São Paulo, segunda-feira, 30 de julho de 2007

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música

Tropicália, 40

Movimento que mudou a cultura brasileira faz anos; Rio ganha exposição com 250 objetos

GUILHERME BRYAN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em outubro de 2007, não faltarão motivos para comemorar as quatro décadas de um dos mais importantes movimentos culturais brasileiros, a tropicália. Afinal, além de revelar diversos artistas, o tropicalismo provou como é ótimo misturar, sem preconceitos, os mais diferentes estilos musicais para criar algo original e marcante.
Nos dias 6 e 13 de outubro de 1967, os até então pouco conhecidos compositores Gilberto Gil e Caetano Veloso pisaram no palco do 3º Festival de Música Popular Brasileira da TV Record para apresentar, respectivamente, "Domingo no Parque" e "Alegria, Alegria".
Apesar de terem ficado em segundo e quarto lugares -a vencedora foi "Ponteio", de Edu Lobo e Capinam-, essas canções chocaram a sociedade ao apresentar elementos de um movimento que revolucionaria a música e a cultura brasileiras. "O aparecimento dessas músicas, com arranjos específicos, introduzindo o aparato eletrônico e a novidade da relação entre letra e música inaugura o tropicalismo", diz Celso Favaretto, autor do livro "Tropicália Alegoria Alegria".
Acompanhados pelos grupos de rock Beat Boys e Mutantes, Caetano e Gil uniram de maneira criativa elementos tradicionais, muitos deles considerados cafonas, com guitarras elétricas e o que havia de mais moderno nas vanguardas européias e norte-americanas.
Bem ao gosto antropofágico do escritor modernista Oswald de Andrade, a idéia era misturar o máximo possível de elementos diferentes para criar algo que o próprio Gil designou como "geléia geral brasileira".
"A tropicália pretendia implantar uma maneira mais democrática e contemporânea de encarar a rica diversidade da música e da cultura brasileira, inserindo-a no cenário internacional. Hoje pode parecer meio absurdo, mas alguns artistas e intelectuais rejeitavam qualquer influência da música pop ou do rock sobre a música brasileira, por encará-los como produtos da política imperialista norte-americana", conta Carlos Calado, autor dos livros "A Divina Comédia dos Mutantes" e "Tropicália - A História de Uma Revolução Musical".
Tanta ousadia e inovação chocaram boa parte da intelectualidade da época, afirma Favaretto: "É como se eles estivessem atentando contra a pureza da música brasileira e era exatamente isso o que queriam: abaixo à pureza. Não há pureza que resista às necessidades da contemporaneidade".
Para se ter uma idéia de como a elite cultural brasileira rejeitava a cultura norte-americana, em 17 de julho de 1967 foi realizada em São Paulo uma passeata contra as guitarras, reunindo artistas como Edu Lobo e Elis Regina. "Os tropicalistas odiavam o "populismo musical" que estava em evidência com Geraldo Vandré", lembra o jornalista Nelson Motta.
Em 1968, seria lançado o álbum "Tropicália ou Panis et Circensis", que escancarou as propostas estéticas tropicalistas. O disco reuniu o maestro Rogério Duprat, Nara Leão, Gal Costa, Caetano, Gil, o poeta Torquato Neto, Capinam, Tom Zé e os Mutantes.

Bananeiras
Os tropicalistas estavam em sintonia com outros artistas brasileiros, caso do cineasta Glauber Rocha -que, em 1967, filmou "Terra em Transe"- e do diretor de teatro José Celso Martinez Corrêa, que dirigiu a mais chocante e provocadora montagem da peça "O Rei da Vela", de Oswald de Andrade.
O nome "tropicália" foi uma sugestão do produtor de cinema Luiz Carlos Barreto, inspirado pela instalação do artista plástico Hélio Oiticica, que misturava bananeiras com aparelhos de televisão.
A tropicália terminou pouco mais de um ano após o seu aparecimento, em dezembro de 1968, quando Caetano Veloso e Gilberto Gil foram presos pelo governo militar e exilados na Inglaterra.
A principal razão alegada foi a de que Caetano teria inserido versos ofensivos aos militares durante a temporada realizada com Gil e Mutantes na boate Sucata, onde ainda foi pendurada uma obra de Hélio Oiticica -uma bandeira com a inscrição "Seja marginal, seja herói".
"A atitude crítica defendida pelos tropicalistas permanece até hoje como lição essencial para qualquer artista. Praticamente tudo que se fez na música brasileira a partir de então foi beneficiado pela lição de liberdade estética deixada pelos tropicalistas. Graças à tropicália, a música brasileira abandonou preconceitos musicais e a xenofobia", finaliza Calado.


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