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FREE WAY
Machistas do mundo: uni-vos!
GUSTAVO IOSCHPE
especial para a Folha
Nestes tempos bicudos para
nós, machos, tenho de admitir:
dou graças a Deus por ter nascido
homem. Não só pela parte funcional da coisa (não menstruar, não
ter TPM, não ter de carregar um
filho por nove meses e depois ficar tirando a teta toda hora pra
dar de mamar), mas principalmente pelo lado cultural. Porque
ser mulher é carregar nas costas
uma história de milênios de discriminação.
A cultura judaico-cristã, da qual
bebemos, coloca a mulher e sua
incontrolável curiosidade -Eva
e a maçã- no centro do pecado
original, pelo qual teremos de pagar a prestação até o último dia.
De lá até há pouco, ser mulher
significava ser excluída ou, na
melhor das hipóteses, incompreendida. Até Freud se resignou
a chamá-la de "O Continente Negro".
Assim, seguiram-se séculos em
que a mulher só ia pra "sala" da
vida "fazer turismo", como reza
piada machista, pois seu lugar na
ordem das coisas era limitado à
cozinha -literal e metaforicamente.
As mulheres não trabalhavam
fora de casa, eram propriedade de
pais, depois, maridos, até cumprir sua principal função: dar
continuidade à espécie. Levando-se em conta que a "minoria" feminina é mais de 50% do planeta
e que todo machista tem uma
mãe, é de espantar que a revolta
feminina tenha levado tanto tempo para acontecer.
Nas décadas de 60 e 70, quando
o movimento feminista consegue
resultados significativos, a balança começa a se equilibrar. Mas as
raivosas feministas de então ainda tinham de lutar contra uma visível diferença em relação aos homens -somos mais fortes, mais
altos, nosso cérebro é maior e, digamos, nós teee-mos, vocês não
tê-êm- que parecia nos garantir
a superioridade. Ainda por cima,
somos apoiados pelos achados da
antropologia, da sociobiologia e
da teoria da evolução, que colocam os homens como eternos
provedores das mulheres, historicamente confinadas às cavernas
enquanto os homens caçavam.
Expostas a todas essas desvantagens, só restou às feministas
pregar a rigorosa igualdade entre
os sexos. Mas, como todos sabem,
as mulheres não são -felizmente- iguais aos homens. São diferentes, nem melhores nem piores.
O feminismo vinha evoluindo
nessa direção até chegar agora no
que a última "Time" chama em
sua matéria de capa de "fêmea-ismo", numa tradução livre. Trata-se de um revisionismo histórico
que busca mudar as percepções
sobre a mulher na origem do problema, que é justamente esse legado histórico e, principalmente,
biológico, para finalmente convencer todos os machos de que as
mulheres são, indubitavelmente,
o sexo forte.
As "provas" abundam: elas têm
cérebro menor, mas têm maior
densidade de neurônios; têm
mais leucócitos no sangue; podem ser mais baixas e mais fracas,
mas são mais resistentes à fadiga
(óbvio pra quem já foi a shoppings fazer compras com a namorada). Sua anatomia é mais
"sociável": um útero que se
prepara todo mês para um
novo ser humano e seios
que o mantêm depois de nascido.
Até o que antes era um problema, virou motivo de festa: as "fêmea-istas" consideram a TPM
um período
de "clareza intelectual elevada e
aumento de atividade", e a menopausa não seria um período de
destemperos corpóreos, mas uma
"onda de poder" e um rito de passagem merecedor de comemoração.
No campo histórico-evolutivo,
as revisões são muitas. Os povos
caçadores da Antiguidade, na
verdade, extraiam 70% de suas
calorias de plantações, cultivadas adivinhe por quem.
A idéia de que a mulher precisava do homem para ajudar na criação da prole foi agora substituída pela "hipótese vovó", segundo a qual não seriam os
maridos, mas sim as avós, a
ajudar a mulher a garantir
a sobrevivência dos filhos.
E aquela história de que o
homem caçava enquanto a
mulher ficava em casa é derrubada pelo conceito da "caçada comunal", na qual todos
os membros da família -sogra
à frente- confrontavam a caça
até empurrá-la à beira de um
penhasco ou envolvê-la em redes que a prendiam,
sem necessitar de
lanças.
O papo de que o
homem seria geneticamente mais agressivo
também vai para o ralo. Estudos mostram que até os três
anos de idade, quando as diferenças culturais ainda não se manifestam, ambos os sexos são igualmente agressivos.
Por último, até a nossa legendária cachorrice não passaria de
conversa pra corno, digo, boi
dormir: as mulheres seriam tão
taradas quanto os homens, como
mostram os genes e a Tiazinha.
Seu impulso é tão forte que em
tribos africanas até hoje esse desejo é refreado por meio da amputação do clitóris e, em países
muçulmanos, as adúlteras são
apedrejadas em praça pública, o
que configura o único caso em
que, literalmente, a mulher morre
de vontade de transar.
E, pra acabar com a auto-estima
masculina, essas terroristas fazem questão de mostrar que até a
nossa maior fonte de orgulho não
é tão boa quanto a delas: enquanto o nosso Bráulio tem de se revezar fazendo as vezes de órgão sexual e urinário, as mulheres têm o
clitóris só para aquilo. E, mordamo-nos de inveja, o clitóris tem o
dobro de fibras nervosas.
E depois ainda reclamam que
há tanto gay no mundo!
Gustavo Ioschpe, 22, é escritor e estuda administração na Wharton School e ciência política
na University of Pennsylvania, EUA, e-mail: desembucha@cyberdude.com
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