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Consumo serve para lavar dinheiro
DA ENVIADA ESPECIAL AO RIO
O "salário" dos garotos que atuam no
narcotráfico tem destinos variados.
É comum que parte dele seja destinado
a ajudar suas famílias. A maior parcela,
no entanto, vai para o consumo: um
tênis bacana, uma roupa de marca, um
boné vistoso. "Entrei pro tráfico por
causa do dinheiro. Hoje em dia, você
tem que andar na moral: é roupa, é tênis, é ouro", admite Antônio (nome
fictício), 16.
"Você não pode culpar esses meninos, que são iludidos por algo que é
glamourizado todos os dias: ter dinheiro no bolso para gastar em coisas
de marca. E isso é retroalimentado
diariamente pela publicidade", avalia
a antropóloga Alba Zaluar, professora
da Universidade Estadual do Rio de
Janeiro, pioneira nos estudos sobre
violência e criminalidade.
Um estudo da Fundação Oswaldo
Cruz, publicado no livro "Nem Soldados, Nem Inocentes", entrevistou 88
jovens ex-soldados do tráfico e verificou que, apesar dos "salários" diferentes, juntos eles gastavam R$ 30.870 por
mês em compras.
De acordo com apuração de dados
do Departamento da Criança e do
Adolescente da Secretaria Especial de
Direitos Humanos, há mais de 12 mil
meninos atuando para o tráfico hoje
só no Rio. Se 88 deles gastavam 227 salários mínimos por mês em roupas e
acessórios, o gasto de 12 mil deve ser
de centenas de milhares de reais.
"Esses garotos têm, como todo adolescente, orgulho de poder fazer compras. O perigoso é que, ao chegar a
uma loja com dinheiro, eles são totalmente valorizados. Mas não é o ser humano que é valorizado, e sim, o dinheiro", explica Marcelo Rasga Moreira, 31, um dos autores da pesquisa. "A
mesma sociedade e o mesmo mercado
que fecharam as portas na cara desses
meninos -e que exigem a sua punição- mudam de atitude quando eles
estão com dinheiro."
É assim que o dinheiro dito sujo, obtido com o tráfico de drogas, se transforma em algo desejável quando bate
na caixa registradora do mercado e vira lucro limpo.
Segundo Moreira, existe uma microlavagem de dinheiro interna de cada
município onde há garotos nesse tipo
de atividade que ainda não havia sido
revelada.
"Nossa pergunta é: será que algum
dia esse dinheiro vai se tornar tão importante para as economias locais a
ponto de elas sofrerem um abalo caso
ele deixe de existir?"
(FM)
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