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evento Folhateen
mundo livre arma seu carnaval na Folha
da Reportagem Local
Precursor do mangue beat, ao lado de Chico Science e Nação Zumbi, o mundo livre S/A tem levado o
movimento recifense adiante com
toda força.
O novo disco da banda, "Carnaval na Obra", terceiro da carreira e
primeiro pela gravadora Abril Music, acaba de sair. Na última quarta-feira, Fred Zero Quatro, 36 (vocalista), Bactéria Maresia, 23 (teclado e guitarra), Marcelo Pianinho, 33 (percussão), Tony Regalia,
27 (bateria), e Fábio Malandragem, 34 (baixo), estiveram no auditório da Folha para um bate-papo animado com leitores, com mediação de Bell Kranz, editora do
Folhateen. Confira os melhores
momentos abaixo.
André, 21 - Por que tantos produtores (quatro) no mesmo álbum?
Fred Zero Quatro - A gente estava
com uma certa obsessão de gravar
um disco de uma forma totalmente caseira, uma coisa que já acontece há muito tempo lá fora, com
bandas que contam com altos orçamentos, mas preferem gravar
em esquema mais caseiro. Assim,
não existe nenhum compromisso
com determinado padrão de som e
FM comercial, e você trabalha com
muito mais espontaneidade, sem a
pressão da hora cara de um estúdio
enorme. Aí a gente pensou em ligar
para pessoas com estúdio que funcionam de forma totalmente alternativa e que já tinham uma ligação
com a banda. E foi o máximo. Algumas coisas a gente chegou a gravar no Bebop, que é um estúdio
grande, coisas que precisavam de
mais ambiente, tipo bateria, percussão, metais. Mas a parte de
mais efeito, guitarra e teclado foi
toda gravada na casa do Bidi ou na
casa do Edu. E funcionou de forma
bem a contento da galera toda.
Júlio Lopes, 28 - Quem é o maior
fã da Malu Mader entre vocês? Vocês têm uma música homenageando a atriz, né?
Fred - A música não foi feita para
a Malu, a música foi feita para uma
mina da Ilha Grande chamada Tatiana. Nem era a namorada de ninguém, era, assim, a gatinha da temporada, que passava na praia todo
dia...
Júlio - E aquele álbum de vocês
que fala sobre oia, que diabo é oia?
Fred - Oia é uma gíria que vem de
algumas favelas, não só de Recife.
A gente soube depois que em outros lugares também se usa esse
termo. Pode ter vários significados. "Guentar oia" pode ser batalhar o dia-a-dia, tentar a sorte. Pode ser também o cara que faz bico
("Minha oia hoje foi fraca e tal").
Julio Lopes - Qual a influência
maior que o Chico Science deixou
na banda?
Fred - É meio complicado identificar o que ficou do Chico. Até porque, antes de a gente conhecer o
Chico, a banda já tinha uns cinco
anos de trabalho, já com esse som.
É lógico que ele era um cara com
um puta carisma, uma energia para se comunicar legal com a galera.
Isso aí foi uma coisa pela qual a
gente se sentiu fortemente influenciado. A gente até fez esse apelido
de Science, um cara que estava
querendo sempre inventar, o que
já era uma coisa inerente ao mundo livre. Mas o Chico era um cara
que reforçava isso em qualquer
pessoa com quem ele trabalhava.
Marcelo Lima, 22 - Eu morei no
Recife um tempinho e fiz um estágio ali no "Diário de Pernambuco"
e tive a oportunidade de entrevistar o Chico Science e o pessoal do
Mestre Ambrósio. Perguntei a eles
sobre o início do movimento mangue e do manifesto. E a conclusão
de que cheguei foi que representaram uma forma de chamar a atenção do Brasil para a cena pop ali de
Recife. Você confirma isso?
Fred - Quando a gente nem tinha
noção se aquilo ia virar algo profissional, era tudo diversão, farra, em
todo encontro a gente inventava
um monte de gíria do mangue: caranguejo, aratu e tal. E aí a gente
começou a chamar todo mundo de
caranguejo nos shows. A galera começou a se identificar muito. E a
idéia era essa mesmo, ajudar a fortalecer uma coisa que estava nascendo muito forte no Recife e, com
isso, aquela história da imagem da
parabólica na lama. E ao mesmo
tempo colocar o Recife no mapa do
pop.
Marcelo Lima - Os caras do Mestre Ambrósio falaram para mim
que quem revitalizou o Recife antigo foram as bandas. Vocês começaram a fazer show lá, e ele começou a ser frequentado de novo. Aí
a prefeitura e o governo teriam se
aproveitado e feito ali restaurante
para a elite.
Tony - É, depois que fizeram isso
as bandas da cena local pararam de
ir para lá, que virou lugar de mauricinhos, barzinho de axé e forrós.
Fred - Existia um barzinho, o Bar
do Fogão, que era o mais podreira
de todos. A bebida era mais barata.
Antes dos shows, a galera se encontrava para encher a cara e entrar detonado. Existia um grafite
na frente e tal. Só que quando começou a ser tudo "revitalizado",
que os empresários começaram a
investir mesmo lá, aí rapidinho tiraram a tiazinha de lá, e o negócio
foi fechado.
Marcelo Lima - Como surgiu essa
idéia de as bandas irem tocar lá?
Fred - No começo não era uma
coisa de banda, existiam uns dois
ou três lugares onde faziam festas.
Perto do cais, havia o Francis
Drinks, que era um cabaré, e havia
outro, o Atenas Drinks. Tinham
um puta astral, com luz vermelha,
de frente para o porto, casarões
bem velhos, bem viagem. E aí nego
começou a fazer festa, e a galera de
universidade e mais antenada começou a ir porque rolava música
muito legal. Pouco tempo depois o
lugar veio abaixo. Pegou fogo e até
caiu. Era um lugar muito velho,
não tinha a menor segurança.
Bactéria - Na verdade, era um puteiro. O Zero Quatro não quer falar, não, mas era um puteiro (risos).
Marcelo Lima - Onde as bandas
do Recife estão conseguindo tocar?
Fred - Na famosa Soparia, que é
do Rogê, o famoso Rogê da música
do Chico, "Cadê Rogê, Cadê Rogê?". É um cara que sempre foi
muito próximo de toda a galera
das bandas e tem uma casa de sopa
aberta a noite inteira, com espaço
para todo tipo de banda.
Marcelo Lima - O primeiro disco
de vocês foi muito trabalhado em
estúdio, e até o show acabou sendo prejudicado porque era difícil
reproduzir. Aí o segundo já foi
uma sonoridade mais básica e tal.
Eu ainda não ouvi o terceiro e não
sei como está. Queria que vocês falassem sobre essa dicotomia palco/estúdio.
Fred - São duas coisas legais pra
caralho. Os três discos foram gravados em São Paulo. Mas, quando
ouço esse novo, eu sinto que é o
mais relaxado, em que a gente estava totalmente à vontade, gravando, produzindo, co-produzindo,
compondo. No primeiro disco, eu
tocava há dez anos, mas nunca tinha pego um instrumento de verdade. Quando a gente estava prestes a gravar, a Lara, que trabalhava
no Banguela, ligou e disse: "A gente está começando a comprar o
material, qual a corda que você
usa, qual a corda que o Bactéria
usa?" Eu disse: "Como, qual a corda? As cordas de guitarra". "Não,
mas qual a marca? É 010, 011...?"
"Pô, velho, acho que a minha corda de guitarra eu nunca troquei na
vida, não tenho nem onde comprar corda boa assim em Recife!"
Quando eu tocava, saía sangue
porque era tudo muito enferrujado. Chegamos para gravar, e até os
instrumentos eram emprestados
ou alugados, os Titãs emprestaram
alguns, e outros a gravadora alugou.
Luis, 20 - Já existe banda de mangue beat fora de Recife?
Bactéria - Cara, fiquei sabendo
que existe um bar aqui, na periferia
sul de São Paulo, chamado Bar do
Mangue. Isso é muito legal.
Lourival - A gente anda de skate
e gosta pra caramba do som quando a gente está andando. Alguém
da banda já andou de skate?
Bactéria - Eu já andei, cara.
Marco Antonio, 17 - O que vocês
têm ouvido, aqui no Brasil e fora, e
que vocês falam "pô, é legal, é novo"?
Fred - Há uma dupla francesa.
Ela se chama Air, eu acho que os
caras fazem um troço totalmente
original, uma ponte muito louca
entre anos 60 e anos 90 e com o que
pode vir depois e tal. Uma outra
muito legal é Future Sound of London, uma coisa eletrônica que mistura muito de jazz também e de
progressivo. No Brasil, uma banda
que eu acho muito legal, lá do Rio
Grande do Sul, se chama Ultramen, que faz um som muito viagem. Outra é Boi Mamão, do Paraná.
Bactéria - Uma banda muito legal
de Porto Alegre é a Júpiter Maçã.
Tony - Lá de Brasília, há Rumbora.
Fred - Há um cara também lá de
Recife, que até foi um dos primeiros parceiros de Chico, tem uma
letra inédita de Chico, de quando
eles eram brothers, que é o Spider.
Muito legal. É um hip hop, só que
ele toca trompete, puta, faz uns arranjos poderosos de trompete
também.
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