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EXPOSIÇÃO
Instalação de Pinky Wainer em frente ao Pátio do Colégio, no centro de São Paulo, denuncia assassinatos de adolescentes
no país com imagens, números, estatísticas e textos do escritor Ferréz e desperta reações de jovens que passam pelo local
Arte contra a violência
ALESSANDRA KORMANN
DA REPORTAGEM LOCAL
Na praça em frente ao Pátio do Colégio, na região central de São Paulo,
a visão perturbadora de corpos de
jovens assassinados chama a atenção de
quem passa. Não é mais uma chacina. Trata-se de uma intervenção urbana de denúncia contra os assassinatos de jovens,
feita pela artista plástica Pinky Wainer, 49.
A obra está na rua desde a semana passada e vai ficar exposta até o final do mês,
dentro da programação oficial do festival
de hip hop Agosto Negro. O Folhateen esteve lá para conversar com os jovens que
param para ver a instalação, um painel sinuoso de 12,8 m x 2,2 m que traz textos do
escritor Ferréz, estatísticas de uma extensa
pesquisa e imagens bem fortes -como a
do corpo de um menino assassinado na
guerra do tráfico no Rio sendo transportado em um carrinho de supermercado.
No segundo dia da exposição, em que a
reportagem esteve lá, a maioria das pessoas
que passava dava pelo menos uma espiada.
Os "engravatados" olhavam com pressa.
Muitos paravam -principalmente as pessoas mais simples. E, se um parava, logo
chegavam outros. "Muita gente começa a
ver as imagens e depois acaba lendo tudo",
observa Pinky, que disse estar indo ao local
todo dia. "Fico lá, sentadinha, olhando a
reação das pessoas."
Adriano Carvalho, 25, estava passando
por acaso e parou. "Chamou-me a atenção
porque vou muito a shows do Rappa, e o
Falcão tem essa postura de mostrar a desigualdade social que engole a gente", diz. Ele
contou que tem três amigos que foram
mortos bruscamente. "Eu cultuo muito a
paz. Se cada pessoa tivesse amor ao próximo, nada disso aconteceria. A Justiça no
Brasil infelizmente é fraca, falha e covarde."
Wkelisson Daniel Silva Cabral, 18, veio de
Cotia, na região metropolitana de São Paulo, especialmente para ver a instalação. "É
interessante observar a realidade, isso tudo
é muito pouco divulgado. A maioria da violência é contra o jovem negro", diz. O seu
irmão Ulysses, 22, concorda. "O ser humano trata o ser humano como qualquer coisa, como bicho." Os dois terminaram o ensino médio e estão desempregados.
Uma alemã de 21 anos, que estava há quatro dias no Brasil e preferiu não se identificar, também ficou impressionada. "Eu já tinha assistido a "Cidade de Deus" na Alemanha. Acho importante as pessoas terem conhecimento da violência. Eu não entendi as
palavras, mas só as imagens dão o recado."
"É muito triste e revoltante", resumiu a
cabeleireira Wilma dos Santos Fonseca, 24,
que trabalha ali perto. Era a segunda vez
que ela estava vendo a obra. No primeiro
dia, depois de ver tudo, sentou e começou a
chorar. Voltou no dia seguinte, levando
duas colegas de trabalho. "Quem tem um
pouco de sangue nas veias vai ler isso aqui e
refletir um pouco. Quem sabe ajuda a melhorar", espera.
A própria artista, no entanto, não tem
tanta esperança. "Não acredito que mude
nada, mas, se mexer com uma pessoa, ou
com duas ou três, é o que a gente pode fazer", diz Pinky. "A minha impressão é que,
se esses jovens tomarem consciência de
que a violência é um problema grande, alvo
de pesquisas internacionais, talvez mude
um pouco a postura deles, talvez eles se sintam mais seguros para denunciar, sintam
que não estão sozinhos."
Cosme e Damião
Para que esses jovens tomassem conhecimento da instalação, foram distribuídos
2.000 panfletos na periferia da cidade, com
a imagem de Cosme e Damião, os protetores das crianças, com uma tarja preta sobre
os olhos -a mesma tarja que costumava
aparecer sobre os olhos de adolescentes das
Febens em fotos de jornais.
Aliás, o nome da obra, "Licença, Senhor,
S.A.", veio da frase que os internos da Febem são obrigados a dizer antes de falar
qualquer coisa. "Algumas vezes, para humilhar mesmo, eles têm de pedir licença até
para coisas, como cadeiras ou mesas", diz
Pinky. Já o "S.A." se refere ao que ela chama
de "indústria da miséria". "Tem muita gente ganhando dinheiro com a pobreza, e os
poderes não estão interessados em mudar
isso. E a sociedade anônima também somos todos nós, que não fazemos nada."
Agora, mais 2.000 panfletos vão ser distribuídos por meninos de rua no centro da cidade. "Conversei com eles para explicar
que isso significava mais do que os R$ 10
que eles vão ganhar", afirma a artista, que
bancou toda a obra. "Para fazer uma denúncia dessas, é preciso ir até o fim, não dá
para ser patrocinado por ninguém."
No painel, no meio dos números e estatísticas, saltam frases como "Quando alguém
morre, vai embora uma pessoa única, singular, irrepetível". Ou "Indiferença: desviar
os olhos daquilo que dói nos nossos sentidos". Camisetas de meninos da Cracolândia ajudam a personificar a denúncia.
LICENÇA, SENHOR, S.A. Instalação de Pinky
Wainer, com textos de Ferréz. Em frente ao Pátio do
Colégio (estação Sé do metrô). Até 30/8.
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