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São Paulo, segunda-feira, 23 de junho de 2003

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Aderir ao grupo garante andar armado e exercer a força

Gangue serve de família "do mal"

DA FOLHA RIBEIRÃO

Onde vai parar essa violência? Se você já fez essa pergunta alguma vez na vida, a resposta que o professor de psicologia social da USP de Ribeirão Preto Sérgio Kodato dá não é nada animadora: "A tendência é o problema aumentar".
Estudioso sobre violência de adolescentes, o professor afirma que o fenômeno das gangues está relacionado a vários fatores, que se interligam. Entre eles, estão a falta de perspectiva de futuro, a degradação da família, a globalização do consumo, a sensação de impunidade e a conformidade social.
"O adolescente vive em grupos", explica a pesquisadora da Unesco Miriam Abramovay, que realizou, em 1999, um estudo sobre as gangues de Brasília. O limite entre as galeras (da escola, da rua, da praia etc.) e as gangues é o da legalidade. "O que atrai o jovem para uma gangue é o imaginário de poder. Eles entram para andar armados, para serem respeitados, para serem considerados e para fazer sucesso com as meninas. Consideram a gangue uma família, o que traz uma sensação de pertencimento e de conforto a eles."
Segundo ela, muita gangue começa como de pichadores e termina cometendo atos criminosos.
Desde os anos 20, nos EUA, há estudos sobre a disputa de gangues de imigrantes por poder através do controle de certas áreas das cidades americanas. A divisão do território sempre foi uma marca no comportamento das gangues, além do código de valores, das formas de se vestir e dos rituais de batismo.
A combinação desses elementos e a sensação de poder que o grupo e a arma trazem confere ao jovem de gangue uma arrogância que faz com que um olhar enviesado, uma encarada ou um passeio pelo território inimigo seja motivo para a briga e, no limite, para a morte.
"Sempre houve briga entre grupos de jovens. A diferença fundamental hoje é a arma, que faz com que esses meninos se sintam mais poderosos. É a banalização do que significa andar armado", explica Abramovay que, em outro estudo, sobre violência nas escolas, apontou que, em 14 capitais brasileira, de 2% a 7% dos alunos têm ou já tiveram arma de fogo e de 5% a 14% sabem onde comprar arma.

Punição
As práticas criminosas de gangues de adolescentes, segundo Kodato, ganham força na sensação da impunidade pelas leis específicas aos jovens e, também, pelo "afrouxamento do aparato policial".
Na contramão estão informações colhidas na pesquisa da Unesco feita por Abramovay. Ali, jovens que não se consideravam membros de gangues reclamavam que o termo lhes era atribuído pela polícia e pela mídia. Bastava andarem em pares, vestirem bonés, bermudas e blusões largos para serem abordados por policiais de Brasília e tratados como criminosos.


Colaborou FERNANDA MENA, da Reportagem Local

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