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O bicho-papão vai pegar quem baixa música
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLUNISTA DA FOLHA
Sabe quantos americanos já baixaram música -de graça e à margem da lei- pela
internet? Nada menos do que 50 milhões, ou
seja, 17,5% da população do país.
O número, por si só avassalador, é mais impressionante ainda por se tratar dos EUA, lugar de colonização puritana e apego ferrenho
à lei escrita.
Ao contrário do que acontece no Brasil, nos
EUA não pega bem ser malandro, dar um jeitinho, se dar bem ou cometer um pequeno
delito que passe impune. Ainda assim, apesar
dessa atitude reta diante da vida, baixar música é prática mais do que comum entre os
americanos. Por que
será?
Acontece que, para terrível azar da indústria, obter canções na rede mundial é tão fácil que
não parece crime,
não dá a sensação de estar fazendo algo errado.
E é por isso que a Riaa, associação das grandes gravadoras, atua de modo tão brutal nos
tribunais americanos, ameaçando com cadeia
e multas milionárias qualquer um que seja pego no "dowloading" musical na web. Qualquer um mesmo, pessoas comuns como eu e
você.
De um modo imediato, o motivo da encrenca é simples: as pessoas pegam a música de
graça e não precisam comprar CDs. As vendas despencam (de 2000 para 2002, houve
queda de 16%), e as gravadoras se apavoram.
A longo prazo, porém, a questão é ainda mais
complicada. Porque está sob risco o próprio
conceito de álbum -ou LP, como se dizia antigamente-, fundamento sobre o qual cresceu a indústria da música que conhecemos
hoje.
Ao baixar uma canção na rede, o consumidor busca apenas aquela faixa de que gosta, e
não um álbum inteiro, de 14 ou 15 músicas em
que só três ou quatro prestam. Acendem-se
aqui várias luzes vermelhas nas cabeças dos
executivos do mundo dos discos. É que o formato de álbum é muito lucrativo.
Segundo a revista "New Yorker" de 7/7/
2003, quando o CD entrou no mercado (nos
anos 80), um LP de vinil custava, nos EUA,
US$ 8,98. O CD chegou ao preço de US$ 15,98,
apesar de ter os mesmos custos de produção
que a bolacha preta. Eram as gravadoras enchendo os bolsos à custa do gostinho da novidade. Com o tempo, os CDs ficaram ainda
mais baratos de fazer, mas o preço nas lojas
não caiu quase nada. Entendeu por que o fim
do álbum assusta tanto a Riaa?
Nos EUA, o arranca-rabo nos tribunais fica
mais interessante a cada dia. Jogando pesado,
a Riaa começou a exigir das companhias telefônicas, fornecedoras de conexões à internet,
a divulgação dos nomes dos clientes que baixam músicas (ou seja, quase todo mundo).
Agora, o conglomerado SBC, que controla,
por exemplo, a telefonia na Califórnia (sede
planetária do "downloading" musical), contra-ataca processando
a Riaa por assalto à
privacidade. A guerra
continua...
Álvaro Pereira Júnior, 40, é editor-chefe do "Fantástico" em São Paulo
E-mail: cby2k@uol.com.br
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