São Paulo, segunda-feira, 05 de julho de 2004

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Na carona de Michael Moore

RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK

Em "Super Size Me", Morgan Spurlock faz o papel de um Michael Moore (aquele, de "Tiros em Columbine" e agora de "Fahrenheit 9/11") mais magro e simpático, disposto a provar que um Big Mac pode ser tão prejudicial à sua saúde quanto um maço de cigarros ou a política antiterror de George W. Bush.
Amparado por três médicos e uma namorada vegetariana, Spurlock filma a experiência pessoal de passar um mês fazendo três refeições ao dia no McDonald's.
Mas a questão interessante do filme acontece ao largo do processo de destruição do fígado e da forma física do cineasta.
Quem é o verdadeiro responsável pelos malefícios do excesso de consumo de fast food nos EUA -e o fato de isso aparentemente ser a causa de o país ter se tornado uma terra de obesos-, as cadeias de lanches rápidos e pouco nutrientes ou quem escolhe se entupir de sanduíches?
Com mão leve, Spurlock monta seu argumento: um médico compara o poder viciante da comida ao da heroína, o diretor narra sua própria melhora de humor durante as refeições, seguida de desânimo nos intervalos, há a responsabilidade atribuída às propagandas de TV e aos parques de diversão presentes nas lojas do McDonald's.
Num dos momentos de melhor humor (?!), o cineasta anuncia uma alternativa para inviabilizar essa "perversão" da infância pela rede do palhaço amarelo e vermelho: dar um soco no filho toda vez que passarem diante de um fast food. Há momentos mais assustadores: a namorada de Spurlock diz, ali pela metade do mês, que o rapaz está tendo sua vida sexual afetada.
Enquanto isso, ele segue as regras: comer, até o fim dos 30 dias, todos os itens do cardápio. Na primeira experiência com os baldes de comida, outro momento de terror: entupido, o diretor vomita. A massa pastosa é focalizada, para desgosto e repúdio da platéia. O paralelo é claro com o consumo de cigarros e as supostas responsabilidades da indústria tabagista, interessada em manter todos dependentes da nicotina.
E a mesma perseguição é sugerida para os pobres gordinhos americanos: um entrevistado pergunta por que é socialmente aceito recriminar um fumante, mas não um obeso "dependente" de Big Macs.
O curioso é que o maior dependente do sanduíche que aparece, um californiano que diz já ter comido mais de 19 mil combinações de Big Mac -nove deles num mesmo dia, seu recorde-, é mesmo bem magrinho. "Mas ele quase nunca come as batatas fritas", explica o diretor. Ah, bom.
"Super Size Me" é um filme que prova seu argumento: de fato, comer por um mês, três vezes por dia, todos os dias da semana, no McDonald's parece fazer mal à saúde.
A verdadeira discussão -se tenho o direito de me matar lentamente com Big Macs, cigarros ou o que for- segue -e isso é uma qualidade do filme- inconclusa. Mas Spurlock ainda vai ter que comer muito Quarterão com Queijo para se transformar em um Michael Moore.


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