti (flavio-cavalcanti@hotmail.com), de João Pessoa (PB), também toca rock e registrou sua irreverência e ironia no CD independente "Flávio Cavalcanti na Praia - Vol. I" -o próximo disco deve sair pelo selo Arsenal, da Abril. As faixas são empolgantes, para ninguém ficar parado, mas há momentos mais melancólicos, tudo em bom português.
Já os vocais do Space Invaders -que lançaram o instigante "Nas Infecções Mais Graves, a Posologia Pode Ser Aumentada para 100 Angstrons", pela Bizarre Music (www.bizarremusic.com.br)- viajam por universos desconhecidos de uma linguagem que eles mesmo inventaram para acompanhar seu ótimo instrumental de pseudo-surfmusic bem marcada. Tamanha esquizofrenia pode ser um pouco irritante, mas talvez isso faça parte da história toda.
Agora quem explora mais a fundo a percepção do ouvinte é o projeto Objeto Amarelo. Trata-se, na verdade, de uma cabeça pensante, a de Carlos Issa (carlosissa@hotmail.com), que experimentou misturar poesia e teclados Moog em pirações já comparadas ao trabalho de Arnaldo Baptista (ex-Mutantes). Seu disco, "O.A.", lançado pelo selo argentino Setenta y Dos, foi todo gravado caseiramente e perceber isso logo na primeira audição só conta pontos a favor nesse caso. Filosofia punk a serviço do experimental.
O quinteto paulista Hurtmold (hurtmold@hotmail.com) também apresenta sonoridades novas à maioria dos ouvidos brasileiros. O grupo faz o se pode chamar de música contemporânea, na praia do post-rock, ou seja, uma mistura de elementos acústicos e eletrônicos de forma jazzística e progressiva. Seu primeiro CD, "Et Cetera", saiu pela Submarine Records, e traz faixas instrumentais muito bacanas, ao contrário das sofríveis canções letradas, interessantes apenas por algumas longas introduções.
Instrumental também é o trabalho do bajulado Sala Especial (salaespecial@bizarremusic.com.br), que tem single lançado pela Bizarre Music. A banda toca easy-listening com teclados de churrascaria, pitadas de bossa nova e influências da Jovem Guarda. O resultado remete à trilha Vampyros Lesbos, só que com brasilidade.
Ritmos tipicamente brasileiros e nem tão populares como o carimbó e o retumbão, aparecem misturados ao rock no caldeirão composto pelo grupo Cravo Carbono (cravocarbono@yahoo.com.br), de Belém (PA). O CD "Peixe Vivo", foi lançado o ano passado, e o grupo já tocou em São Paulo, em um show no qual conquistou o público presente no Itaú Cultural.


Texto Anterior: Coisas lá de fora que nunca chegam
Próximo Texto: Saiba como obter tudo de graça na internet
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.