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HISTÓRIA NO CINEMA
Filme sobre Che Guevara reacende debate sobre o mito
Quem é esse cara?
France Presse
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Jovem venezuelana com cartaz de Che Guevara, durante manifestação de apoio ao presidente Hugo Chávez, em Caracas |
FRANCESCA ANGIOLILLO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DO MÉXICO
O olhar é altivo e parece tentar fixar
uma utopia, um futuro possível; a
aparência geral é romântica. Em uma palavra, é "sedutora" a imagem de Che
Guevara (1928-1967) que se cristalizou e
foi reproduzida milhões de vezes, em camisetas, pôsteres, livros e em quase todo
tipo de material imprimível.
Sua foto, a mais famosa -tirada em
1960 pelo cubano Alberto Korda (1928-2001)-, reúne, nos mínimos elementos
de um close-up, o que a maioria dos jovens de hoje parece ter apreendido da figura de Ernesto Guevara de la Serna, o
Che: um idealista, que se agarrou com
força ao seu desejo de mudar o mundo.
O potencial mercadológico da imagem
de Korda não passou em branco. A figura tem sido explorada de todas as formas
possíveis, a maioria das quais não tem
nada a ver com o que pregava o retratado. Há, na moda, um "boom-guevara";
até biquíni ele já estampou (lembra de
Gisele Bündchen?) e, mundo afora, rappers como Missy Elliot e atrizes como
Elizabeth Hurley desfilam satisfeitas seu
lado "revolucionário".
Che Guevara nasceu na Argentina; fez
uma viagem que acaba de entrar para o
cinema, pelas mãos do cineasta Walter
Salles, em "Diários de Motocicleta", e depois outra; ambas mudaram seu modo
de ver a América Latina. Aos poucos, se
engajou na perspectiva de construir um
continente coeso e livre da dominação
norte-americana.
As andanças de Che Guevara estão em
dois diários ("De Moto pela América do
Sul", da Sá Editora, e "Outra Vez", da
Ediouro), que mostram bem como no
jovem médico foi se construindo a mentalidade do revolucionário. Em 1956, instalado em terras mexicanas e já engajadíssimo politicamente, Che conheceria o
homem que mudaria definitivamente o
seu destino: Fidel Castro. Três anos depois, lutariam lado a lado na Revolução
Cubana, derrubando o ditador Fulgencio Batista (1901-1973) e instalando o
atual regime comunista da ilha.
A partir daí, o caminho para o mito estava aberto, culminando com sua captura e morte na Bolívia. Lá, depois de dispensar um alto cargo no governo cubano, treinava a guerrilha. O final de "mártir", somando-se à trajetória de "herói",
era o que faltava para que ele entrasse
com tudo para o imaginário jovem.
Vem e vai, ele reaparece. Nos últimos
anos, não há encontro antiglobalização
em que não apareça. Boa parte dos que
vestem a camiseta não o fazem porque
sabem que, por trás do olhar perdido,
Che sonhava com o "pan-americanismo". Ou por conhecerem sua rota americana. Ou, ainda, seu fracasso na África
-contado em "Passagens da Guerra Revolucionária: Congo" (Record).
Parece que, além da "moda", o que
move os jovens rumo à persistente figura
de Che tem mais a ver com aspectos ligados à personalidade do que a seus ideais.
A maioria dos jovens entrevistados pelo Folhateen no México, por exemplo,
disse "saber pouco" sobre como Che
pensava. Apesar de se lembrar de conhecer sua existência "há muitíssimo tempo", quase nenhum buscou mais informação do que a ouvida quando criança.
A palavra que se destaca é "idealismo",
seguida de "liberdade" pessoal ou política e de "luta anti-EUA". É sobre esse tripé que se apóia, pelo que se pôde constatar, a sobrevivência do mito.
Alguns têm consciência de que ele foi
ideologicamente esvaziado -como se
tivesse encarado uma reciclagem-, e
que hoje se identifica com certa atitude.
Como diz Bruno Mendizábal, 19: "A figura do Che se perverteu um pouco,
usam só como um símbolo de rebeldia".
Roberto de la Peña, 19, completa: "Usa-se muito o "logo" do Che como símbolo
de que não estamos de acordo com que a
autoridade nos seja imposta".
"Também tem a ver com como se identificam os garotos de agora, uma geração
brava, cheia de ansiedade, que procura a
que se agarrar. Falta um ideal de seu próprio tempo", arrisca Tania Álvarez, 19.
Miguelina Joaquín, 20, faz eco: "Nesta
época, carecemos de heróis, idealistas,
revolucionários. Tenta-se muitas vezes
enaltecer figuras do passado, que expressaram suas idéias e lutaram por elas".
Tampouco passa despercebido a esses
jovens que, em muitos casos, se trata de
fazer onda. "É um jeito de "pegar bem",
porque o Che nunca falha", diz, em tom
de crítica, Sara Hamud, 19.
Bruno "culpa" em parte a foto de Korda: "Seu "look" ajuda, essa foto que está
por todo lado, que teve uma mensagem e
que, depois, se tornou independente; se
fizessem uma camiseta com outra imagem, ninguém saberia quem era".
Apesar de não demonstrarem conhecimento preciso do ideário de Che e de o
acharem meio anacrônico no pouco que
conhecem de seus métodos, alguns lembram as "boas intenções". "Ele era guerrilheiro porque na época era necessária
uma guerrilha para acabar com Batista, o
ditador de Cuba. Já não precisa, mas os
ideais deveriam ser levados em conta.
Batista tinha Cuba inteira vendida aos
EUA. Eu vejo isso como a globalização
hoje", compara Emiliano Corona, 17.
Para Victoria Bedolla, 20, "se houvesse
uma luta hoje, não poderia ser armada,
pois estaria predestinada ao fracasso". E
Miguelina, que morou em Cuba, resume:
"É uma pessoa digna de admiração e respeito, com idéias revolucionárias que tinham muito a ver com a sua época. Hoje
está muito comercializado. Boina, camiseta... Nem sabem das suas idéias. Ele
morreria de novo se visse".
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