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São Paulo, segunda-feira, 23 de junho de 2003

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Bandos em Belém já provocaram 16 mortes neste ano

MAURÍCIO SIMIONATO
FREE-LANCE PARA A AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM

N o último dia 3, o adolescente Francisco André dos Reis, 17, da gangue Barulho, voltava para a casa sozinho durante a madrugada depois de uma festa, em Belém (PA), quando se defrontou com membros de uma gangue rival, a Patifes da Noite. Ele foi espancado, ferido com golpes de gargalo de garrafa e encontrado pela polícia agonizando na rua, vestindo apenas uma cueca.
Reis, que chegou morto ao hospital, é o 16º adolescente morto só neste ano em conflitos entre grupos rivais, em um tipo de rixa que envolve comunicação por códigos secretos e tem se intensificado nos últimos meses na região metropolitana de Belém.
"Ou você briga ou corre. Mas, se correr uma vez, terá de correr sempre. Não tem como escapar", disse o adolescente R.J.F, 17, integrante de uma gangue com cerca de 30 membros no bairro da Sacramenta, periferia de Belém.
"Quem entra na gangue passa a ser considerado na área. Quando a gente vai brigar, todos têm de ir também", explica M.D., 15.
P.J.R., 14, conta que entrou para a gangue Vira-latas do Inferno depois de ter apanhado de outro bando na rua. "Se não tivesse entrado, já podia ter morrido ou ter sido roubado várias vezes. É um meio de me proteger. Depois que entrei para a gangue, todo mundo passou a me respeitar no bairro."

Ações
"A onda é "escalar" (subir em prédio ou muro para pichar) na área da outra galera, jogar na "tela" (muro) e detonar com a festa deles", diz R.O., 16. "A gente usa arma para se defender. Quem não estiver armado corre risco de morrer. Na maioria das vezes, as brigas acontecem quando uma gangue invade o território da outra para pichar ou fazer uma "onda'", disse A.G.,16, que entrou para um bando há três anos.
"Onda", na gíria das gangues, pode ser a invasão de uma festa de outra rival ou simplesmente pichar uma "tela" no território adversário.
"Se um deles fugir de uma briga, será penalizado por toda a galera, termo que eles usam para designar a gangue", explica Mário Brasil, antropólogo da UEPA (Universidade Estadual do Pará), que estuda a organização e ação das gangues há dez anos. A pena pode ser uma grande surra ou a humilhação diante dos demais integrantes.
"O adolescente entra para a gangue com o objetivo de se tornar respeitado, ser visualizado, ter um sentimento de poder e ser "considerado" pela galera, além de buscar proteção. Em geral, as gangues são formadas rapidamente e não duram mais do que três anos cada uma", esclarece o antropólogo, que passou seis meses acompanhando um grupo chamada Demônios Alados.

Controle
Preocupada com o acirramento entre as gangues, a Polícia Civil do Pará criou há três meses um departamento para mapear as cerca de 140 grupos existentes na região metropolitana.
O novo departamento, ainda sem nome, fornecerá o catálogo das gangues para apoiar investigações policiais e fará um trabalho preventivo com as famílias dos adolescentes identificados.
Dados preliminares da polícia indicam que pelo menos 80% dos bandos são formadas por adolescentes, cada uma tem de 20 a 30 integrantes, a maioria dos membros é do sexo masculino e as armas brancas, como facas ou punhais, são as mais usadas nas brigas.
Só no mês de março deste ano, por exemplo, o Comando do Policiamento Metropolitano de Belém, registrou 44 ocorrências envolvendo gangues. Em janeiro deste ano, foram 17 ocorrências e, em fevereiro, 23 casos.

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