São Paulo, segunda-feira, 09 de fevereiro de 2004

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FOLHATEEN EXPLICA

Morte de fiscais chama a atenção para abusos

Escravidão foi abolida, mas ainda é praticada no Brasil

Arquivo do Ministério do Trabalho
Trabalhador encontrado em estado de semi-escravidão


MAURO ALBANO
DA AGÊNCIA FOLHA

Oficialmente abolida pela Lei Áurea, em 1888, a escravidão ainda é praticada nas regiões mais remotas do Brasil rural. Ao contrário do que ocorria no período colonial, a escravidão do século 21 não é baseada em questões raciais -e pode até ser considerada mais barata para os fazendeiros que a exploram atualmente.
Os escravos de hoje não precisam ser comprados pelos fazendeiros. São trabalhadores rurais arregimentados em regiões miseráveis, geralmente do Maranhão e do Piauí, sob a promessa de trabalho temporário em fazendas do sul do Pará e do norte de Mato Grosso, onde esse tipo de exploração é mais comum.
Ao chegar ao local, os peões descobrem que não há salário e que vão trabalhar para saldar sua dívida com o fazendeiro ou com seu "gato", o homem que recruta a mão-de-obra.
O valor da dívida é estipulado pelo "gato" e é supostamente baseado nos custos do transporte dos trabalhadores até a fazenda, da comida, da estadia e das ferramentas de trabalho -itens que o próprio empregador tem a obrigação de fornecer.
Os peões acabam presos ao trabalho por causa das dívidas e também pela distância entre as fazendas e as áreas urbanas mais próximas -além da presença, em alguns casos, de seguranças armados.
O código penal chama essa prática de "redução a condição análoga à de escravo". Ela é caracterizada pela atuação dos capatazes armados, pelo sistema de endividamento ou pela restrição do direito de ir e vir.
Os primeiros registros de escravidão nesses moldes surgiram no Brasil no início da década de 70, no período de expansão da fronteira agrícola na região amazônica. O trabalho escravo era facilitado pela ausência de fiscalização por parte das autoridades públicas.
Atualmente, a CPT (Comissão Pastoral da Terra), entidade ligada à Igreja Católica, acredita que existam 25 mil pessoas submetidas ao trabalho escravo no Brasil. No ano passado, a fiscalização do Ministério do Trabalho libertou 4.932 trabalhadores em situação análoga à escravidão.
No fim de janeiro, três auditores fiscais do Trabalho, ligados ao departamento regional de Belo Horizonte, e o motorista que os acompanhava foram mortos na rodovia vicinal MG-188, a 55 km de Unaí (MG). Os quatro receberam tiros na cabeça. Uma força-tarefa está investigando o crime.
O objetivo dos fiscais assassinados era vistoriar as condições de trabalho, remuneração e acomodação das pessoas arregimentadas para colher a safra de feijão na região. Apesar de um dos fiscais ter recebido ameaças de morte, o grupo não tinha proteção policial.



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