|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Quando a loucura é doença
free-lance para a Folha
"Aos 16 anos, além da loucura
normal da adolescência, eu desenvolvi um problema psicológico, tinha pânico só de pensar que poderia ser convocado pelo Exército,
escutava vozes, era muito fechado,
introvertido, não conseguia falar o
que sentia, e minha mãe acabava
fazendo tudo para mim, porque eu
parecia um morto-vivo."
Hoje, depois de um longo tratamento e intensa terapia, Zacarias
Antiqueira, 33, tem uma vida normal. "Eu quis me salvar e agora
tento conviver com a sociedade e
minha família da melhor forma
possível."
O psiquiatra Jonas Melman diz
que alguns jovens desenvolvem
transtornos mentais mais sérios,
onde aparecem sintomas diferentes dos verificados normalmente
na adolescência. "Chegam a adoecer e, em situações extremas, podem romper quadros psicóticos."
Segundo o médico, não se sabe a
origem exata desses tormentos
mentais. Mas a concepção mais
aceita é a de que vários fatores
-biológicos, psicológicos, mentais, sociais, familiares, genéticos- concorrem para precipitar o
quadro. "De alguma forma eles se
articulam de uma determinada
maneira num indivíduo que tem
uma predisposição, e o quadro irrompe", diz.
Foi o que aconteceu com o office
boy Nílton Gonçalves Filho, que
aos 18 anos, de um momento para
outro, começou a ouvir coisas, ficar muito quieto e desenvolver
uma intensa fobia de polícia. "Eu
percebi que não estava bem, fiz
acompanhamento terapêutico em
casa e com médicos e hoje, com 26
anos, eu me sinto uma pessoa feliz,
tenho o meu próprio negócio, conta corrente e até cartão de crédito",
diz Nílton.
A médica assistente do serviço
do Departamento de Psiquiatria
da Infância e Adolescência do
Hospital das Clínicas, Maria Cristina Ferrari, explica que o que se
chama de loucura, a psicose, é um
rompimento com a realidade.
"A pessoa começa a se isolar, tem
queda no rendimento escolar (ou
no trabalho), idéias de perseguição, pode ficar muito agressiva ou
autodestrutiva." Para a médica,
nem todos os jovens têm a mesma
sorte de Zacarias e Nílton.
Dentre os distúrbios a que os
adolescentes estão sujeitos, como
fobias, depressão e os transtornos
obsessivo-compulsivos (mania de
limpeza é um deles), o mais grave,
e que pode ser irreversível, é a esquizofrenia.
Trata-se de uma fragmentação
do pensamento que traz perdas
cognitivas, se não descoberta nos
seus estágios iniciais, diz Maria
Cristina. "É como um vaso: se houve uma pequena quebra, é possível
colar e restituir a forma inicial."
O psiquiatra Haim Gunsprun diz
que a esquizofrenia surge aos 13, 14
anos de idade, quando o jovem se
retrai demais por um excesso de timidez, de autocrítica ou fica muito
inquieto, ansioso demais para encontrar respostas para o momento
que está vivendo.
"As consequências são devastadoras, vão da diminuição da capacidade intelectual até uma perda
afetiva irreparável", diz ele.
Há distúrbios psicológicos menos graves, mas também danosos,
como as somatizações. Carol, estudante de 16 anos, aceitou o conselho de sua dermatologista, com
quem estava tratando uma intensa
queda de cabelo, e começou a fazer
terapia.
"Estou me sentindo muito melhor, porque percebi que a queda
de cabelo era um sinal de que eu
não estava bem, principalmente
porque não sabia conviver com a
frustração de ter um pai alcoólatra.
Agora já estou convivendo melhor
com esse problema, aceitando."
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|