São Paulo, segunda-feira, 04 de novembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Especialistas brasileiros condenam a política dos EUA

DA REPORTAGEM LOCAL

Não é apenas nos Estados Unidos que a abstinência sexual encontra adeptos entre adolescentes. Na semana passada, o Folhateen publicou uma carta do leitor Rafael Marques da Silva, 18, um vestibulando de Limeira que louvava a castidade, inclusive em relação à masturbação.
Depois de receber diversas cartas criticando a posição de Rafael (veja a de Fernando Gazzaneo, 16, à pág. 2), o Folhateen ouviu o rapaz para saber que motivos o levaram a adotar a abstinência e o que ele pensa sobre as políticas americanas que pregam a supressão do sexo como meio de evitar a gravidez na adolescência e as DSTs (doenças sexualmente transmissíveis).
Rafael considera a política boa. "Ficar sem fazer sexo é a melhor opção para não se contaminar. Esse é um dos benefícios da castidade. Mas também há outros, que envolvem a parte emocional. Você fica com domínio de si", diz.
Rafael, que é virgem, diz que controla seus desejos sexuais há três anos e nem se masturba. A idéia de parar de se masturbar veio depois de ter participado de um retiro de jovens promovido pela Igreja Católica. Embora se sinta bem com a decisão, ele diz que enfrenta preconceito. "Assim como eu aceito opiniões contrárias à minha, espero que as pessoas ajam da mesma forma.
Quanto a perder a virgindade, Rafael diz que só o fará quando encontrar a pessoa certa.

Especialistas
Se a posição de Rafael deve ser respeitada individualmente, para especialistas brasileiros em sexualidade e em infectologia, um governo fazer campanha em favor da abstinência é algo temerário.
"Pesquisas têm demonstrado a ineficiência de campanhas como essas de cunho moralista, normativo e autoritário, que afastam os adolescentes em vez de aproximá-los da prevenção, de aprender a cuidar da sua saúde sexual e de seu bem-estar", afirma Beth Gonçalves, 50, coordenadora do projeto Trance essa Rede, do Gtpos (Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual).
"Os adolescentes necessitam de ações continuadas que possibilitem espaços democráticos de reflexão sobre a vivência da sua sexualidade, a expressão dos sentimentos e dúvidas e a discussão de valores, tabus e preconceitos que dificultam a adoção de práticas seguras", completa.
O médico infectologista do Hospital das Clínicas Ricardo Tapajós, 38, também condena a abstinência. "É claro que não fazer sexo é um jeito eficiente de não pegar DSTs, mas, do ponto de vista médico, não se pode reprimir uma coisa que faz parte do funcionamento normal do ser humano. Você estaria induzindo uma disfunção para prevenir outras coisas", diz. "Usar a abstinência como política governamental é irresponsabilidade, pois causa traumas e piora a saúde mental média da população", completa.
Para ele, nessa política há uma outra questão por trás da médica, que chama de policiamento ideológico. "Ela é uma política que abarca o discurso da direita moralista americana, que não se dá bem com o sexo. Para um subgrupo da sociedade americana, a única forma possível de sexo é a heterossexual, nupcial, vaginal, monogâmica e fiel. Não dá para levar a sério", conclui. (GUILHERME WERNECK)


Texto Anterior: A ex-virgem Britney ainda pode ser perdoada
Próximo Texto: Transar é comum nos namoros e nas "ficadas"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.