São Paulo, segunda-feira, 30 de setembro de 2002

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Agora é a sua vez

Como pretende solucionar o problema do emprego para os jovens sem, de forma direta ou indireta, tirar o emprego dos adultos?

Lula - Nós temos algumas experiências muito bem-sucedidas de programas de inserção dos jovens no mercado de trabalho. O Programa Primeiro Emprego é um bom exemplo. Esse projeto estimula as empresas a abrirem frentes de trabalho para jovens com idades entre 16 e 24 anos e, dessa maneira, evita demissões de outros funcionários. Para cada vaga criada, a empresa recebe incentivo financeiro do Estado durante seis meses. O programa garante aos jovens emprego formal com carteira assinada e direitos sociais e estimula a elevação de sua escolaridade através de programas de qualificação e treinamento profissional. Essa experiência pode e deve ser implantada nas outras regiões, assim como os projetos de Renda Mínima e Bolsa-Escola, que também foram criados pelo PT e hoje são adotados em diversos Estados e municípios.

Serra - Primeiro, temos de criar condições para que o país tenha, nos próximos quatro anos, pelo menos, mais 8 milhões de novos empregos. Para isso, vamos buscar o crescimento da economia a, em média, 4,5% ao ano.
Jovens e adultos buscam a oportunidade de trabalho, mas seus problemas são diferentes e, portanto, exigem soluções também distintas. Os jovens são prisioneiros de um círculo vicioso: não conseguem o primeiro emprego porque não têm experiência e não têm experiência porque não conseguem o primeiro emprego. Para quebrar essa barreira, é preciso preparar os jovens para o trabalho. Vamos investir na qualidade do ensino.
Ao mesmo tempo, vamos implantar em todo o país programas de estágios remunerados em parceria com as empresas privadas e também em organismos públicos, com os cuidados e limitadores necessários para não tirar o emprego formal.

Garotinho - O desemprego é resultado do modelo econômico equivocado implantado durante os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso. Anualmente, 1,5 milhão de jovens ingressam no mercado de trabalho e não encontram oportunidades. Para mudar esse quadro, vamos criar o Programa Primeiro Emprego, em parceria com a iniciativa privada, com redução de impostos para as empresas que aderirem ao projeto e derem emprego aos jovens. No Rio de Janeiro, implantamos o Programa Jovens Pela Paz, que beneficiou 10 mil jovens em diferentes projetos.

Ciro - Combater o desemprego -seja entre a população em geral, seja entre os mais jovens- exige uma mudança radical na condução da política econômica. É preciso atacar a vulnerabilidade externa para, assim, criar condições de reduzir a taxa de juros e retomar o crescimento. Somente o crescimento econômico pode criar empregos de maneira sustentável. No entanto é preciso ter políticas voltadas para aqueles cidadãos que estão há pouco tempo no mercado de trabalho. A mais fundamental é ter uma educação de qualidade. Mas é preciso também criar incentivos para as empresas que contratam jovens.

O jovem brasileiro morre, em sua maior parte, de causas violentas. O que o senhor pretende fazer para minimizar essa vitimização?

Lula - Temos dois caminhos pela frente: um deles é inibir urgentemente a escalada da violência e punir os que já estão envolvidos na criminalidade, fazendo justiça e combatendo a impunidade; o outro é salvar a nossa juventude enquanto é tempo, disputando cada jovem com as fontes do crime e da violência, para impedir seu envolvimento numa viagem sem volta para a morte precoce.
Se desejamos mesmo salvar a juventude brasileira, como prioridade absoluta, temos de investir o melhor de nossa energia política e todo o potencial de nossa economia na criação de oportunidades e mecanismos de integração à cidadania, o que inclui emprego e renda, nutrição e saúde, assim como educação, esporte e lazer e acesso à cultura.

Serra - Temos de afastar os jovens das situações que o levam para o ciclo da violência, do álcool, das drogas e, muitas vezes, da criminalidade. Para transformar esse quadro, é preciso que o governo e a sociedade atuem simultaneamente em várias frentes. Na escola, com mais qualidade, abrindo mais vagas no ensino médio e no profissionalizante -facilitando seu acesso ao mercado de trabalho- e agregando atividades culturais e esportivas que estimulem a educação regular, o potencial criativo e o desenvolvimento físico e social do jovem.
Paralelamente a essas ações direcionadas, será criado o Ministério da Segurança Pública, ao qual ficarão subordinadas a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal e que terá, entre outras, a missão de organizar o Sistema Nacional de Segurança Pública, integrando as ações dos órgãos e os programas federais às autoridades estaduais. A missão principal do novo ministério será o combate ao crime organizado em suas várias ramificações.

Garotinho - O combate à violência será tratado como prioridade no meu governo. Mas precisamos distinguir a delinquência do crime organizado. O primeiro problema nós enfrentamos com programas de prevenção e de inclusão social. Já o crime organizado temos de combater com inteligência. Além do monitoramento das fronteiras, defendo o aumento do efetivo da Polícia Federal, mudanças no Código Penal e no Código de Processo Penal e a construção de presídios federais. Paralelamente, precisamos investir em programas que ofereçam uma nova perspectiva de vida para a nossa juventude. No Rio, além de cursos profissionalizantes, criamos, em parceria com a Unesco, o projeto Escolas de Paz. Nos fins de semana, as escolas passaram a oferecer atividades culturais, recreativas e esportivas. Será importante também promovermos nas escolas, como fizemos no Rio, campanhas educativas que alertem os nossos jovens sobre os malefícios causados pelas drogas.

Ciro - O problema da violência precisa ser combatido em associação com os Estados. À União, além de aumentar o efetivo da Polícia Federal, cabe assumir um papel mais efetivo no planejamento central do combate à violência. Um aspecto importante sobre a criminalidade refere-se à influência das variáveis econômicas sobre a taxa de homicídio dos jovens. Piores condições no mercado de trabalho para os mais jovens, assim como o aumento combinado da renda média das regiões com indicadores de desigualdade, parecem ter impacto positivo sobre a taxa de homicídios desse grupo etário. Uma possível explicação para esse fenômeno é o fato de que a fração dos jovens que entra na criminalidade correlaciona-se tanto com o comportamento do mercado de trabalho quanto com os indicadores de renda e desigualdade média de cada região. Mudar as condições socioeconômicas do país é, portanto, uma das premissas para reduzir a "vitimização" do jovem.

Como o senhor pensará a educação de forma não só quantitativa mas também qualitativa? E como facilitará o acesso do estudante da rede pública a um ensino superior ou profissionalizante também público?

Lula - É fato que os jovens das camadas mais pobres praticamente não têm acesso à educação superior pública. E, dentro do universo dos jovens entre 18 e 22 anos, apenas 7,7% frequentam cursos universitários. A grande maioria daqueles 7,7%, na verdade, estuda em escolas pagas. Ou seja, quando consegue chegar ao ensino superior, o jovem só pode pagar a faculdade se tiver arranjado um bom emprego ou se tiver apoio econômico da família. O PT considera tarefa inadiável ampliar significativamente as vagas nas universidades públicas e reformular o sistema de crédito educativo. Iremos, prioritariamente, tratar de expandir o sistema público de educação superior, triplicando em quatro anos as vagas oferecidas. Propomos a implantação de um programa nacional de bolsas de ensino superior para os estudantes carentes, que, em contrapartida, poderão fazer trabalhos comunitários. Também vamos priorizar o investimento na área social, pois é nela que está a chave do desenvolvimento econômico do nosso país.

Serra - Vamos investir em mais qualidade no ensino, começando pelos professores do ensino fundamental, que terão 90 mil bolsas de estudo de ensino universitário. Outra meta é que, até 2006, todos os professores da educação básica ao ensino médio tenham curso superior e licenciatura plena e que, pelo menos, mais 50% dos professores do ensino superior tenham mestrado ou doutorado. Vamos dobrar o número de matrículas no ensino médio regular. Vamos aumentar em 1,6 milhão as matrículas no ensino profissionalizante. No ensino superior, vamos ampliar em 50% o número de alunos e dobrar o número de vagas nos cursos noturnos das instituições federais de ensino superior. Vamos manter um rigoroso processo de avaliação das instituições de ensino, revisando os critérios de autorização de novos cursos e também descredenciando as que não se adequarem aos padrões de qualidade. Todas as universidades públicas serão obrigadas a organizar cursos pré-vestibulares gratuitos voltados para o ingresso de jovens carentes. Vamos também, por outro lado, reforçar e ampliar o acesso ao crédito estudantil.

Garotinho - O Brasil não conseguirá reduzir as suas desigualdades e se desenvolver se não investir na educação. Em dez anos, o número de crianças fora das salas de aula foi reduzido. Mas a educação de um país não pode se restringir ao ensino fundamental -tampouco se amparar em bases de qualidade duvidosa. No ensino médio, no profissionalizante e no superior o país, continua sendo reprovado. Por outro lado, os indicadores nacionais de repetência, abandono e distorção idade-série revelam que é necessária a adoção de políticas eficientes e eficazes. Precisamos aumentar os investimentos em educação. A política educacional do meu governo será voltada para o ensino público, para aumentar a escolaridade do trabalhador brasileiro e garantir a universalização do acesso ao ensino superior através de um crédito educativo financiado pela Caixa Econômica Federal. No que se refere ao ensino médio, criarei um fundo de incentivo nos moldes do Fundef. E, para incentivar a educação profissional, implantaremos um amplo programa nacional de escolas técnicas, voltado principalmente para as camadas mais pobres da população.

Ciro - O país precisa oferecer perspectivas para seus jovens. Nesse sentido, melhorar a qualidade do ensino público e oferecer alternativas, como o bolsa-escola, que permitam que o jovem permaneça estudando, ao mesmo tempo em que se retoma o crescimento econômico são tarefas prioritárias. Além disso, o ensino médio, especialmente o profissionalizante, precisa ter seu número de vagas ampliado e seus focos mais voltados para as necessidades do mercado de trabalho. Quanto ao acesso do estudante da rede pública ao ensino superior ou ao profissionalizante também públicos, ele deve ser garantido pela qualidade da escola pública fundamental.

Que prioridade seu programa de governo dá aos jovens? Como pretende manter um diálogo direto com os jovens durante seu governo?

Lula - O nosso programa de governo propõe mudanças profundas no Brasil. Nossas administrações espalhadas pelo país já têm demonstrado que é possível construir novos caminhos. Todas têm programas voltados para a criação de oportunidades à juventude, como o Programa Primeiro Emprego, que já inseriu milhares de jovens -até mesmo egressos da Febem- nos mais diversos setores do mercado de trabalho.
É dessa maneira, com emprego digno e educação de qualidade, ampliando inclusive os sistemas de ensino profissionalizante e os cursos de tecnologia, que vamos dar novas esperanças às novas gerações.


Serra - Minha proposta é criar na estrutura da administração federal um organismo adequado de formulação, coordenação e avaliação das políticas voltadas para o jovem. Ele terá como missão implantar em todo o país programas, como o Meu Primeiro Trabalho, e estruturar o Projeto Jovem Brasil, que organizará grupos de estudantes do ensino médio e universitário que viajarão por todo o país para ajudar em projetos sociais. Vamos instituir um sistema de incentivo à participação dos jovens em trabalhos sociais, programas de esporte, cultura e qualificação, oferecendo prêmios como créditos, bolsas, estágios, viagens, ingressos para eventos culturais e esportivos.


Garotinho - O jovem é o futuro de uma nação e, se não investirmos na juventude, não seremos capazes de retomar o caminho do desenvolvimento de forma sustentada. Por isso irei criar o ministério do esporte e da juventude, nos moldes do existente na França. Ele ficará responsável pela implantação e pela implementação das políticas para os jovens brasileiros, principalmente para aqueles que moram na periferia e não têm acesso ao esporte, à cultura e ao lazer. Além disso, vamos introduzir a obrigatoriedade da educação física nas escolas. O esporte de massa é fundamental para que possamos criar os atletas do futuro.

Ciro - O jovem é evidentemente uma prioridade de meu programa. Afinal, o objetivo primordial do meu governo será o de melhorar a vida das pessoas no Brasil. Essa prioridade se expressa em cada uma das ações previstas para os diversos setores: saúde, educação, emprego etc. Quanto ao diálogo com o jovem, um governo democrático precisa manter um debate constante com toda a sociedade. Assim, os jovens e suas entidades representativas terão sempre espaço nesse debate.


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