São Paulo, segunda-feira, 26 de novembro de 2001

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POLÊMICA

Usuários são tratados como criminosos ou dependentes

Soninha acende discussão sobre maconha

FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL

O último relatório da ONU informou que hoje existem 144 milhões de usuários de maconha no mundo, 2,4% da população mundial (cerca de 6 bilhões de pessoas). Entre eles, Soninha, 34, ex-apresentadora do programa "RG", alvo de uma polêmica demissão da TV Cultura após ter declarado à revista "Época" que fumava maconha.
Apesar dos debates já feitos para a desmitificação do consumo de maconha (veja quadro nesta página), o estigma de seus usuários gira em torno de duas esferas: a da dependência e a da criminalidade.
A teoria da dependência é tão aceita que foi criado o Ambulatório da Maconha, na Unifesp, onde 54% dos casos atendidos são de jovens entre 16 e 25 anos com problemas de consumo crônico da droga.
Uma pesquisa do Ibope realizada em 1999 com jovens de cinco capitais brasileiras concluiu que 92% deles concordam que as drogas pioram o rendimento escolar.
"Hoje, os adolescentes estão consumindo maconha precocemente, tornando-se usuários regulares com repercussões em termos de memória, de concentração e de motivação", afirma Ronaldo Laranjeira, coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (Uniad) e do Ambulatório da Maconha. Um dos sintomas mais preocupantes do consumo crônico da maconha é a chamada síndrome antimotivacional, em que a pessoa se torne apática e tem dificuldades em persistir em alguma tarefa.

Dependência
"Há dez anos, a dependência de maconha era questionada. Hoje, sabe-se que a droga causa dependência, mesmo física, e uma série de complicações. Mas a percepção de risco das pessoas é a mesma de dez anos atrás", explica Laranjeira.
Já para Jair Mari, professor do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina, "é possível aprender a usar maconha sem que ela se torne necessariamente um problema". Mas, segundo ele, não pode haver ingenuidade nessa relação. "Cerca de 10% dos adolescentes que se iniciam precocemente no uso da droga terão problemas depois."
E os 90% restantes? "No Brasil, não se levam em consideração as pessoas que fumam e não são dependentes, não têm prejuízo de suas atividades profissionais nem danos sérios à saúde", defende Soninha. "Sou a favor da descriminalização."
Na Holanda, na Bélgica e na Alemanha, o chamado consumo recreativo da maconha -aquele em que o usuário consome a droga como quem toma cerveja às vezes- é tolerado. Já no Canadá e em nove Estados norte-americanos o uso medicinal da erva é permitido. A maconha é hoje utilizada no combate ao enjôo provocado pela quimioterapia, no tratamento terapêutico do glaucoma e no combate à asma, à epilepsia e ao estresse.

Lei Antitóxicos
Para quem não sabe, o consumo de drogas no Brasil já foi permitido. Até 1968, quando o decreto lei 6.385 instituiu a aplicação da punição do traficante também ao usuário, o porte de drogas para consumo não era considerado criminoso.
"A atual lei de drogas, de 1976, estabelece condutas diferenciadas para o traficante e para o usuário. Raramente o usuário autuado em flagrante vai para a cadeia", explica o criminalista Alberto Toron, 42. Hoje, o usuário paga uma fiança e é liberado. O crime de tráfico é inafiançável. Mas, como quem decide se o caso se encaixa no artigo 12 (tráfico, pena de três a 15 anos) ou no 16 (porte, pena de seis meses a dois anos) é o delegado de polícia, existe uma variável subjetiva que pode eventualmente levar um usuário a ser preso por tráfico. "É raro, mas há casos em que pessoas são presas por porte de drogas", afirma Toron.



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