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quadrinhos
Frank Miller vai à Grécia
THALES DE MENEZES
da Reportagem Local
Frank Miller está feliz. O motivo?
Ter 42 anos e poder fazer aquilo
que gosta, sendo bem pago por isso. "Quase ninguém da minha turma da escola conseguiu", diz o
mais badalado criador de quadrinhos das últimas duas décadas.
Em 1986, ele escreveu e desenhou
a minissérie "Batman - O Cavaleiro das Trevas", revigorando completamente o personagem. A obra
é presença obrigatória em qualquer lista de melhores gibis de todos os tempos e consagrou Miller.
Deu a ele prestígio suficiente para
desenhar o que quiser. A partir daí,
ele só fez coisas bacanas.
Sua última obra-prima chega às
bancas brasileiras no dia 10/5. É
"Os 300 de Esparta", minissérie
editada pela Abril Jovem. Em cinco
números, Miller narra um episódio ocorrido em 480 a.C., quando
legiões persas invadiram a Grécia.
Uma guarda de 300 homens, liderada por Leônidas, resiste ao ataque bravamente.
Apesar do ódio declarado que
sente por fotografias e entrevistas,
Frank Miller falou com exclusividade à Folha, por telefone, da casa
de amigos em San Diego. Antes de
pegar um avião para Maryland,
sua cidade natal, o autor falou de
Batman, do mercado de quadrinhos e de seus heróis espartanos.
Folha - Por que fazer um gibi com
soldados gregos?
Frank Miller - Porque é uma
aventura heróica. Acho que gosto
mais de histórias em que os personagens sejam gente comum, sem
poderes ou uniformes. Gente que
seja levada a atos de bravura, como
aqueles soldados.
Folha - Você fez muita pesquisa
sobre o período?
Miller - Sim, mas confesso que a
verdadeira inspiração veio de um
filme meio vagabundo, que não
respeitou muito a história verdadeira. Chama-se "Os 300 de Esparta" e é um daqueles filmes de gladiadores feitos nos anos 60. Assisti
na TV e gostei da história. Só depois vi que tudo ocorreu de um jeito bem diferente. Mas não estou
dizendo que a minha versão seja
fiel aos fatos. Ora, eu fiz um gibi,
não um trabalho acadêmico.
Folha - No que você está trabalhando agora?
Miller - Nunca falo de coisas que
ainda não terminei. Tenho projetos novos. E trabalho em mais histórias para "Sin City".
Folha - Que é um gibi sobre gente comum. Você deu um adeus definitivo aos super-heróis?
Miller - Não. Mas, se você fala de
personagens consagrados, como
os da DC e da Marvel, acho difícil
que eu faça qualquer trabalho com
eles. Tenho algumas idéias apenas
para personagens da Dark Horse, a
editora em que eu trabalho hoje. A
Ghost, por exemplo, é um personagem que me fascina. Mas não há
nenhum projeto concreto com heróis.
Folha - Sua principal mágoa com
as grandes editoras é o fato de não
ter controle sobre personagens
que criou? Você rompeu com a
Marvel quando foi publicado um
gibi da Elektra, sua criação, sem
sua aprovação, não é?
Miller - O problema é da estrutura dessas empresas, não é do meu
caso isolado. Elas pertencem a
grandes corporações, que precisam vender uma série de produtos
com seus personagens. Estou feliz
de estar na Dark Horse, que publica uma história como "300". É um
gibi que não foi feito para gerar
continuações, cards, bonequinhos, desenhos animados e outras
bobagens. Eu não gosto disso.
Folha - Mas não é possível esquecer tudo isso na hora de criar?
Miller - Para mim é difícil. Acho
que teria certa liberdade, mas todo
mundo sabe que há criadores que
foram obrigados a mudar o uniforme de um herói só para vender bonecos diferentes do personagem.
Acho isso uma merda. Eu nunca
comprei um boneco de herói na
minha vida.
Folha - Você acha que só é possível criar bons quadrinhos fora das
grandes editoras?
Miller - Eu estou falando de mim,
só isso. Eu não gosto desse esquema, mas não sou da turma que defende que os quadrinhos independentes são bons e os das grandes
editoras são ruins. Apenas não é o
que gosto de fazer. É comum as
pessoas idolatrarem os independentes e tratarem os gibis de série
como uma coisa menor. É uma estupidez. Se eu e outros autores podemos gastar meses numa minissérie, só podemos fazer isso porque existe um mercado comprador, fãs que consomem mensalmente as revistinhas de série, como os mutantes da Marvel ou os
Novos Titãs da DC.
Folha - Por falar nisso, muita gente diz que as revistas mensais do
Batman só existem até hoje porque você "levantou" o personagem em "O Cavaleiro das Trevas".
Miller - Olhe, eu não gosto de falar de meus trabalhos. Acho que é
por isso que não gosto de dar entrevista. Não se trata de timidez, é
que realmente eu não consigo
comparar o que eu faço com o trabalho dos outros. Quando olho um
gibi de Alan Moore, ou John Byrne,
ou qualquer autor, eu tenho uma
percepção de fã. Posso falar horas
sobre o trabalho deles, mas não
consigo fazer o mesmo com aquilo
que escrevi. Sem essa comparação,
não posso falar sobre a importância do que faço. Agora, falando do
Batman, acho que a continuidade
do personagem nunca dependeu
de mim. Batman é um herói tão
bom que sempre resistirá aos caprichos do mercado. Ele já teve dezenas de roteiristas e desenhistas,
além de uma série de TV ruim, de
desenhos animados ruins e de filmes ruins. Mas ele é imbatível.
Folha - Não há pelo menos um
trabalho que seja seu favorito?
Miller - Eu tenho um carinho especial por dois. "Ronin" (1982),
porque foi o meu primeiro trabalho de grande fôlego. Tive medo de
nunca conseguir acabá-lo. Hoje,
quando desenho qualquer coisa,
lembro os apuros que passei com a
saga de Ronin, e tudo fica mais fácil. E gosto de "Sin City". É um sucesso para a Dark Horse, e foi o
projeto com o qual provei que poderia fazer algo totalmente diferente, sem contar com personagens conhecidos.
Folha - Você acabou de falar que
não gosta dos filmes com Batman.
Você não aceitou fazer o roteiro
para eles, mas escreveu para o Robocop. Como foi essa experiência?
Miller - Um inferno. Eu escrevi
"Robocop 2" e fiquei empolgado.
Ia ao set de filmagem, tentava dar
palpites. Fiz um grande esforço, de
verdade. Mas aí você vê o filme na
tela, e não é aquilo que você imaginou. É tanta gente envolvida, tantas etapas de produção, que é impossível ter controle total. Acho
frustrante. Prefiro uma folha de
papel.
Folha - Mesmo trabalhando em
parceria? Como é seu relacionamento com seus parceiros?
Miller - Só trabalho com amigos.
Dave Gibbons, David Mazzucchelli, Todd McFarlane... Eu me dou
bem com todos. Não somos aquele
tipo de amigos que se encontram
no fim do dia para tomar cerveja,
mas somos amigos. É que eu não
gosto de falar de quadrinhos o
tempo todo.
Folha - E o que Frank Miller gosta
de fazer?
Miller - Um monte de coisas. Comer, assistir TV, nadar, fazer sexo,
dormir. Sou um cara normal.
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